2014 inaugurou nova fase para a economia mundial.
A Grande Recessão dos últimos seis anos, causada pela crise financeira de 2008, ainda mantém vivos os seus efeitos, mas os principais problemas parecem ter sido dissipados.
No começo do ano, indicadores sinalizavam maior otimismo com relação à recuperação das economias desenvolvidas – e maior pessimismo quanto às perspectivas de crescimento dos mercados emergentes.
O principal impulso de curto prazo à recuperação mundial tem vindo dos Estados Unidos, onde é possível observar melhorias no desempenho do mercado de trabalho e do mercado imobiliário.
Na Europa, após longo período de contração, a zona do euro registrou crescimento positivo no primeiro trimestre.
Já os países em desenvolvimento avançaram apenas modestamente. Muitos mercados emergentes estão enfrentando desaceleração do crescimento, especialmente quando se compara com o período pré-crise.
Esse cenário parecia indicar uma mudança de marés na economia global: recuperação no Norte e declínio no Sul.
Mas, agora, no final do ano, a situação é um pouco diferente – e mais preocupante. A recuperação econômica não tem sido aquela esperada. Os mercados emergentes continuam patinando. O crescimento da China está em níveis muito abaixo daqueles registrados desde 2009.
Entre os desenvolvidos, a situação não é tão boa. O Japão continua estagnado. E a Europa apresentou resultados decepcionantes da atividade econômica a partir do segundo trimestre deste ano.
As melhores notícias têm vindo dos Estados Unidos e do Reino Unido. O PIB norte-americano, no terceiro trimestre, manteve a trajetória de crescimento observada nos últimos anos: 3,5% (em termos anualizados).
A expectativa de crescimento em 2014 mantém-se em torno de 2%, segundo cálculos do FMI. Para o Reino Unido, a previsão é de 3,2%.
Nesse contexto, uma mudança na política monetária dos Estados Unidos é esperada e antecipada. Enquanto a economia norte-americana esteve doente, foram injetadas doses cavalares de estímulos. Agora, já caminhando com as próprias pernas, chegou o momento de avaliar como reduzir essas doses energéticas.
[su_quote]O Brasil pode ficar numa situação difícil, com queda do preço das commodities [/su_quote]
O Fed, por exemplo, já começou a afrouxar as medidas de incentivo e, brevemente, deverá elevar a taxa básica de juros, que se mantém em piso recorde, perto de zero, desde dezembro de 2008.
Essas mudanças poderão atingir fortemente os países em desenvolvimento. A elevação da taxa básica de juros nos Estados Unidos poderá redirecionar fluxos de capitais de volta para lá.
Nesse cenário, as perspectivas de baixo crescimento no mundo emergente poderiam estimular a retirada de investimentos.
O Brasil, por exemplo, pode ficar numa situação difícil, com queda do preço das commodities (especialmente em razão da diminuição da demanda desses produtos por parte da China), dificuldades para atrair financiamento externo, redução de investimentos, queda no preço dos ativos financeiros e desvalorização cambial.
Na Europa, o tempo continua nublado: o vice-presidente da Comissão Europeia, Jyrki Katainen, reconheceu que a recuperação econômica –iniciada em 2013– deixou a desejar, em comparação com outras economias desenvolvidas e com exemplos históricos de superação de outras crises financeiras.
Isso se deve a fatores geopolíticos (crises na Ucrânia e Oriente Médio, por exemplo), a um ajuste incompleto de desequilíbrios macroeconômicos na zona do euro, bem como ao ritmo decepcionante das reformas institucionais e estruturais dos Estados membros da união monetária.
Esses desafios serão temas importantes da agenda da Cúpula do G20 de Brisbane (Austrália), que ocorrerá nos próximos sábado e domingo. Essa será a primeira Cúpula do grupo focada na transição da luta contra a crise mundial para o apoio ao crescimento.
Os países da União Europeia deverão, por exemplo, pressionar pela adoção de um “Plano de Ação de Brisbane sobre Crescimento e Empregos”, que envolveria estratégias abrangentes de crescimento apresentadas pelos membros do G20. Uma espécie de PAC internacional.
O Brasil terá importantes desafios à frente. O crescimento econômico está no topo de nossas preocupações políticas domésticas. Mas essa preocupação também deve ser transportada para o cenário internacional.
Para impulsionar o crescimento, devemos investir em novo ciclo de adesão à globalização? Como aproveitar o cenário de recuperação dos Estados Unidos? Como ampliar o nosso acesso a mercados? Como atrair investimentos internacionais? Que oportunidades buscar em uma economia mundial que cresce a passos lentos? Se o cenário é de recuperação paulatina do Norte, que tipo de diplomacia beneficiará os 200 milhões de brasileiros?
Nas relações internacionais, a força política dos países também anda lado a lado com a força de suas economias.
Para recuperar o vigor econômico, reformas domésticas são indispensáveis. Mas também será necessário traduzir necessidades internas de promoção do crescimento em oportunidades externas.
A recuperação da crise tem impostos novos desafios, que vão exigir audácia política e adaptações de estratégias.
Fonte: Folha de S. Paulo, 14/11/2014
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