Quando se fala na agenda de reformas, uma medida parece ser consenso: a necessidade de reformular o sistema tributário. Nesta terça-feira (21), o assunto voltou a entrar em pauta na Câmara dos Deputados e o governo federal apresentou a primeira fase, propondo a unificação de impostos federais como PIS e Cofins. Mas, apesar da convergência acerca da necessidade de uma mudança, há muitas dúvidas com relação à melhor modelagem. O Instituto Millenium conversou com o economista Clóvis Panzarini, que traçou um panorama sobre o que está sendo proposto e analisou a situação tributária do Brasil. Ouça o podcast!
A simplificação de PIS e Cofins é vista com bons olhos por Panzarini pois, segundo ele, “do ponto de vista formal simplifica muita coisa”. “A legislação do PIS e da Cofins é uma colcha de retalhos, hoje. É uma confusão. Transformar em um único tributo, limpo, com distribuição de valor agregado, é um progresso. Mas isso pode significar uma enorme redistribuição de carga tributária. Há setores que vão ter aumento e outros que vão ter redução”, disse. O especialista lembrou ainda que o debate sobre os impostos federais – também se estuda a unificação de tributos como o IOF e o IPI – são mais simples, por não envolverem os Estados.
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De acordo com Clóvis Panzarini, um dos principais problemas hoje em dia é com relação à tributação de bens e serviços. “Isso virou um emaranhado de normas federais, estaduais e municipais que ninguém consegue entender”, disse, destacando que um dos maiores entraves que precisam ser solucionados é com relação à cobrança do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços, o ICMS. “À exceção do Canadá, esse tributo, que é o Imposto sobre Valor Agregado, é de natureza federal no mundo inteiro. O nosso ICMS funcionou bem quando não havia federalismo de fato, na época da ditadura. O imposto era estadual, mas gerido pelo Ministério da Fazenda”, explicou.
Panzarini lembrou que a Constituição deu autonomia para que os Estados definissem a legislação sobre o ICMS. “Daí surgiu a guerra fiscal, com uma situação absolutamente inadministrável, quebrando os princípios básicos do que deve nortear o sistema tributário. E, mais recentemente, os Estados passaram a implementar, de forma abusiva, a substituição tributária, que é a cobrança na fonte do ICMS. Isso trouxe uma confusão imensa, criando um sistema tributário para cada mercadoria. É um demônio que ninguém consegue entender”, destacou.
A questão do ICMS mostra como a reforma tributária é complexa e explica o porquê de ser tão difícil aprovar um novo sistema no Brasil, mesmo sendo um consenso a necessidade de mudanças: são muitos interesses divergentes e difusos que se conflitam na hora de um debate no Congresso. Panzarini destacou a proposta dos Estados, que aceitam uma mudança nas regras das suas principais fontes de arrecadação desde que o governo federal crie um fundo que garanta a receita mínima no nível atual de arrecadação.
“Eu não sei se a União tem cacife para montar um fundo desse tamanho. Há duas propostas de reforma tributária, e uma delas está na PEC 45, que traz enorme modernização: um único tributo sobre o consumo, que seria partilhado entre União, Estados e municípios. Esse modelo é muito difícil de ser apoiado por todos os Estados, porque haverá muitas Unidades da Federação que vão perder receita. Vamos ver se o Congresso tem força para fazer andar essa proposta”, analisou.
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Panzarini também avaliou a polêmica relacionada à proposta de criação de um imposto sobre as transações digitais, iniciativa que chegou a ser comparada com a CPMF. O economista destacou que a medida causaria impacto pois, hoje, praticamente todas as transações são digitais, com o uso cada vez mais comum deste tipo de ferramenta e a obsolência de instrumentos como o talão de cheques. “Todas as transações financeiras hoje em dia são digitais. Tudo é digital. Cartão de crédito, operações de transferências bancárias etc. Tudo praticamente é feito pelo computador”, disse.
Reformas, como a administrativa, são fundamentais para destravar o país
Dados disponibilizados pelo Ministério da Economia mostram a necessidade premente de reformas estruturais no Estado brasileiro. Atualmente, as empresas gastam mais de 1,5 mil horas por ano para a declaração. O tempo médio do processo de execução fiscal na Justiça ultrapassa oito anos, e um montante de 51% do Produto Interno Bruto (PIB) está no contencioso tributário federal.
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A reforma proposta pelo governo federal prevê o IVA (Imposto sobre Valor Agregado) federal, compatível com o que diz as PECs 45 e 110. Com isso, acabam os tributos diferenciados para vários setores, além de uma centena da regras especiais do PIS/Cofins. Para se ter uma ideia, a lei que regula o PIS e a Cofins tem mais de 2 mil páginas, gera uma indefinição sobre o que é insumo e a cumulatividade: o cidadão não sabe exatamente o quanto paga de imposto. O projeto prevê também a simplificação do IPI; a reforma do Imposto de Renda tanto para pessoa física quanto para pessoa jurídica; e a desoneração da folha de pagamentos para a redução do custo do trabalho formal.
Com o objetivo de aumentar a produtividade do país, proporcionando crescimento econômico, o Ministério da Economia apresenta a proposta de reforma tributária tendo como bases princípios como a simplificação e a redução dos custos; segurança jurídica; transparência; equidade e fim de privilégios; aumento dos investimentos e empregos; além do combate à evasão e à sonegação.