A decisão do presidente Temer, anunciada por ele mesmo, de excluir os servidores públicos estaduais e municipais da reforma da Previdência enfraquece o projeto, embora não o fira de morte. A exclusão beneficia os mais poderosos grupos corporativistas do país: os da educação, da segurança, do Judiciário e do Ministério Público estaduais. Pelo menos se espera que a parte federal da reforma tenha curso.
A medida deve reduzir as resistências contra o projeto no Congresso e assim facilitar sua aprovação, mas abre um sério precedente. Por que não excluir os juízes federais da reforma? Se os juízes estaduais estão fora por que não eles também? Tudo indica que parlamentares tentarão estender o benefício à Justiça e ao Ministério Público da União.
Atribuir aos estados e municípios a tarefa de cuidar das regras de aposentadoria de seus próprios funcionários é deixá-los nas mãos de grupos que constituem a coalizão de veto mais resistente do país. Funcionários estaduais, mais próximos das autoridades locais, conseguem ser bem-sucedidos em suas demandas corporativas. Em alguns estados, há mais oficiais da polícia na inatividade do que em serviço efetivo. Poucos conseguirão aprovar reformas na dimensão necessária. Novos problemas devem aparecer à frente.
A justificativa do governo é fraquíssima: preservar a autonomia dos estados. Acontece que fixar regras de aposentadoria na Constituição não significa retirar autonomia dos estados. A Constituição é uma norma de caráter nacional e não federal. Regular a matéria na Carta Magna é evitar que as corporações estaduais forcem sua rejeição. As regras básicas do ICMS estão na Constituição e nem por isso jamais se disse que isso atingiria a autonomia estadual.
Analistas que pregam a descentralização federativa a qualquer custo tenderão a apoiar o recuo de Temer. Ocorre que a experiência não corrobora a ideia de que a descentralização seja melhor. Os estados costumam utilizar sua autonomia fiscal para aumentar salários e a generosidade insustentável dos seus regimes de aposentadoria e pensões. Basta ver que aconteceu recentemente no Rio de Janeiro, no Rio Grande do Sul e em Minas Gerais, cuja irresponsabilidade fiscal constitui prova eloquente dessa lamentável situação.
Perdemos uma oportunidade de impor limites mais rígidos aos privilégios dos servidores públicos estaduais. Um ou outro estado vai conseguir diminuí-los, mas dificilmente no nível requerido. Uma nova reforma, constante da Constituição federal, se tornará necessária no futuro. Enquanto isso, o país e nós, os contribuintes, pagaremos a conta.
Fonte: “Veja”, 22 de março de 2017.
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