Apenas 51,92% da população brasileira possui acesso à coleta de esgoto, isso quer dizer que mais de 100 milhões de pessoas sequer contam com este serviço no país. Os dados são do último estudo divulgado pelo Instituto Trata Brasil (ITB). Ainda segundo o levantamento, somente 44,92% dos esgotos são tratados, o restante desta conta é despejado diretamente na natureza, quantidade suficiente para encher seis mil piscinas olímpicas por dia. A água tratada chega a pouco mais de 83% dos lares, deixando 35 milhões de moradores sem este recurso essencial. O saneamento básico é um dos direitos fundamentais, o mínimo para se obter saúde, produtividade e qualidade de vida.
Nesta matéria especial do Instituto Millenium, o coordenador de comunicação do Instituto Trata Brasil, Rubens Filho, e Rogério de Paula Tavares, vice-presidente de relações internacionais da Aegea Saneamento, empresa que atua no setor, analisam o atual cenário do país e apontam como parcerias público-privadas, as PPPs, podem ajudar a mudar a triste realidade enfrentada pelos brasileiros.
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“O saneamento básico é um dos fatores determinantes para a economia de um país e, infelizmente, o Brasil ainda tem indicadores dos séculos 18 e 19 na área. No ITB, expomos esses dados de maneira simples para que o cidadão, o governo e a imprensa tenham ideia do quão grave é o problema. Nosso objetivo é dialogar com a sociedade e mostrar que ela deve participar para resolvê-lo”, comenta Rubens. Segundo ele, a saúde, o turismo e o meio ambiente são os setores mais afetados pela falta de saneamento, que acaba afastando redes hoteleiras, turistas e prejudicando até mesmo a renda salarial dos moradores locais. Na opinião do coordenador, o governo deve olhar com mais atenção para a grande parcela da população carente do bem-estar oferecido por esse serviço essencial:
“A coletividade que o saneamento traz é um instrumento importante de cidadania, pois aproxima as pessoas de uma boa qualidade de vida. Nossa realidade transforma o Brasil em um país pobre e preocupante em termos de indicadores. Não adianta gerarmos riqueza, termos um PIB consideravelmente alto enquanto brasileiros ainda vivem precariamente em seus bairros. Saneamento básico é saúde e prevenção”.
Ouça abaixo a entrevista completa com Rubens Filho
Criada em 2010, a Aegea é uma das maiores empresas do segmento privado de saneamento básico do Brasil. Atualmente, a corporação atua em 48 cidades e está em fase de implementação e negociação com outros municípios, totalizando 7 milhões de pessoas atendidas. Segundo Rogério de Paula, os operadores privados são responsáveis por apenas 9% do setor no país. O restante fica a cargo de companhias estaduais e municipais.
Rogério explica que há diferentes modelos na prestação destes serviços. As empresas podem ter concessões plenas, onde operam a água e o esgoto da cidade. Existem ainda as concessões parciais, englobando o modelo das parcerias público-privadas.
Ouça abaixo a entrevista completa com Rogério de Paula
“Se você pensar que a solução para este problema virá de uma pressão em cima dos operadores públicos, sinto dizer: hoje em dia, eles não vão poder resolver. Se no passado os mesmos poderiam ter feito algo, em situações onde a economia estava melhor e esse prestadores tinham uma situação econômico-financeira mais estável, atualmente eles não têm condições, até pela crise enfrentada pelo país nos últimos anos, já que 83% dos municípios estão com suas contas em situação crítica ou quase crítica e os estados não ficam muito atrás. O governo federal também não consegue tirar dinheiro de seu orçamento, porque não existe esta verba. Daí para frente, teremos outro tipo de solução, onde novos atores terão de participar. Aí entra a iniciativa privada”, alerta, destacando que a população deveria cobrar mais este direito fundamental. “Se o assunto fosse pauta da sociedade brasileira, o cenário seria outro. Para as pessoas, se não há esgoto vazando na porta de casa, o problema está resolvido, mas isso não quer dizer que o seu tratamento e destinação final estejam sendo adequados”.
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Rogério destaca os muitos benefícios conquistados pelas cidades que passam a contar com parcerias público-privadas para resolver a questão do saneamento, desde possibilidade de mais verba para o governo continuar investindo no segmento e em outras áreas, até a diminuição do índice de doenças, a geração de emprego e renda, valorização imobiliária e até a recuperação de áreas naturais degradadas. Mesmo diante desta realidade, ele acrescenta que, até pouco tempo, não havia nenhum incentivo à participação privada no setor. No entanto, esta resistência vem mudando recentemente no sentindo de criar instrumentos para incentivar que os municípios e companhias estaduais deleguem parte deste serviço, através de concorrências limpas e responsáveis.
“Infelizmente, há uma visão muito distorcida de boa parte da sociedade de que, entrando um agente privado, ele irá querer ter lucro e a população mais pobre será prejudicada. Isso é uma inverdade pois, hoje, esses moradores já não contam com o serviço, porque o déficit está concentrado principalmente nas localidades mais carentes e distantes. O problema já existe, ele não será criado pela inserção privada. Muito pelo contrário, ela pode ajudar a melhorá-lo”