Com Charles Darwin, em sua revolucionária obra “A origem das espécies” (1859), a maldição malthusiana sobre a condição humana ergueu-se como gigantesca sombra sobre todas as formas de vida na Terra: “Como são produzidos mais indivíduos do que possam possivelmente sobreviver, decorre uma luta pela existência de um indivíduo com os outros da mesma espécie, com outros de outras espécies e contra as condições físicas do ambiente. É a doutrina de Malthus aplicada com intensidade a todas as dimensões dos reinos animal e vegetal.”
Quem somos como indivíduos da mesma espécie? Somos as criaturas egoístas de David Hume e Richard Dawkins, somos os hobbesianos lobos dos próprios homens? Ou somos naturalmente altruístas e generosas criaturas de Rousseau, bons selvagens corrompidos pela civilização? Somos ambos, dizem modernos biólogos evolucionistas, genética e culturalmente.
“Em um nível mais baixo, membros de um mesmo grupo humano competem entre si, o que explica o comportamento egoístico. Mas, em nível mais alto, grupos humanos competem contra outros grupos, e a seleção natural favorece a cooperação entre membros do mesmo grupo. Somos portanto uma quimera genética. Ao mesmo tempo, santos e pecadores”, registra Edward Wilson, em “A conquista social da Terra” (2012). “Os seres humanos são colaboradores condicionais e justiceiros altruístas. Têm a predisposição à cooperação com os outros mas também à punição daqueles que violam as normas de cooperação”, adverte Eric Beinhocker, em “A origem da riqueza” (2006).
“Para grupos humanos enfrentando o desafio de adaptação a novos ambientes, sempre competindo com outros grupos, a cooperação e a solidariedade entre os membros do mesmo grupo foram o fator decisivo”, afirma Wilson.
Mesmo nossos sentimentos e emoções foram moldados pelo processo de seleção natural, de modo a estimular a cooperação. “Desprezo, raiva e desgosto são emoções para condenar e punir os que não cooperam. Gratidão e admiração, emoções para recompensar altruístas. Empatia e compaixão, emoções para estimular ajuda e solidariedade. Vergonha e culpa, emoções para evitar a dissimulação e a trapaça”, registra Steven Pinker, em “Tábula rasa” (2002).
Do tribalismo à Grande Sociedade Aberta, a cooperação revelou-se atributo fundamental da espécie humana. Tiveram seu tempo histórico religiões e ideologias. O caminho agora está no aperfeiçoamento de nossas instituições.
Fonte: O Globo, 02/07/2012
Através da evolução cultural o Homem deixa traços do que ele cria. Mas nem todos os humanos são dotados desta capacidade criativa. Muito se deve à mudança de vegetariano a carnívoro, que propiciou o encurtamento do tempo gasto com alimentação. Isto concedeu ao Homem um tempo maior para se preocupar com outras coisas. O tempo livre deu-lhe chance para procurar recursos mais eficientes para se alimentar. Evidentemente isto ajudou a promover a tendência de todos os primatas a dilatar em sua mente a compreensão de estímulo e resposta e a seguir, a gratificação do desejo. Mas o mais marcante na influencia indireta causada por este entendimento foi nutrir a comunicação. Pois o Homem adaptado às savanas e destinado a uma vida primitiva, através do aprendizado da comunicação entende que se liberta do seu destino primitivo por meio da cooperação.