Por Marcos de Barros Lisboa e Zeina Abdel Latif
A economia tem dominado a campanha eleitoral. Pouca atenção tem sido dada a temas que mobilizam a sociedade, como a insatisfação com os serviços públicos, manifestada nos protestos do ano passado, e os desafios para o seu aperfeiçoamento. Pouco se discutem as reformas necessárias para retomar a trajetória de crescimento sustentável com redução da desigualdade social.
A campanha tampouco empolga os economistas. A contraposição proposta entre inflação e crescimento sustentável, por exemplo, pertence à retórica oportunista da política, não ao debate informado.
Por que então esse retrocesso? Em parte, a campanha reflete a gravidade do quadro econômico. Velhos temas, ausentes nas últimas eleições, como inflação, estagnação e descontrole das contas públicas, que pareciam superados, voltaram a nos assombrar.
Não se deve desprezar a dificuldade em enfrentar os dilemas que a deterioração da economia impõe para os próximos anos. A escolha por negar as restrições do orçamento e seguidas promessas inexequíveis, compromete ainda mais os próximos anos.
Pior, a campanha apela para a agenda negativa e falaciosa. O tratamento dado à autonomia do Banco Central chega ser desrespeitoso com o eleitor ao contradizer a prática da última década e meia. O espantalho inventado, um poder independente, fragiliza a condução da política monetária, impondo custos desnecessários ao controle da inflação em caso de reeleição.
Outro equívoco é recorrer a um suposto conflito distributivo. A deterioração do ambiente institucional prejudica a sociedade e a distribuição de renda se beneficiaria da melhor qualidade da política pública. Educação, saúde e logística afetam a qualidade de vida das pessoas, a produtividade e o ambiente de negócios.
Desqualifica-se a divergência de ideias, atribuindo-as a interesses contrariados. O debate, entretanto, não é sobre a prioridade (crescimento com maior justiça social), mas sim sobre a eficácia da política econômica adotada a partir de 2009, que resultou na estagnação, comprometendo a agenda social iniciada há duas décadas.
Como retomar a trajetória de crescimento e evitar retrocessos nas conquistas sociais? Como atender os desafios para os próximos anos, como o envelhecimento da população?
O debate relevante sobre os objetivos da política pública encontra-se prejudicado pelo retorno de dificuldades que se acreditavam superadas. A proeminência da economia reflete o retrocesso dos últimos anos.
A retórica importa, e os governos eleitos são reféns das promessas de campanha. Propostas que não cabem no orçamento resultarão em frustração e, possivelmente, agravarão ainda mais as dificuldades econômicas e sociais. Por outro lado, a clareza com os dilemas e restrições existentes garantiria legitimidade para o enfrentamento dos graves desafios os quais, o quanto antes enfrentados, mais rápida a retomada do crescimento da renda. Infelizmente, a escolha tem sido pela retórica fácil, ao invés do debate sobre os desafios difíceis.
Fonte: Folha de S.Paulo, 28/09/2014.
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