A crise mundial tem vivido alguns de seus “melhores momentos”. Crise não é só dor e medo, se ela nos serve de aprendizado. Pode ser crise pessoal, nacional ou mundial.
Os melhores momentos são aqueles em que, entre nuvens ameaçadoras, conseguimos antevisões do processo em que estamos metidos, os porquês, as origens dos abalos. Aprendemos e, assim, ficamos mais fortes.
Raghuram Rajan, professor na Universidade de Chicago (também minha escola) e ex-economista chefe do FMI é um desses acadêmicos dedicados a entender a raiz dos processos de crise. Ano passado, publicou um livro excelente, cujo título é: Fault Lines.
Em português, algo como Linhas de Falha, que são rachaduras tectônicas, fraturas debaixo da terra, que ameaçam a estabilidade de quem está vivendo em cima delas, embora invisíveis a olho nu. O professor Rajan usa a metáfora geológica para apontar que a crise de 2008 decorre de falhas do mesmo tipo, só que na estrutura da economia mundial.
Podem, a qualquer momento, trazer outro abalo sísmico desastroso. E com a autoridade de quem já foi parte da burocracia financeira internacional argumenta, no seu excelente texto, que nenhuma providência prática deve se esperar dos foros de discussão multilateral, como a reunião do FMI da semana passada, em que havíamos previsto aqui a mesma coisa: rigorosamente nada a declarar.
A inação dos órgãos multilaterais decorre, em parte, da definição arcaica de seus objetivos, que precisam ser reformados urgentemente, pois envelheceram como todo o resto.
Mas também há outro fator grave neste caso: o próprio tamanho da crise. Esta é uma enorme “falha tectônica” na economia mundial, envolvendo não só os endividados da vez, que são países avançados (tudo fica pior quando são os ricos que empobrecem!), mas inclusive, os supostamente sadios, como China, Alemanha e Brasil, pois estes também são parte do problema.
As duas primeiras economias, por serem excessiva e cronicamente superavitárias no comércio mundial, gerando um desequilíbrio nos balanços de pagamentos de outros parceiros e instabilidade cambial crônica. E o Brasil, culpado por não fazer todo o dever de casa reformista que poderia, para crescer mais rapidamente e, assim, se fortalecer no papel de puxador da saída efetiva da crise através da sua demanda por importações de bens e serviços.
Além do caráter pandêmico, esta crise é letal pelo próprio custo total do ajuste, um tamanho desproporcional ao caixa dos governos diretamente afetados. A RC Consultores atualizou sua estimativa do custo fiscal, envolvendo cortes de despesas e aumentos de impostos, para cobrir o rombo deixado pelas más práticas financeiras dos dois lados do Atlântico, nos EUA e na União Europeia (EU).
Nos próximos oito anos, entre 2012 e 2019, os dois blocos econômicos terão que arrancar US$ 10 trilhões (algo como 4 a 5% do Produto Interno Bruto acumulado no período) dos seus contribuintes para recolocar suas dívidas públicas em rotas não explosivas.
Em outras palavras, os países têm que rapidamente afastar a especulação sobre sua eventual insolvência. Alguém se habilita a enfrentar politicamente esta conta?
Fonte: Paulo Rabello de Castro, 30/09/2011
No Comment! Be the first one.