Prezado ministro Guido Mantega, ilustríssima presidenta Dilma.
Eu represento a ONG Besta (Brasileiros Excluídos dos Subsídios, Tetas e Afins). Somos pessoas comuns, sem lobby em Brasília. Entre nós não há um único político. Tampouco contamos com invasores de terras, ex-terroristas comunistas, grandes empresários blindados pelo protecionismo ou algum outro grupo agraciado pelas benesses estatais.
Por isso a vida tem sido tão difícil para nós. Dependemos apenas de nosso trabalho mesmo. E, convenhamos, o ambiente institucional no Brasil não é dos melhores para quem não desfruta de influência no governo. Os obstáculos são desafiadores demais.
A carga tributária é escandinava, com serviços públicos africanos. A burocracia é asfixiante, as leis trabalhistas são obsoletas, e a mão de obra é desqualificada. A infraestrutura é caótica, e a justiça é lenta demais. Por fim, o alto custo do capital acaba impedindo a sobrevida de muitas empresas.
É sobre este último ponto que gostaria de falar. Sabemos como é difícil atacar os gargalos. O governo teria que reduzir seus gastos, e muitos perderiam suas mamatas. Reformas dolorosas teriam de ser encaminhadas ao Congresso, dificultando a “governabilidade”, ou seja, a divisão do butim pelos políticos e seus comparsas. Resta mexer na taxa de juros!
Economistas podem afirmar que o custo do capital no capitalismo deveria ser definido pelo próprio mercado. Eles podem argumentar que, se o custo ficar artificialmente baixo, vai ter mais inflação à frente. Mas quem liga para isso? Basta o governo decretar uma redução dos juros e a inconveniente lei econômica estará revogada. Cria-se riqueza com uma simples canetada do governo.
Não foi isso que fizeram nos EUA? Após a crise do setor de tecnologia, o banco central americano jogou a taxa de juros para 1%, e assim a segurou por longo período. Paul Krugman aplaudia, demandando uma bolha imobiliária para curar o estouro da bolha do Nasdaq. Os liberais vão dizer que isso foi justamente o que aconteceu, mas que seus efeitos foram terríveis, como vimos em 2008. Mas ninguém pode negar que a farra foi divertida enquanto durou. E, se depender do Bernanke, vem mais por aí.
Voltando ao Brasil, temos uma taxa de juros elevada demais. Entre as causas, temos altos tributos, compulsório elevado, pouca oferta de poupança doméstica, concorrência reduzida por excesso de regulação e insegurança jurídica no arresto de bens dos inadimplentes. Mas nós sabemos que a ganância dos banqueiros é o verdadeiro vilão. É verdade que bancos estrangeiros também atuam no país e cobram mais pelos empréstimos aqui. Mas é que eles ficam mais gananciosos ao atravessarem a fronteira (deve ser o clima).
Para aumentar a oferta de poupança no país e reduzir os juros, o governo teria que gastar menos. Voltamos ao problema anterior. É muito mais fácil disponibilizar mais crédito através dos bancos públicos, mesmo sem lastro em poupança efetiva. Os economistas diriam que isso é inflacionário, mas é pura paranóia. A Argentina está aí para comprovar.
O problema não é o crédito público crescente, como no caso do BNDES, que já teve aporte de quase R$ 300 bilhões do governo petista para emprestar aos grandes grupos com taxas subsidiadas. O problema é esta moleza não ser estendida a todos! Nós também queremos pagar juros menores que a inflação em nossos empréstimos. Se a farinha é pouca, então basta imprimir mais, ora!
Por isso a Besta aplaude as medidas recentes do governo, de reduzir na marra a taxa de juros dos bancos públicos. O BB e a Caixa são ou não estatais? Esse papo de autonomia e gestão responsável é coisa de economista chato. A presidenta Dilma mostrou quem manda, impondo uma queda drástica nas taxas desses bancos. Marx defendia o monopólio estatal no crédito como caminho para o socialismo. Não estamos lá ainda, mas com 40% do setor nas mãos do governo, a trajetória é clara.
Alguns economistas questionam por que a redução dos juros não foi feita antes se não há riscos inflacionários, como garante o governo. Ora, a resposta é simples: porque faltava “vontade política”. Este é um governo com coragem, ao contrário dos demais. Este é o tipo de governo que revogaria até a lei da gravidade para impedir a queda de um avião!
Mas a Besta considera que a medida foi tímida. O governo tem que acabar com a usura e a agiotagem, e impor logo juro zero para todos. Crédito infinito e sem custo: eis uma bandeira realmente popular. Alice, personagem de Lewis Carroll, aprovaria. Nós da Besta também. Queremos juro zero!
Fonte: O Globo, 18/04/2012
Você está tão fora da realidade que até os seus patrões do Bradesco, Itaú e cia já abaixaram os juros, exatamente como a “canetada ditatorial” de BB e Caixa, e ninguém está reclamando.
Parece que nem seus chefes levam a sério a sua “teoria econômica” de manual.