Muito já se disse sobre os possíveis determinantes e vantagens da decisão unilateral da presidente Dilma Rousseff de antecipar o calendário eleitoral, lançando sua candidatura à reeleição praticamente na metade do seu primeiro mandato. Como se viu nas últimas semanas, Dilma preferiu “montar no cavalo” em vez de seguir a “lei de ouro” de Getúlio Vargas que preconizava que “política é esperar o cavalo passar”.
Como os parceiros da atual coalizão de governo da presidente vão reagir à campanha antecipada? Como o fator tempo interfere no cálculo dos partidos aliados e de oposição? Quais os principais custos e riscos para os candidatos?
É, de fato, surpreendente ver uma presidente extremamente popular, como Dilma, deflagrar a sua campanha à reeleição tão cedo. Tal comportamento seria de maior serventia a candidatos da oposição ou mesmo a partidos aliados insatisfeitos e tendentes a um voo solo. Estes terão mais tempo para se expor nacionalmente como candidatos e maiores oportunidades de apresentar críticas à atual administração, pois em vez de seis meses, haverá quatro vezes mais tempo de campanha eleitoral.
Decerto que a presidente Dilma teve ganhos com a antecipação da corrida presidencial, como por exemplo, ter freado, pelo menos temporariamente, as ambições do sempre inconformado Lula, na condição de ex-presidente, de tentar retornar ao Planalto já em 2014. A campanha prematura também ajudou a solidificar ainda mais a já estável aliança estratégica com o seu principal parceiro político, o PMDB.
Enganam-se, entretanto, aqueles que imaginam que a estratégia de antecipação da corrida presidencial é destituída de custos e riscos para a presidente.
A literatura sobre governo de coalizão identifica duas situações para maiores ocorrências de possíveis rupturas e defecções em alianças políticas: quando a popularidade presidencial entra em declínio e/ou quando o incumbente é constitucionalmente impedido de disputar um novo mandato, caso em que o presidente torna-se o que se chama de “lame duck”. Nestas circunstâncias, é racional esperar que parceiros políticos vislumbrem no episódio eleitoral que se aproxima uma chance de virarem protagonistas em vez de continuarem eternamente como coadjuvantes.
Dilma não é um “lame duck” e está desfrutando atualmente de enorme popularidade (ancorada principalmente na baixa taxa de desemprego). Porém, a antecipação da campanha e o anúncio da escolha do PMDB, como seu parceiro eleitoral prioritário, traz para a presidente um quadro semelhante em que o risco de ruptura de sua atual coalizão política está dado e de forma iminente.
É esperado, no mínimo, uma maior animosidade entre os parceiros da coalizão. Não seria surpresa, por exemplo, que os atuais parceiros “inflacionem o preço” do apoio político por meio do aumento de demandas e espaço no governo (cargos e ministérios), ou mesmo acesso a maiores recursos orçamentários. O Executivo poderá tentar uma reforma ministerial que acomode tais interesses e consolide, em bases menos vulneráveis, o apoio político a ser carreado na candidatura à reeleição de 2014.
Entretanto, alguns parceiros mais ambiciosos, que saíram vitoriosos das eleições municipais de 2012, provavelmente declinarão das ofertas do Executivo, preferindo apostar em candidaturas próprias. O caso mais claro de ruptura, até o momento, é a iminente candidatura do atual governador de Pernambuco, Eduardo Campos, do PSB. A antecipação da campanha presidencial caiu como uma luva para as suas pretensões e ambições políticas, pois terá tempo e oportunidade de nacionalizar seu nome e posicionar sua candidatura como alternativa à polarização PT versus PSDB. A recente operação “abafa” de Lula e Dilma contra Eduardo é um bom exemplo dos receios do PT em relação à sua candidatura a presidente, principalmente no Nordeste. A ex-senadora Marina Silva, que acaba de lançar seu partido, Rede, também tentará se colocar como alternativa ao embate plebiscitário entre PT e PSDB, como deseja Lula.
A precipitação da campanha presidencial também fez despertar, de um sono quase letárgico, a candidatura do senador Aécio Neves, do PSDB. Baseado nas suas últimas declarações públicas, parece que finalmente um candidato de oposição irá fazer a defesa do legado do governo Fernando Henrique Cardoso. Além de uma agenda de defesa dos pilares do equilíbrio macroeconômico (câmbio flutuante, metas inflacionárias e responsabilidade fiscal), Aécio Neves terá que apresentar uma plataforma que ofereça crescimento com estabilidade acompanhada de maior proteção social e melhor gerência da máquina pública.
Entretanto, o resultado de uma eleição não é apenas consequência da campanha. Eleitores são influenciados por uma variedade de fatores, alguns derivados da campanha eleitoral e outros que vão além do controle dos candidatos. Uma visão bastante difundida entre estrategistas eleitorais é a de que campanha eleitoral se vence com os “fundamentos”. “It’s the economy, stupid” foi a frase cunhada pelo estrategista da campanha vitoriosa de Bill Clinton para explicar a derrota sofrida por George H. W. Bush à reeleição em 1992.
No livro “The Timeline of Presidential Election: How Campaigns do (and do not) Matter”, Erikson e Wlezien (2012) apresentam uma nova interpretação sobre os fundamentos de uma campanha eleitoral. Eles consideram que os “fundamentos” não se estabelecem pelo conteúdo das políticas, mas pela sua persistência, ao causar mudanças de longo prazo na crença e preferência dos eleitores. Alguns efeitos de campanha vêm e outros vão. Os fundamentos são como crenças que permanecem. Alguns são rapidamente identificados no começo, já outros no decorrer de uma campanha.
Diante de uma corrida de largada tão precoce e percurso tão longo como a que teremos pela frente, o desafio será a descoberta dos fundamentos que preencherão as crenças e preferências dos eleitores brasileiros. O candidato que mais cedo descobrir, certamente terá uma cavalgada mais suave em direção à vitória, enquanto os demais candidatos tenderão cair do cavalo.
Fonte: Valor Econômico, 06/03/2013
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