O Brasil subiu 14 posições no Ranking Global de Solidariedade em 2020, segundo a pesquisa World Giving Index 2021 (WGI), feita pela Charities Aid Foundation (CAF). Neste ano, o país ficou em 54º lugar numa lista de 114 nações, que representam mais de 90% da população adulta global. É seu melhor desempenho, igualado ao de 2016, quando os esforços feitos por conta do rompimento de uma barragem de rejeitos de mineração em Mariana (MG) resultaram numa mobilização inédita.
O ranking revela que a pandemia produziu uma onda global de solidariedade: “O índice de pessoas que relataram ajudar um estranho chega a impressionantes 55%, o mais alto que registramos em nossa pesquisa anual e que mostra preocupação genuína por nossos semelhantes”, escreve no relatório Neil Heslop, chief executive da CAF. O total equivale a 3 bilhões de pessoas contribuindo de alguma forma para aliviar o sofrimento causado pela covid-19.
No Brasil, até ontem, as doações para causas ligadas à pandemia somavam R$ 7,075 bilhões, segundo a Associação Brasileira de Captadores de Recursos, montante jamais alcançado para campanhas ligadas a uma única causa.
A pesquisa do WGI 2021 fez a 121 mil pessoas ao redor do globo, todas com mais de 15 anos, três perguntas: você ajudou um estranho, doou dinheiro a uma organização ou fez algum tipo de trabalho voluntário no mês passado? A média final foi obtida com base na soma da pontuação em cada um desses critérios, dividida por três.
O Brasil registrou participação de 63% na ajuda a estranhos, ficando em 36º do ranking; 26% na doação de dinheiro, ficando em 70º lugar; e apenas 15% no escore de voluntariado, ficando em 68º, com média geral de 35%.
Para Paula Fabiani, CEO do Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social (Idis), organização da sociedade civil que representa a Charities Aid Foundation no Brasil, há pelo menos três aspectos que poderiam ajudar a melhorar os indicadores brasileiros, particularmente no campo das doações. Do ponto de vista de governos, com campanhas públicas que promovessem organizações da sociedade civil e incentivassem doações e engajamento; das próprias organizações, melhorando sua governança e intensificando uso de tecnologias; e das instituições financiadoras do terceiro setor, ao fortalecer a prestação de contas, compliance e oferecendo crédito de mais longo prazo. “Isso traz confiança para o doador, de que o dinheiro vai chegar na ponta”, afirma.
Os resultados também mostram uma mudança significativa na performance solidária global, segundo Paula. “O estudo revela que vários países desenvolvidos perderam muitas posições no ano da pandemia, enquanto países em desenvolvimento se destacaram, com aumento das doações e ajuda a estranhos”, diz.
Entre os países considerados “ricos” que caíram na classificação estão Estados Unidos, Reino Unido, Canadá, Irlanda e Holanda, por exemplo, ao mesmo tempo que Nigéria, Gana, Uganda e Kosovo subiram.
O país mais generoso do mundo pela segunda vez consecutiva, segundo o WGI 2021, é a Indonésia, com uma pontuação média de 69%, acima dos 59% na última edição, feita em 2018. Mais de oito em cada dez indonésios doaram dinheiro em 2020 e a taxa de voluntariado do país, de 60%, é mais de três vezes a média global.
Em segundo lugar aparece o Quênia, com 76% dos entrevistados informando que ajudaram um estranho e quase metade (49%), que fizeram doações em dinheiro e dedicaram tempo a ações sociais.
A Nigéria subiu de 16º em 2018 para terceiro lugar este ano, com média de 52% na pontuação. Segundo o relatório, existem mais de 80 mil organizações sem fins lucrativos na Nigéria, que ajudaram a mobilizar voluntários e doações durante a pandemia.
Seis dos dez países onde as pessoas estão mais dispostas a ajudar um estranho estão na África, mostra o estudo. Isso pode ser resultado da filosofia “ubuntu”, originária no continente e que prega a empatia, compaixão e a capacidade de conectar-se ao semelhante, sugere o estudo. “O índice também mostrou o papel da religião no comportamento solidário de países como a Indonésia, por exemplo, de maioria islâmica, praticante do ‘zakat’”, afirma Paula, do Idis.
O zakat, ou zacate, é um dos pilares do Islã, uma contribuição anual, com base na renda, que é dever de todo praticante. Segundo relatório anual da Agência da Organização das Nações Unidas para Refugiados, as doações do zakat em dez países de maioria muçulmana aumentaram 12,5% em 2020 em comparação a 2019, beneficiando 1,6 milhão de pessoas, uma alta de 59% em um ano.
Na outra ponta, a pesquisa revela que o Japão é o país menos solidário do ranking, tendo alcançado a média de apenas 12% nas três pontuações.
Ao longo da década de 2009 (quando começou a ser feita a pesquisa) a 2019, o país mais generoso do mundo, na média, foi os Estados Unidos. No ranking deste ano, os americanos aparecem em 19º lugar, com pontuação média de 43%. A China, que costumava ocupar as últimas posições ao longo da década, aparece desta vez em 95º lugar, com 28% de média.
Fonte: “Valor Econômico”, 15/06/2021
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