A mania do Estado brasileiro de esquartejar a economia em setores de produção e dar a cada um deles um tratamento tributário distinto é, como já foi dito mais de uma vez neste espaço, terreno fértil para distorções e injustiças.
Dependendo da capacidade de influência, do poder de pressão ou de fatores subjetivos, alguns ramos industriais conseguem tratamento diferenciado e, assim, pagar menos impostos do que segmentos que, à primeira vista, fabricam artigos mais importantes. É o que mostra a reportagem de Juliana Garçon nesta edição.
Pelo levantamento, feito com base nas alíquotas oficiais, o caviar (alimento que só tem lugar em mesas grã-finas) é gravado em 5% de IPI. Enquanto isso, os alimentos para praticantes de atividades físicas pagam 27% do mesmo tributo.
Por esses números, o Estado entende que participar de um jantar de gala é mais importante e, portanto, merece um tratamento fiscal mais amigável do que suar a camiseta para manter a forma física. É uma questão de ponto de vista, sem dúvida.
O exemplo pode ser singelo e, com certeza, se explica por razões de natureza técnica que escapam ao senso comum. Para quem vê a cena de fora, é estranho.
O problema não está, naturalmente, nos 5% pagos pelo caviar. Está nos 27% cobrados sobre os alimentos dos atletas. Esse é apenas um dos lados da questão.
Outro aspecto preocupante é o da burocracia que dá à questão fiscal brasileira uma complexidade que não se vê em nenhum outro lugar do mundo. Ou quase nenhum.
Conforme um levantamento feito por uma empresa especializada nesse tipo de serviço, em 2012 houve no Brasil um total de 369 alterações de natureza fiscal motivadas por portarias e decretos de diversos órgãos federais, estaduais e municipais.
Entre janeiro e agosto deste ano, foram 189 mudanças que o contribuinte precisa acompanhar sob pena de levar uma multa pesada se não seguir ao pé da letra cada ponto e cada vírgula das instruções baixadas pelos funcionários das diversas repartições que têm o poder de interferir no dia a dia das empresas.
Esse é um lado pouco explorado da complexidade tributária brasileira. O fiscalismo exagerado, que considera todo contribuinte um sonegador, é um traço cultural que remonta ao período colonial e deixa a sociedade irritada desde o tempo em que a coroa portuguesa promovia derramas para cobrar tributos em atraso.
Um pouco de bom senso não faria mal a ninguém. Nenhum dos críticos do sistema fiscal brasileiro considera possível uma redução substancial da carga tributária.
Muitos se dariam por satisfeitos se a carga tributária fosse mantida, desde que o sistema ficasse mais simples e racional. Isso só acontecerá no dia em que o estado perder a mania de esquartejar a economia e de fazer mudanças a conta-gotas e promover uma reforma para valer. Água mole em pedra dura…
Fonte: Brasil Econômico, 24/09/2012
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