Inaugurado com pompa e circunstância por dom Pedro II em 1889, o Hospital São Sebastião, criado para atender os doentes das inúmeras epidemias que varriam o Rio no fim do século XIX, recebeu, em seu primeiro ano de atividade, 40 pessoas com febre amarela. No ano seguinte, foram 1.050. Agora, 128 anos depois, batizada de Instituto de Infectologia São Sebastião, a unidade é considerada referência para o atendimento da doença no estado e tem recebido novamente pacientes com a suspeita de terem contraído o vírus. Mas está longe de ter a mesma grandiosidade do tempo do Império. O prédio onde funcionava, no Caju, e que já teve 500 leitos, foi desativado em 2008. Desde então, pacientes e funcionários “vivem de favor”: sem sede própria, o instituto passou quatro anos hospedado no Instituto de Assistência dos Servidores do Estado (Iaserj). Em 2012, saiu de lá e hoje ocupa o quarto andar de um prédio anexo ao Hospital Federal dos Servidores do Estado. No local, há apenas 12 leitos. Somente três deles são destinados a pacientes em estado grave — seja por febre amarela, leptospirose, meningite, raiva ou Aids.
Vidro quebrado e respirador em falta
Ao sair do elevador, o visitante percebe logo a situação de penúria do centro de referência para doenças infectocontagiosas: há vidros de portas quebrados. Os móveis no instituto são antigos e não há sequer cadeiras no corredor. Na parede da enfermaria, faltam armários para guardar o material de uso diário dos profissionais de saúde, o que obriga os médicos a pendurar estetoscópios nas válvulas de registro de água do hospital. Neste mesmo cômodo, um quadro exibe o nome dos pacientes internados e o número do leito que eles ocupam. Há nove pessoas e doze vagas, mas uma delas não pode ser ocupada porque, segundo o quadro, o leito está quebrado. A enfermaria é pequena, sem espaço suficiente para médicos, equipe de enfermagem, pacientes e seus acompanhantes. Mas não são apenas os problemas físicos que chamam a atenção no espaço.
Segundo um dos médicos da unidade, que preferiu não se identificar, faltam insumos, como cateteres para punção venosa profunda. Nem sempre há respiradores para os três leitos reservados a pacientes em estado grave. Segundo o profissional, eles estragam e não têm manutenção.
— Não tem material no tamanho certo para entubar pacientes. E esse problema não é pontual. A principal falta é de pessoal — contou o médico, afirmando que há atualmente cerca de 30 profissionais, metade do que havia antes da transferência para o Iaserj.
— O governo diz que transferiu o instituto de lugar, mas isso não é verdade. Ele fechou um hospital que funcionava num prédio enorme, com muitos leitos, e criou uma enfermaria dentro de outro hospital. Não é a mesma coisa, é um crime — diz Jorge Darze, diretor da Federação Nacional dos Médicos do Rio de Janeiro. — Se a febre amarela avançar, o instituto não terá como atender a todos. Os doentes vão parar no corredor de hospitais de emergência, como já acontece com quem tem dengue, zika e chicungunha.
Ontem, havia nove doentes internados no instituto, mas o chefe da equipe não quis informar quantos tinham suspeita de febre amarela. Um dos que estão sob investigação é o estudante Eduardo Fedman, de 16 anos. Morador de Casimiro de Abreu, onde foram confirmados os três primeiros casos da doença no estado, o adolescente esteve recentemente numa cachoeira da região, perto do local onde moravam as vítimas da doença no município. A mãe do jovem, a diarista Eunícia da Costa Fredman, de 40 anos, contou ao “Globo” que o primeiro diagnóstico que o filho recebeu, ainda em Casimiro de Abreu, foi de sinusite.
— Fiquei desesperada. Depois do carnaval, meu filho foi a uma cachoeira no Sítio do Pai João, perto do local onde a pessoa que morreu com febre amarela vivia. O Eduardo até lembra que foi picado por um mosquito no pescoço. No último dia 6, ele começou a ter febre e dor de cabeça. Levei ao hospital central da cidade (Ângela Maria Simões Menezes) e disseram que era sinusite. Fizeram uns exames e mandaram ele para cá. Estamos aqui desde ontem. O resultado do exame sai amanhã (hoje). Mas agora ele está melhorando — disse Eunícia.
Segundo ela, além do filho, mais duas pessoas, pelo menos, estariam internadas com sintomas da doença:
— Tem que vacinar todo mundo mesmo. É um desespero essa doença.
O secretário estadual de Saúde, Luiz Antônio Teixeira Júnior, informou que, apesar do Instituto de Infectologia São Sebastião ser referência, outras unidades, tanto do estado como da rede federal estão preparadas para atender casos de febre amarela, caso haja necessidade:
— Todos os nossos hospitais têm CTI. O São Sebastião é apenas uma unidade. Mas estamos trabalhando para não ter nem surto, quanto mais epidemia. Não há cenário epidemiológico. Estamos com um cronograma de vacinação até o fim do ano para imunizar toda a população, mas, se for preciso, antecipamos isso.
Em nota, a Secretaria estadual de Saúde garantiu que, no caso do São Sebastião, “não há desassistência aos pacientes internados na unidade. Por funcionar nas dependências de um hospital geral, que presta assistência em média e alta complexidade, os pacientes do instituto têm acesso às especialidades médicas e serviços oferecidos no Servidores”. A secretaria informou que os insumos são de responsabilidade do governo federal.
Fonte: “O Globo”.
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