Dois dias após comemorarmos a vitória da aprovação do fim dos supersalários na Câmara dos Deputados, nos deparamos com a notícia de que a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2022, foi aprovada pelo Congresso Nacional com um aumento de R$ 2 bilhões para R$5,7 bilhões do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, mais conhecido como fundo eleitoral.
No momento de fragilidade econômica que vivemos, principalmente com o desemprego alavancado pela pandemia de Covid-19, muitos de nós, brasileiros, ficamos descrentes com a política e até com a democracia brasileira. Afinal, onde está a vontade do povo em decisões como essa?
“Estamos destinando quase R$ 6 bilhões de recursos que poderiam ser destinados para a saúde, educação ou soluções tecnológicas, para aumentar a qualidade de vida do cidadão brasileiro, mas estão sendo destinados para financiar algo que é manifestamente incompetente, que são os partidos políticos brasileiros”, afirmou o advogado especializado em direito do Estado, Sebastião Ventura. Ouça o podcast!
A cientista política Priscila Pereira Pinto, explica que o problema no Brasil não é a falta de democracia, mas sim, o tamanho do Estado e a falta de cobranças da população para que ele diminua. Ouça!
“Estamos vivendo em uma democracia, mas uma democracia que a população brasileira decidiu assinar embaixo que vamos ter um governo, um Estado, de um tamanho gigantesco, com mais de 500 deputados federais, com mais de 80 senadores, 22 ministérios e com uma quantidade de servidores públicos absurda, com cargos completamente desnecessários – que consomem nossos impostos e tributos”, esclarece.
E, como o Instituto Millenium acredita que a melhor ferramenta para enfrentar o sistema, é a organização de grupos na sociedade civil, com informações para fiscalizar e cobrar dos nossos representantes medidas alinhadas com a vontade e benefícios da maioria, separamos um material explicativo para você entender como funciona o financiamento de campanhas no Brasil.
Fundo eleitoral
O fundo eleitoral foi criado em 2017, pelo Congresso, como forma de compensar a proibição do Supremo Tribunal Federal, de doações feitas por pessoas jurídicas para partidos e candidatos em 2015.
O advogado especializado em direito do Estado conta que a medida foi imposta com a finalidade de combater a corrupção entre empresários e políticos, após os escândalos da Lava Jato. Mas, além de não ter sido uma medida eficaz, foi retirado do empresário o direito de participar de decisões públicas.
“O que tínhamos que fazer era criar mecanismos de fiscalização, e não proibir a doação privada, que é algo legítimo. As empresas, os empresários, devem ter a intenção de contribuir para campanhas políticas privadamente para que novas lideranças surjam, para que novos políticos apareçam, para que novas ideias venham para a cena pública”, disse.
Fundo eleitoral x fundo partidário
Além do fundo eleitoral, outra fonte de financiamento público de campanhas é o Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos, o Fundo Partidário, existente desde 1965.
A principal diferença entre os dois, é que o fundo eleitoral é composto integralmente por recursos públicos, retirados do Tesouro Nacional, e disponibilizado apenas em anos de eleições. Já o fundo partidário é um misto de verbas públicas e privadas, que, de acordo com o TSE, são compostas por dotações orçamentárias da União, multas, penalidades e outros recursos atribuídos pela lei 9.096/1995. Esse recurso é destinado mensalmente para os partidos e pode ser utilizado para custeio de despesas estruturais, como água, luz, internet, e também impulsionamento de conteúdo na internet, compra de passagens aéreas para não-filiados e contratação de advogados e contadores.
Sebastião Ventura destaca que essa prática de financiamento público a partidos políticos é algo que começou durante a ditadura militar, e não deveria ter sido mantida pós-redemocratização. “Isso é absolutamente antidemocrático. Os fundos são uma entidade jurídica de direito privado e devem ter financiamento próprio, dos seus filiados”, ressaltou.
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Voto Distrital e a Reforma Política
Uma das justificativas para o financiamento público de campanhas é a diminuição do poder econômico nas escolhas de representantes e o alto custo que uma campanha eleitoral possui, especialmente para deputados, que concorrem com muitos candidatos e percorrem o estado inteiro.
Como explica o cientista político José Álvaro Moisés, em artigo, “o sistema proporcional de lista aberta com distritos de mais de 30 milhões de eleitores, como São Paulo, encarece as campanhas, dificulta a escolha de candidatos, estimula a personalização do voto em detrimento de projetos coletivos e favorece a competição entre candidatos do mesmo partido”.
Para Luiz Felipe d’Avila, presidente do Centro de Liderança Pública, o voto distrital é o ponto central da Reforma Política, já que além da possibilidade de reduzir drasticamente as despesas de campanha, com ele será possível mudar o perfil e a qualidade dos parlamentares no Brasil.
“O voto distrital faz com que o eleitor aproxime-se mais de seus parlamentares. Ele vai saber exatamente quem é o candidato do seu distrito eleitoral, portanto ficará muito mais fácil fiscalizar e cobrar o seu parlamentar”, ressaltou em vídeo. Assista!
O cientista político Carlos Pereira defende a redução do número de partidos já que sem isso “o presidencialismo brasileiro continuará fragmentado, necessitando de um presidente que saiba montar e gerenciar coalizões com partidos efetivos para ter condições de governar”.
Recentemente, o atual presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP – Alagoas), trouxe à tona a discussão de uma possível mudança no sistema de governo, passando a um semi-presidencialismo ou parlamentarismo. Para Priscila Pereira Pinto, toda discussão é válida, mas há de ter cautela.
“A sociedade brasileira está pronta para tomar uma decisão radical e mudar de uma vez por todas o sistema presidencialismo para sistema parlamentarismo? Será que isso resolve a questão das alianças, a questão de quantos servidores a gente precisa ter, quantos ministérios? Será que isso resolve a questão de quantos partidos políticos deveriam ser permitidos no Brasil?”, indagou.
Como foi dito no início, a democracia existe, o questionamento necessário é sobre a qualidade dessa democracia e o que pode ser feito para melhorá-la. Cobre de seus representantes medidas que diminuam o tamanho do Estado, fiscalize o que tem sido feito com o dinheiro dos seus impostos, e na hora de escolher seus representantes, vote em quem está trabalhando pelo bem do Brasil, e não dos próprios interesses.