A coluna de Laura Carvalho da semana passada é um primor: é raro encontrar tantos erros concentrados em apenas 3.200 caracteres.
Resumindo, ela afirma que a reforma trabalhista não representa um ganho de competitividade no agregado porque, “se uma mudança reduz o custo com a mão de obra de todos os empresários ao mesmo tempo, não é possível ganhar competitividade em relação aos concorrentes nacionais”.
Essa afirmação trai o desconhecimento do que é a reforma trabalhista, para começar, bem como falhas não menos consideráveis a respeito de como funciona a economia.
Como tive oportunidade de explorar em coluna escrita com meu irmão, Sérgio Schwartsman, a reforma trabalhista essencialmente regula uma série de práticas até então à margem da legislação e dá aos acordos coletivos peso de lei, ressalvados direitos como férias, 13º, horas extras, jornada de trabalho etc.
Seu principal mérito, portanto, consiste em reduzir a incerteza judicial na relação trabalhista.
Assim, o risco de um empregador acabar incorrendo em custos adicionais (por força de decisões da Justiça do Trabalho) se reduz, o equivalente a um aumento de produtividade: produz-se o mesmo com menor custo esperado.
Adicionalmente a reforma encoraja a formalização do trabalho, o que também tem sido associado a maior produtividade, por ganhos de escala, acesso a crédito e outros mecanismos.
Caso soe estranho afirmar que maior produtividade não tem efeitos positivos sobre a economia, é porque é estranho mesmo (se fosse verdade, teríamos que concluir que redução da produtividade não traria consequências negativas, algo que qualquer venezuelano pode atestar em contrário).
Falta à análise de Laura considerar os impactos da produtividade sobre a economia.
Por exemplo, é esquisito considerar que a reforma trabalhista implicaria salários menores; ao contrário, a redução do custo esperado aumenta a demanda por trabalho, elevando, consequentemente, o salário recebido. Assim, sua conclusão sobre a reforma reduzir a remuneração dos trabalhadores não se segue.
Isso dito, também não é verdade que a reforma não implique ganhos relativos de competitividade.
Para ver isso, imagine duas empresas com R$ 100 de capital, remunerado a 10% ao ano, ou seja, custo de capital de R$ 10/ano.
Uma emprega dez trabalhadores ao custo de R$ 1,00 por trabalhador/ano; a outra, cem trabalhadores ao mesmo custo unitário, implicando custo de trabalho de R$ 10/ano na primeira e R$ 100/ano na segunda. Seus custos totais, portanto, são R$ 20/ano e R$ 110/ano, respectivamente.
Uma redução de 10% no custo do trabalho reduz o custo total da primeira para R$ 19/ano, ganho de 5%. No caso da segunda, o custo cai para R$ 100/ano, ganho de 9%.
Vale dizer, empresas intensivas em trabalho ganham mais do que as intensivas em capital, o que deve ser sempre verdade em um mundo em que não exista apenas um insumo para a produção, ou seja, o mundo como ele é…
Relendo a coluna, percebo que afirmei apenas o óbvio: aumento da produtividade é sempre benéfico e eleva salários; já os efeitos de redução do custo do trabalho beneficiam mais quem usa trabalho mais intensamente. Como podem ter escapado a uma professora da USP?
A resposta é simples: quando a conclusão precede a análise, a lógica é sempre sacrificada.
Fonte: “Folha de S. Paulo”, 19/07/2017.
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