Sempre é bom escutar o que dizem do Brasil no exterior. O que pensam sobre nosotros. Às vezes, são apenas obviedades, em outras, críticas construtivas, contundentes, que até merecem nossa reflexão.
Na semana passada, dois representantes internacionais emitiram várias destas considerações sobre o Brasil. Um foi William Rhodes, nos anos 80 representante dos bancos credores junto ao governo Sarney; outro, o diretor geral da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), Angel Gurría, em rodada de visitas ao país. Todos acertaram na veia nas suas considerações sobre a situação do país e que rumo tomar.
William foi cirúrgico ao afirmar que o Brasil perdeu grande oportunidade de avançar nas reformas estruturais, quando a economia registrava crescimento expressivo, lá pelos idos de meados da década passada, ainda sob a batuta do presidente Lula, “surfando na boa onda” da abundante liquidez mundial e da alta das commodities, pelo forte crescimento da China. Para ele, agora não adianta mais, visto que vivemos uma “tempestade perfeita”, a biruta virando em sentido contrário, devido aos escândalos de corrupção e à desaceleração da China. Incrível como, tanto Lula como Dilma, pecaram por não enxergarem esta necessidade de ajustes mais fortes, impopulares, mas imprescindíveis. Optaram, em linguagem figurada, por manterem o telhado avariado, na confiança de que o tempo ensolarado seria permanente, nunca havendo as tais tempestades acima citadas. Deu no que deu…
[su_quote]Uma agenda de reformas estruturais essenciais precisa ser colocada na mesa[/su_quote]
Sobre isto, bem disse Angel Gurría, da OCDE, ao afirmar que ajustes pesados (ou impopulares) deveriam ser os primeiros a serem adotados, enquanto existisse espaço político para tal. Para ele, “a popularidade não seria um bom termômetro para sabermos se as medidas são necessárias ou não. O pior seria não adotá-las e depois sofrer com as cobranças do porque não ter feito”. Ainda segundo Gurría, “é preciso haver uma visão de médio e longo prazo e manter o curso” (tudo o que não é feito neste momento). Ele, inclusive, disse confiar que o país tem condições de realizar os ajustes necessários, desde que adotados com urgência, sob o risco de “rumarmos para uma colisão fiscal”.
Para isto, uma agenda de reformas estruturais essenciais precisa ser colocada na mesa, a começar pela da Previdência. Não é razoável haver neste regime o velho conceito de “tempo de contribuição” para se aposentar, nem a vinculação do salário mínimo aos aposentados, no Brasil, sendo 70% os que recebem este piso. Nos últimos dez anos, aliás, o salário mínimo registrou um ganho real de 80%! Ou seja, Gurría sabe (e todos nós também sabemos), que a situação da dívida da Previdência tende a ser explosiva no longo prazo. Já falamos sobre isto neste espaço. A dívida, neste ano em torno de R$ 90 bilhões, deve passar de R$ 120 bilhões em 2016 e de R$ 200 bilhões nos próximos cinco anos.
Mesmo com ressalvas, neste contexto de impasse político e paralisia nas decisões, por estes dias o PMDB (logo quem!) veio com uma realista agenda de longo prazo para o país, “Uma ponte para o futuro”, elaborada por um time de brilhantes formuladores (Marcos Lisboa, Paulo Rabelo de Castro, José Marcio Camargo, Fabio Giambiagi, entre outros). Sobre os principais pontos abordados, destaquemos alguns:
1.Fim das vinculações e das indexações, que só engessam o Orçamento. Falou-se, em especial, do fim de duas, do reajuste do salário mínimo baseado no PIB e na inflação e da vinculação do salário mínimo ao piso da maioria dos aposentados. Defendeu-se também um “repensar” sobre a vinculação de gastos na Saúde e Educação. Isto, na prática, só estimula a má alocação de recursos, a baixa qualidade de gastos e pouco resolveu a situação das duas pastas;
2.Retorno do regime de concessão na exploração do petróleo do Pré-sal. Dilma foi uma das criadoras do regime de partilha e da obrigatoriedade de conteúdo nacional na indústria de petróleo nacional. Na nossa visão, e desta agenda, estas são as principais causas para a crise que vive hoje a Petrobras. Proposta desta agenda é abrir a Petrobras para a concorrência externa, obrigando-a a ser mais competitiva;
3.Inserção plena do Brasil no comércio internacional. Outra aberração do ciclo petista: tentar ideologizar as relações comerciais do país com o resto do mundo, teimando na tola confrontação entre Norte x Sul. Defende-se agora a aceleração dos acordos regionais, esvaziando os multilaterais, no atual contexto, decisões mais políticas do que pragmáticas. Lembremos do recente Acordo Transpacífico, firmado entre Chile, Peru, Colômbia e diversos países da Ásia e da América do Norte. Estimam-se a eliminação de 18 mil impostos para estimular o comércio entre estes países;
4.Agências de regulação independentes e menos contaminadas politicamente. Dilma e Lula sempre acharam que estas agências deveriam ser instrumentos de políticas públicas, não podendo haver autonomia. Como resultado, todas viraram objetos de barganha política, com suas várias diretorias ocupadas por quadros pouco qualificados;
5.Redução da relação dívida/PIB e cumprimento da meta de inflação. Nada que o governo Dilma fez no seu primeiro mandato. O IPCA, hoje, está próximo a 10%, distante do centro de meta, de 4,5%, e a dívida bruta rumando para 70% do PIB, colocando o país, portanto, nas portas de perder mais um grau de investimento.
Na verdade, todos estes pontos acima citados, elaborados sob encomenda pelo PMDB, serviriam muito mais como um contraponto ao governo da presidente Dilma. O velho partido de sustentação nos vários governos de coalizão (ou de cooptação) no passado recente já vislumbra ser poder, caso saia o impeachment da presidente e a posse do vice, Michel Temer. Esta é a leitura do momento. Assumindo Temer e colocando esta agenda em pauta, caso bem-sucedida, teríamos o fortalecimento de uma candidatura PMDB para 2018. Poderia ser até o próprio Temer, enfraquecendo outras alternativas, como Eduardo Paes do partido, ou mesmo o retorno do ex-presidente Lula ou do principal partido opositor, PSDB. Não nos alongando nestas conjecturas políticas, não resta dúvida que os pontos colocados neste documento expressam o amadurecimento e a opinião lúcida de todos que defendem, realmente, um “freio de arrumação” na economia brasileira.
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