O Senado deu mais um passo em direção à aprovação do novo marco regulatório do saneamento, que promete abrir o setor para as empresas privadas. O senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) apresentou nesta sexta-feira seu parecer sobre o projeto, mantendo o texto aprovado na Câmara. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), marcou para a próxima quarta-feira a votação da proposta.
Apesar dos protestos da oposição, Alcolumbre deixou claro que não pretende mudar a data da sessão remota que vai apreciar o projeto. Para garantir que o projeto seja sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro rapidamente, Tasso não alterou o texto aprovado pelos deputados.
Qualquer alteração feita no Senado forçará uma segunda apreciação do texto na Câmara.
O projeto tem 23 artigos e seu foco é facilitar uma atuação mais forte da iniciativa privada na oferta água e coleta de esgoto. Uma das principais mudanças é que os serviços de saneamento só poderão ser concedidos via licitação. Porém, será permitida a prorrogação, por até 30 anos, dos contratos em vigência.
Atualmente, cerca de 94% das cidades brasileiras são atendidas por estatais de saneamento. Apenas 6% do serviço são operados por companhias privadas.
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Universalização
As empresas terão de cumprir metas de universalização, a serem atingidas até 2033. O prazo pode ser acrescido em mais sete anos, caso se comprove inviabilidade técnica ou financeira. A expectativa é que, até o fim do período estabelecido, 99% da população tenham acesso a água potável e 90%, a coleta e tratamento de esgoto, conforme determinação do Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab), de 2013.
Segundo Tasso Jereissati, serão necessários entre R$ 500 bilhões e R$ 700 bilhões para universalizar a prestação de serviços de saneamento no Brasil até 2033. Ele enfatizou que o efeito multiplicador desses investimentos é considerável: para cada R$ 1 investido, são gerados outros R$ 2,50 nas cadeias associadas.
“Os impactos no mercado de trabalho são também substanciais. Estima-se que a cada R$ 1 bilhão investido sejam gerados 60 mil postos de trabalho, o que é algo de extrema importância quando se tem uma situação de alto desemprego”, destacou o relator em seu parecer.
O texto também estabelece prioridade no recebimento de auxílio federal para os municípios que efetuarem concessão ou privatização dos serviços. Além disso, para que as cidades menores, mais isoladas ou mais pobres tenham acesso aos serviços, será permitida a contratação em bloco.
Tasso defendeu a regionalização dos serviços, para a obtenção de ganhos de escala. Afirmou que a presença de municípios mais e menos atraentes, e não necessariamente contíguos em um mesmo território de prestação, afasta o risco de que qualquer deles, por mais pobre e pequeno que seja, fique fora do processo de universalização.
“Não há obrigação de que o município participe de estruturas de prestação regionalizadas. Isso é facultativo. Municípios não participantes de regiões metropolitanas, unidades regionais ou blocos retêm sua titularidade, mas não terão prioridade no recebimento de investimento da União”, enfatizou Jereissati no texto.
Os senadores da oposição argumentam que o tema não é urgente, pois não está relacionado com a pandemia de Covid-19. Entre os que mais reclamam da pressa na votação — que tem a benção do ministro da Economia, Paulo Guedes — estão Otto Alencar (PSB-BA), Veneziano Vital do Rêgo (PSB-PB), Rogério Carvalho (PT-SE) e Jaques Wagner (PT-BA). Os parlamentares querem que a matéria seja votada somente após o retorno das atividades presenciais em plenário.
— O momento é muito grave. O Brasil chegou a um milhão de casos de coronavírus. Precisamos buscar soluções para enfrentar em definitivo a pandemia. Não podemos nos desviar da grave situação — disse Wagner.
O líder do MDB no Senado, Eduardo Braga, apresentou nesta sexta uma emenda para evitar a privatização das estatais neste ano. Segundo ele, a venda e a transferência de controle acionário não podem ocorrer no período de calamidade pública, que vai até dezembro.
— Minha emenda é em defesa do patrimônio público — disse o senador, acrescentando que a emenda não alterará a essência do projeto.
Mercado atraente
Para aqueles que temem a rápida privatização das companhias de água e esgoto, Jereissati lembrou que os contratos de prestação de serviço de saneamento são de longo prazo: 30 anos. O senador ressaltou que o mercado brasileiro é bastante atraente, com 104 milhões de pessoas sem coleta e tratamento de esgoto adequados e 35 milhões sem acesso a água potável. Acrescentou que o país só tem a ganhar com a nova lei.
— Enquanto órgãos de saúde pública de referência no plano internacional e no Brasil recomendam que se lavem as mãos com frequência para evitar a contaminação com o coronavírus, temos 35 milhões de brasileiros sem acesso a água tratada. Um grande e potencialmente letal paradoxo. O Brasil, em pleno século XXI, não pode aceitar ter condições de saneamento equivalentes àquelas que alguns países europeus já tinham no início do século XX — disse o senador.
Giovanino Di Niro, gerente executivo de digitalização e saneamento da Siemens, defendeu a votação do novo marco regulatório, para que se possa avançar em soluções para o setor. Ele lembrou que o país tem, hoje, alto índice de desperdício de água potável, enquanto milhões de pessoas vivem em situações precárias.
Disse, ainda, que o projeto tem potencial de atrair investimentos para a infraestrutura brasileira.
— E esse impacto ocorrerá não só nas grandes cidades, como nos pequenos municípios. Contamos com o apoio do Congresso, sabendo quão importante essa aprovação será para o crescimento do Brasil nos próximos anos — afirmou.
Veja os principais pontos do projeto
Licitação
O projeto prevê que os serviços de saneamento básico só poderão ser concedidos via licitação. Atualmente, cerca de 94% das cidades brasileiras são atendidas por estatais que fecham contratos diretos com estados e municípios. Apenas 6% dos serviços são operados por empresas privadas.
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Prorrogação
Contratos já existentes poderão ser prorrogados pelos atuais operadoras até 31 de dezembro de 2022, de acordo com a proposta. Para isso, as empresas terão que se comprometer e demonstrar capacidade financeira de cumprir metas de coleta e tratamento de esgoto.
Universalização
Há uma meta de universalização dos serviços até 2033, com investimentos de R$ 50 bilhões por ano. O objetivo é atender 99% da população. Atualmente, cerca da metade dos brasileiros não tem serviço de coleta de esgoto. Outros 35 milhões não têm acesso a água tratada.
Contratação em bloco
Para que cidades mais pobres ou isoladas também tenham acesso aos serviços, será permitida a contratação em bloco. A prestação de serviços poderá ser exercida em conjunto por estados e municípios. A proposta estimula a formação de blocos regionais de prestação de serviço.
Atribuições da agência
A Agência Nacional de Águas (ANA) ganha novas atribuições, sendo a responsável pelas normas de referência em saneamento em âmbito nacional. A ANA buscará uma harmonização de regras de qualidade, atendimento e tarifas com as agências estaduais e municipais.
Licenciamento
O licenciamento ambiental de empreendimentos da área de saneamento será uma prerrogativa das prefeituras. Caso não haja um órgão municipal que possa se responsabilizar pelo processo de obtenção e concessão de licenças, o trabalho será repassado para o órgão estadual.
Fonte: “O Globo”