Mesmo excelentes projetos não são imunes ao ataque de interesses adversários. Faz parte da história humana o permanente embate dos contraditórios e o projeto de união europeia é mais um claro exemplo dos riscos de reversão que uma ideia generosa e grandiosa pode sofrer.
A crise financeira e a queda da renda em vários países do bloco formado pela União Europeia (UE) ameaça a integridade do conceito de uma Europa politicamente unida e economicamente cooperante. Qual o risco verdadeiro dessa hipótese de reversão? E como isso ocorreria, caso as circunstâncias confluíssem para tal? E com que dramáticas consequências?
A terceira pergunta ajuda a situar o contexto da primeira. Quanto maiores forem as perdas em renda e em potencial de comércio decorrentes de um cisma significativo (ou mesmo simbólico, como seria a saída de uma Grécia) tanto para o país demissionário como para os que ficam, menores serão as chances de um dos atores testar os demais além do limite.
E tudo indica que os custos econômicos imediatos de tal dissolução, mesmo que parcial, do bloco seriam de fato impressionantes.
Para não ir mais longe com o argumento, ao país demissionário não restaria senão buscar uma paridade extremamente depreciada de sua nova moeda local sobre o euro, impondo permanente “perda de riqueza” aos seus residentes, cujos ativos não conversíveis em euros sofreriam acentuada desvalorização, como aconteceu nos dois episódios em que a Argentina esteve totalmente quebrada, em 1989 e em 2001.
A saída de um único membro atual da UE também lançaria uma especulação irrefreável sobre qual seria o próximo país a deixar o bloco, provocando uma onda de contaminação capaz de agravar os atuais custos financeiros de rolagem dos países sob suspeita de estresse financeiro.
A conclusão é inequívoca: os custos financeiros imediatos e palpáveis de uma eventual ruptura seriam tão elevados, inclusive para os países líderes, como Alemanha e França, que o interesse na permanência no bloco segue sendo a meta de interesse geral.
Nesse sentido, o risco de reversão para uma situação pré-comunitária permanece muito baixo, por causa do altíssimo custo da administração do pós-ruptura.
Se o custo da dissolução da UE é muito alto e o risco baixo, por que os mercados se apegam tanto a essa hipótese, e o termo “salvar o euro” é empregado com tanta frequência?
Interpretar o que significa salvar o euro ajuda a responder à segunda pergunta do texto: quais as circunstâncias que poderiam levar a um desfecho negativo e surpreendente? A inação das lideranças políticas, envenenada por crescentes radicalismos de minorias estridentes e armadas de meias-verdades, parece ser o ingrediente necessário para um cisma de proporções trágicas.
A inação se traduziria a dificuldade ou impossibilidade das lideranças de avançarem na integração fiscal do continente europeu, por meio da introdução de um sobre-imposto confederativo, em adição ao atual IVA – algo como 3% sobre o valor de vendas finais – de modo a viabilizar o financiamento da reestruturação das finanças dos países-membros afetados e seus respectivos sistemas bancários.
O radicalismo político seria medido pelo grau de repulsa a essa inevitável medida de esforço fiscal.
Fonte: Brasil Econômico, 10/08/2012
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