Para se andar dez mil quilômetros é necessário dar o primeiro passo. Tomara que a Resolução 231 seja ele
Na sexta-feira passada, 28 de janeiro, o Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP), baixou a Resolução 231, assinada pelo ministro Guido Mantega, adiando a entrada em vigor da Resolução 224, de dezembro de 2010, para 31 de março de 2011.
A Resolução 224 deveria entrar em vigor no dia 31 último e, se isso acontecesse, o Brasil poderia estar se metendo numa confusão desnecessária e muito maior do que seria razoável, ainda mais tendo por base um tema da importância e delicadeza do resseguro.
Como eu venho escrevendo há semanas, desde quando o CNSP baixou as Resoluções 224 e 225, o Brasil, não pode prescindir do mercado internacional de resseguros, se não for por nada, porque não tem dinheiro para pagar a conta. Também não há razão para o seguro brasileiro custar caro, em função de decisões políticas na contramão da operação internacional deste tipo de contrato.
Resseguro é negócio altamente especializado, que envolve toda uma série de contratos com funções completamente diferentes, ainda que girando sob o nome genérico de contrato de resseguro.
Sem ser repetitivo, mas lembrando que o país não tem a mais remota capacidade de assumir em resseguro os excedentes do mercado local, as Resoluções 224 e 225 apontam para uma desesperada tentativa de conter a sangria de prêmios que faz com que o IRB atualmente tenha no máximo 25% do total dos resseguros gerados no Brasil contra mais de 80% de cinco anos atrás; ou para o completo desconhecimento da atividade resseguradora por quem redigiu as Resoluções. Também é possível que se trate da soma das duas hipóteses.
Repercussão negativa. Seja como for, a única coisa concreta que já foi alcançada pelo governo foi uma enorme e negativa repercussão internacional, que coloca, na imprensa das nações investidoras, o País como um local de alto risco para empresas estrangeiras investirem dinheiro, por conta da insegurança jurídica, que faz com que Resoluções do Poder Executivo alterem Leis Complementares, no mais profundo desrespeito ao ordenamento jurídico.
Como consequência, já ouvi de mais de um executivo do setor que as empresas para as quais trabalham ou cancelaram ou adiaram investimentos de milhões de dólares, boa parte deles destinados à criação de resseguradoras locais.
A se entender o que tem sido dito pelo governo e o que está escrito nas duas Resoluções, uma das ideias por trás delas era justamente fortalecer as resseguradoras locais, através da imposição da obrigatoriedade da cessão de 40% de todos os resseguros gerados no País para estas empresas.
Em outras palavras, o tiro já saiu pela culatra, ainda que no futuro estes conglomerados, entre os quais estão alguns dos maiores grupos seguradores e resseguradores do mundo, revejam suas posições e voltem a querer investir em território nacional.
Por alguma razão absolutamente opaca as duas Resoluções foram publicadas com datas de entrada em vigor diferentes. A 224 deveria entrar em vigor no dia 31 de janeiro, enquanto a 225 deve entrar em vigor no dia 31 de março de 2011.
Não cabe discutir aqui o que já foi exposto em outro artigo, mas até onde a atitude do governo não esconde um maquiavelismo exacerbado? O fato positivo nesta triste novela é que o governo acaba de baixar uma nova Resolução do CNSP, a 231, assinada pelo Ministro da Fazenda, que pode indicar uma reviravolta inteligente para um quadro desnecessariamente complicado.
De concreto e novo temos que as duas Resoluções, se mantidas, só devem entrar em vigor daqui cinquenta dias, o que dá tempo para explicar para o governo a insensatez de pretender alterar as regras de uma atividade completamente globalizada, como é o resseguro, num momento em que o Brasil, além dos seguros que já possui, necessita contratar apólices novas, capazes de garantir R$ 300 bilhões em obras a serem realizadas nos próximos anos.
O adiamento não é uma vitória, mas para se andar dez mil quilômetros tem que se dar o primeiro passo. Tomara que a Resolução 231 seja ele.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 07/02/2011
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