A ideia de que setembro e outubro costumam ser meses em que se concentram crises financeiras sempre me pareceu sem significância real, mas a história insiste em jogar para estes meses períodos fortes de turbulência.
A crise dessa vez, infelizmente, não foi causada apenas pela piora na situação europeia, mas tem vários dedos do governo brasileiro.
No caso europeu, a situação chegou a um ponto crítico em que a Grécia será pressionada a decidir sobre sua capacidade de pagamento.
A questão não é mais se terá default ou não, mas de quanto será o default. A insolvência do país é tamanha que talvez justificasse um default quase total da dívida. Sabendo disso, o mercado está estressado justamente para saber como será resolvida a crise.
Esse risco colocará pressão no euro por um longo tempo ainda. Ao mesmo tempo, leva o dólar a se apreciar e os preços de commodities em dólar a cair. Isso por si só bastaria para justificar uma depreciação do real, mas então o governo colaborou para essa tendência piorar.
Em julho, implementaram as medidas cambiais que estão sendo sentidas agora. Ao taxar a ponta vendedora, o mercado fica travado e com medo de operar para não pagar o IOF num segmento de margens já estritamente baixas. Sem essa entrada de vendedores o mercado depende da atuação do Banco Central, que vendeu swaps de dólar futuro, mas nada muito relevante.
Parece, no final, que o governo não está muito insatisfeito com a taxa de câmbio nesse patamar e é verdade. Sempre foi sonho do governo que houvesse uma fórmula mágica para depreciar o câmbio e ajudar os exportadores. Uma bravata engolida pelos próprios exportadores que agora são penalizados com IOF justamente na operação que eles utilizam no mercado de derivativos, que é a venda de dólar futuro.
Além disso, o governo diminuiu recentemente as taxas de juros, que devem continuar a cair ainda mais nas próximas reuniões.
Então temos uma mudança de política econômica no Brasil e uma piora no cenário internacional.
Essas duas coisas em conjunto justificam o fato de nossa moeda ter se depreciado mais do que as outras de emergentes.
Justamente porque esses dois elementos ainda devem permanecer, devemos trabalhar com um câmbio que deve continuar depreciado nos próximos meses. No final do ano, com certa sorte, chegamos a um dólar a R$ 1,70.
Se esse cenário permanecer, sem crise aguda na Europa que leve a default desordenado ou crise bancária, a combinação depreciação de câmbio com mercado aquecido será devastador para a inflação. É diferente do cenário de 2008, quando a economia despencou com a crise da Lehman.
Dessa vez, caso o mundo não desabe, esse câmbio significará maior inflação em 2011 e 2012.
Vale lembrar que mesmo uma crise agora não nos salva mais à frente. A mudança de política econômica implicaria nesse caso em juros bem menores do que em 2009 e fiscal mais agressivo ainda. A consequência seria 2013 e 2014 bastante desajustados.
Como no relativo estamos bem, o governo está sendo levado a crer que suas políticas são as corretas, mas infelizmente elas não trazem benefícios de longo prazo ao país.
Fonte: Brasil Econômico, 26/08/2011
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