Acontece com muitos economistas, não há nada especial comigo, os amigos perguntam direto:
—O que é preciso para fazer a economia decolar?
De tanto ouvir a mesma pergunta, tão importante, afligindo tanta gente, e na impossibilidade de conseguir a atenção de quem pergunta para a dissertação necessária para a resposta, bolei uma resposta simples e enigmática: —Regina Duarte!
Não, não é para substituir o ministro Paulo Guedes, que andou enfrentado uns solavancos na semana que passou. Mas é para contar uma história.
Começa com uma pergunta difícil: como conciliar a enorme e generalizada demanda por otimismo na economia com a imensa contrariedade política que o próprio presidente parece empenhado em cultivar? Bem, o presidente reconhece a importância dos imperativos da economia, que funcionam mais ou menos como a meteorologia para o tráfego aéreo. Não dá para desafiar, mas depende do presidente. Alguns são muito afoitos, mas, em geral, todos sabem fazer política, cada qual no seu estilo. Há dois registros a fazer sobre este presidente.
O primeiro é a adesão à agenda liberal reformista, ainda que através de um casamento de conveniência com o superministro Paulo Guedes, o símbolo dessa pauta, que não é a do coração do presidente. Não é amor sincero, o presidente não é um liberal, pouco importa o seu time do coração, mas já passamos a marca de um ano nesse matrimônio. Tudo indica que vai prosseguir, com tremores típicos desse tipo de união. O segundo registro é de um teorema antigo: a experiência da Presidência começa de verdade no dia em que o presidente precisa detonar um amigo. Ninguém escapa dessa situação, Bolsonaro a enfrentou com mais de um ano no cargo, no dia em que o secretário da Cultura fez uma performance grotesca, praticamente uma autoimolação, e a surpresa não foi atirar o amigo fora do barco —ele praticamente pulou na direção dos tubarões —, mas em se recrutar Regina Duarte para este lugar.
Seria excessivo dizer que o presidente, com Regina Duarte, pacificou a cultura, talvez isso não seja possível nem com a Virgem Maria. Mas não há dúvida que a atmosfera ficou mais leve.
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Até este momento, o presidente resolvia crises recorrendo a seus apoios eleitorais primais, sempre radicalizando, como se já estivesse em campanha. Mas ainda falta muito. O presidente não é só para seus apoiadores incondicionais. Com o episódio Regina Duarte, todavia, a receita mudou.
Talvez não seja mesmo factível trabalhar apenas com ministros de perfil moderado, modelo Regina Duarte, pois o grupo de tendências aglutinadas em torno do presidente, e importantes para a sua vitória eleitoral, inclui alguns tipos bem difíceis. Não é um problema desse governo apenas, o petismo, por exemplo, sempre cultivou uns grupelhos bem radicais, mas os manteve muito diluídos. Sempre dá para melhorar a mistura, sem que seja uma rendição aos adversários políticos ou ao Centrão.
É por aí que devemos caminhar pois ele é o presidente eleito, e neste tópico, estou com Fernando Gabeira: é preciso ser construtivo. Bem, a pergunta foi sobre o que falta para a economia melhorar.
Repito a tese:
—Regina Duarte.
A resposta mais técnica seria:
—A boa política.
A menos técnica:
—A economia precisa de sossego. O presidente tem muitos ministros briguentos (ele mesmo, não é diferente), que não ajudam, o da Educação está balançando, ele tem muita afinidade com o presidente, mas não dá para afrontar a meteorologia. Mas não se trata do que o presidente realmente é, ou genuinamenteacreditaegosta,masdoquepraticadiante de condições meteorológicas complexas. O presidente precisa ser de todos os brasileiros e se for assim a economia vai responder.
Fonte: “O Globo”, 23/2/2020