Desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio com apenas sete meses de magistratura, Marianna Fux, empossada em abril passado no cargo, já em maio recebia vencimentos que “estouravam” o teto do salário bruto de R$ 33.670. Depois de estrear na carreira recebendo R$ 18 mil (porque tomou posse do cargo no meio do mês), ganhou R$ 39 mil no mês seguinte e, entre junho e agosto, último dado disponível para 2016, ela recebeu R$ 46.830,15 mensais. Somadas ao salário base de R$ 30.471,11, ela ganha mais R$ 6.202 a título de “indenizações” e R$ 10.157,04 por “vantagens eventuais”.
O caso de Marianna, de 35 anos, filha do ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux, nomeada para o cargo depois de uma polêmica votação do quinto constitucional da seção local da Ordem dos Advogados do Brasil, é apontado no mundo jurídico como um símbolo das distorções salariais que cercam a magistratura. Está longe, porém, de ser o único no Judiciário fluminense. Em agosto, dos 861 juízes e desembargadores do Rio, apenas uma juíza teve contracheque bruto com cifras abaixo do teto constitucional (R$ 33.670); todos os outros o ultrapassaram.
“Esse tema é polêmico. Prefiro não comentar. Meu perfil é diferente do perfil do meu pai. Não vou querer ser indelicada com a senhora. Vou pedir que a senhora tenha compreensão”, disse Marianna ao “Estado”, quando foi abordada e informada do assunto, na última sexta-feira. Ela foi procurada durante seminário sobre o novo Código Civil, do qual era coordenadora científica.
Inchaço
Os salários do Tribunal de Justiça são inflados por mecanismos previstos na Lei Orgânica da Magistratura e sobre os quais não incide o corte pelo teto constitucional. Os magistrados têm direito a auxílio-educação para eles próprios e para até três filhos de 8 a 24 anos (R$ 1.052 por filho), auxílio-moradia (R$ 4.377), auxílio-creche (R$ 1.052), de 3 a 5 salários mínimos por adoção, até o filho ter 24 anos.
O auxílio-educação começou a ser pago a partir de 2015. Na ocasião de sua aprovação, foi criticado por integrantes do Judiciário, como o desembargador Siro Darlan. “A população não tem nenhuma obrigação de custear a educação dos filhos dos magistrados e dos servidores do Tribunal de Justiça”, escreveu, na época.
Mas, na ocasião, o presidente do TJ-RJ, desembargador Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho, comemorou a aprovação do projeto de lei como forma de valorizar o trabalho dos juízes e servidores. “A perda de poder aquisitivo não conhece rubrica, vitimando a todos indistintamente”, afirmou.
O juiz André Tredinnick, representante no Rio da Associação Juízes para a Democracia, diz que a entidade tem visão crítica contra os chamados “penduricalhos”. “O entendimento é que prestamos um serviço público e não que somos uma aristocracia do serviço público”, afirmou. “A gente defende o adicional por tempo de serviço, que a gente luta para inserir novamente na Constituição, que seria uma forma de remunerar pelo tempo de trabalhos prestados ao Judiciário. De resto, os direitos têm de ser igual aos demais trabalhadores.”
Já a juíza Renata Gil, presidente da Associação de Magistrados do Estado do Rio, saiu em defesa dos auxílios. “Os benefícios são rigorosamente legais e existem em outros poderes e na iniciativa privada”, afirmou.
Para o presidente da OAB-RJ, Felipe Santa Cruz, o Judiciário fluminense enfrenta crise de legitimidade provocada pelos salários inflados e pelas medidas tomadas durante a crise financeira do estado. “Num estado em uma crise aguda, como explicar para a população que um enfermeiro não recebe em dia, o aposentado não recebe, mas os juízes, com supersalários, recebem na frente?”, disse.
Em nota, o TJRJ informou que “os benefícios pagos a magistrados e servidores da Justiça decorrem de legislação específica e são custeadas por recursos próprios do Poder Judiciário, o seu Fundo Especial, observando seu equilíbrio fiscal e orçamentário. Os auxílios são eventuais, condicionados a regras, à situação específica de cada magistrado e não integram os salários.”
Fonte: “O Estado de S. Paulo”.
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