O incêndio e posterior desabamento do Edifício Wilton Paes de Almeida, no Centro de São Paulo, abriu um interessante debate sobre a quantidade absurda de imóveis abandonados e/ou degradados no Centro da capital paulista. Segundo a prefeitura, existem atualmente mais de 700 imóveis vazios naquela região.
Infelizmente, este é um problema que não está restrito a São Paulo. Quem anda pelo Centro do Rio percebe que, por aqui, a coisa não é muito diferente. São centenas de prédios antigos abandonados e/ou em processo de deterioração, muitos dos quais com risco de desabamento. Não é raro encontrarmos também imóveis vítimas de incêndio, dos quais sobraram apenas a fachada (tombada) e um terreno vazio atrás.
Uma reportagem recente do site de notícias G1 tentou responder à pergunta que está na cabeça de muita gente: por que há tantos prédios abandonados por aí? Não é uma pergunta de fácil resposta, principalmente porque existem diversas causas (não excludentes) concorrendo entre si.
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A explicação mais comum fala de falta de planejamento urbano e fiscalização por parte do poder público. Estas podem ser até causas menores, mas definitivamente não explicam por que tantos proprietários — agindo de forma absolutamente contrária à própria natureza humana — simplesmente abandonam seus bens.
Evidentemente, existem outras razões. Eu destacaria pelo menos três, porém lembrando que esta não é uma lista exaustiva:
1) zelo exagerado por tudo que é antigo;
2) excesso de burocracia e regulamentações;
3) absurda lentidão judiciária.
Analisemos uma a uma:
Não seria nenhum exagero dizer que grande parte dos imóveis existentes no Centro do Rio é tombada ou situada em áreas de preservação (corredores culturais e outras). Ninguém é contra a conservação do patrimônio cultural e arquitetônico das cidades, mas é inegável que há excesso de tombamentos em Pindorama. Para início de conversa, quaisquer das esferas de governo — federal, estadual e municipal — estão aptas a decretar tombamento e/ou preservação. Não por acaso, há casos de imóveis tombados por mais de uma esfera, e cuja preservação deve obedecer aos detalhados ditames de ambas. Sem falar da confusão que alguns fazem entre o antigo e o belo.
Junte-se a essa volúpia preservacionista quase nenhuma preocupação com a compensação dos proprietários pela perda de valor de mercado dos seus imóveis quando objetos de tombamento ou preservação — no Rio, há previsão de isenção do IPTU, mas sua concessão está vinculada às sempre necessárias obras de conservação e adequação ao projeto original, as quais não costumam sair nada baratas.
Além de caras, estas obras estão sujeitas a tanta burocracia, exigências arquitetônicas e regulamentações que, não raro, acabam inviabilizadas — digo isso com a experiência de alguém que tenta, há dez anos, regularizar a situação (tanto arquitetônica quanto fiscal) de um sobrado bastante bem preservado na região da Candelária. Em resumo, o detalhismo dos ciosos agentes públicos, no afã de preservar exatamente e nos seus mínimos detalhes a arquitetura original, acaba muitas vezes inviabilizando a recuperação dos prédios, condenando-os à completa degradação.
Finalmente, porém não menos importante, vem a extrema lentidão do nosso Judiciário. Uma parte dos imóveis abandonados é refém de intrincados processos de falência empresarial ou sucessão familiar, os quais costumam arrastar-se por décadas. O resultado é que esses imóveis acabam numa espécie de limbo jurídico, sujeitando-os a toda sorte de invasões e ocupações irregulares.
Fonte: “O Globo”, 15/05/2018