Tucanos e democratas estão diante de um problema que esperavam evitar: fazer oposição a Lula. Mais complicado ainda: precisam descobrir rapidamente como fazer isso, depois de terem passado muito tempo achando que José Serra seria uma espécie de sucessor natural de Lula.
Assim, tucanos e democratas, formalmente na oposição, não construíram uma alternativa consistente a Lula. Temendo a popularidade do presidente, deixaram para lá um outro programa. O eleitor saberia que Serra tem “biografia” muito superior à de qualquer nome que o PT pudesse apresentar. Dilma Rousseff, então, uma “sem biografia”, seria moleza enfrentar.
Mas agora, uma vez que Lula não deixa Dilma só na campanha e demonstra que a coisa é, sim, com ele mesmo, tucanos e democratas se perguntam: do que mesmo a gente não gosta nesse governo?
Eis o ponto: não é que PSDB e DEM farão abertamente ataques que deixavam reservados, precisam definir quais pontos serão atacados e quais alternativas, propostas. Por exemplo: Serra tem atacado os juros altos e o real valorizado, mas não diz como vai resolver a coisa. Não é trivial. Uma redução, digamos, rápida e forte dos juros, combinada com uma desvalorização do real, traria pressão inflacionária e redução do poder aquisitivo da população.
O candidato tem sugerido nas suas entrevistas que saberá como administrar isso. Parece acreditar que os juros são excessivamente elevados por causa de barbeiragens do Banco Central (BC) de Henrique Meirelles, o que tornaria a solução muito fácil. Bastaria um BC mais esperto.
Muita gente, porém, acha que, se fosse tão simples assim, obviamente os juros já estariam lá embaixo. O problema parece mais complexo, tendo que ver com múltiplos fatores, tais como endividamento público elevado, baixa capacidade de investimento do País, indexação de preços ainda muito ampla, falta de conversibilidade do real. Mas não há nenhum programa tucano-democrata sobre isso.
De novo, aqui, o candidato e seu pessoal dizem ao eleitor: acredite, Serra sabe fazer. Ora, Lula diz: eu estou fazendo, crescimento forte com inflação baixa, e Dilma vai fazer igualzinho. Dilma repete: não se mexe em nada na política econômica, os juros já caíram muito e vão cair mais com o tempo.
Em quem o eleitor acreditará?
José Serra também revelou algum desconhecimento sobre essa história de bancos centrais. Disse que gostava do modelo chileno, no qual, acrescentou, o ministro da Fazenda participa da decisão sobre a taxa básica de juros.
Errado. O ministro da Fazenda lá pode participar das reuniões do BC, pode falar, mas não vota. Além disso, o BC chileno tem sua autonomia e independência garantida pela Constituição. Seus cinco diretores, indicados pelo presidente da República e eleitos pelo Congresso, têm mandatos de dez anos, podendo ser demitidos apenas em circunstâncias excepcionais, mediante processos legislativos e jurídicos. E mais: os mandatos dos cinco diretores não coincidem, mas vencem a cada dois anos. Assim, num governo de cinco anos, o presidente indica apenas dois diretores do BC.
Trata-se de um dos bancos centrais mais independentes do mundo – exatamente o contrário do que Serra vem pregando.
Como essa, há diversas outras questões fortes para as quais tucanos e democratas não têm proposta. Eles criticam o “aparelhamento” do governo Lula, que é um alvo, mas o problema maior é o inchaço da máquina pública e os frequentes reajustes salariais concedidos a todas as categorias.
Continua assim, se a oposição vencer? Ou há algum programa de redução do número de funcionários e/ou reforma administrativa? Reforma da Previdência?
No Congresso, tucanos e democratas têm votado a favor de festivais de reajustes salariais e aumento de gasto público. Como podem falar em austeridade nas contas públicas?
De novo vem a conversa do candidato que sabe fazer.
Falam em carga tributária elevada, mas onde está o compromisso com uma redução de impostos, tema que certamente tem o interesse da classe média? Ou haverá esse compromisso?
E assim vai. Tucanos e democratas acreditavam que o eleitor saberia que Serra faria um governo melhor que o de Dilma. Agora, precisam convencer o eleitor de que Serra fará melhor do que Lula. Vão precisar mostrar mais argumentos que a biografia.
Serra corre o risco de 2002, invertido. Lá atrás, não queria ser o candidato da situação, mas não tinha como ser da oposição, da mudança. Agora, não quer ser oposição a Lula, mas não tem como ser como a situação, a continuidade.
Petrobrás. No dia 9 de junho, em Natal, o presidente Lula disse que as refinarias de petróleo em construção no País não seriam feitas, se a decisão dependesse da Petrobrás. O parecer técnico da estatal, segundo o presidente, sustentava que as refinarias existentes já davam conta da demanda. E esse é mesmo um ponto de vista bem espalhado não apenas no Brasil, mas no mundo – de que há capacidade suficiente nas refinarias.
Mas Lula mandou fazer. Em Natal, disse que foi uma “decisão de governo”. Mas algum tempo atrás, em entrevista ao jornal Valor Econômico, menos modesto, havia dito que mandara mudar os planos da Petrobrás. Segundo o presidente, as refinarias são necessárias para gerar atividade econômica no País e para a exportação. Uma tese, mas o que ocorre se o parecer técnico da Petrobrás estiver correto, de que haverá excesso de capacidade? As refinarias aqui ficarão ociosas, sendo, pois, um mau investimento.
O governo Lula está impondo enormes tarefas e, pois, investimentos à Petrobrás, que precisa de financiamentos e capital para tudo isso. E a estatal já parece atrapalhada com isso tudo, como sugerem as confusões em torno da capitalização.
Fonte: Jornal “O Estado de S.Paulo” – 28/06/10
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