“O Brasil está em recessão técnica”, disse-nos o IBGE na semana passada. Para os iniciados, recessão técnica é nada mais do que a constatação de que a atividade econômica do país se retraiu pelo segundo trimestre consecutivo. Para os incautos, “recessão técnica” é um péssimo termo para expressar as mazelas que nos afligem. Lembra “parada técnica”, aquela regra que a Fifa inventou e que vimos na Copa, quando a temperatura excedia os 32° e os jogadores precisavam parar para dar aquela respirada, aquela hidratada, para então retornar ao campo a pleno vapor.
A economia brasileira não há de voltar ao campo a pleno vapor. Há quatro anos a coitada tenta se reerguer e dá de cara com os obstáculos que o governo impõe, inadvertidamente. Inadvertidamente porque pensa estar fazendo o melhor para o país e se recusa a perceber que nada funcionou até agora. Culpa a “crise externa” – ainda que os EUA estejam se recuperando e a China, crescendo -, secas e caprichos da natureza. Culpa até a Copa das Copas: “Foi a falta de dias úteis”, diz Guido Mantega, e ecoa a presidente Dilma Rousseff.
Por certo, o mundo não está fácil. Problemas geopolíticos são muitos, das ameaças de Vladimir Putin às investidas do movimento islâmico Isis. A Europa está à beira de tornar-se um novo Japão: economia que não cresce, risco de deflação ou de queda generalizada dos preços. Nada disso, entretanto, tem impedido nossos pares de crescer. Podem até não estar se expandindo no ritmo que gostariam, mas crescem ainda assim. Afora as Argentinas e Venezuelas do mundo – casos escrachados de má gestão econômica -, os demais países emergentes têm conseguido contornar os problemas globais com alguma destreza. Não o Brasil. O Brasil do investimento que “ia se recuperar”, mas que caiu 11% no segundo trimestre de 2014. Brasil, país da poupança de míseros 14% do PIB, montante que não dá nem para o começo dos ambiciosos planos de desenvolvimento do atual governo.
As políticas do governo deram errado. E agora? Como sair do atoleiro criado pelas supostas boas intenções que resultaram no pior resultado para a atividade desde 2009, ano das sequelas da maior crise financeira internacional do século? Essas são as questões que o próximo governo deverá enfrentar. Não nos iludamos: os próximos quatro anos hão de ser dedicados a consertar os estragos provocados pela má condução econômica do atual governo. A infraestrutura, o resgate da competitividade da economia brasileira, as reformas estruturais relativas à estrutura tributária e ao mercado de trabalho ficarão para depois. Não importa o que digam os candidatos hoje. A verdade inconveniente é que nenhum esforço para resolver os problemas estruturais do país resultará em algo se a estabilidade macroeconômica – hoje desmontada – não estiver consolidada.
Promessas sobre o que um ou outro fará para melhorar a saúde, a educação, a segurança nada significam se o país não voltar a crescer com inflação baixa, o que só pode ocorrer se a política fiscal for aprumada e a política monetária, resgatada. A política monetária, como comentei recentemente em entrevista para este jornal, é a parte fácil. Difícil mesmo é desembaralhar os balanços do Tesouro, das empresas do setor elétrico, do BNDES, da Caixa Econômica Federal. Sem isso, não há saneamento fiscal possível. Por onde começar? Confesso que não sei.
O que sei é que as promessas do atual governo perderam o sentido, as explicações fracassaram e não há mais espaço, tempo ou paciência para aguentar o discurso enfadonho que nos levou à “recessão técnica”. O PT teve a sua era e deixou seu legado – uma melhora passageira da distribuição de renda. Passageira porque não souberam fazer a economia crescer e pouco se importaram com a inflação em alta. Repetem à exaustão que o mercado de trabalho está bem, mas a verdade é que o país que encolhe perde empregos, mais cedo ou mais tarde. Se nem sempre é vantajoso mexer em time que está ganhando, em time que está perdendo essa é uma necessidade premente. Está na hora de mexer.
Fonte: O Estado de São Paulo, 5/09/2014
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