* Por Eduarda Schlossmacher
No mês de novembro, as autoridades do governo de Cuba anunciaram que 8 mil profissionais que atuam no Brasil, através do programa “Mais Médicos”, deixarão o país até o final do ano. O comunicado veio após o presidente eleito, Jair Bolsonaro, questionar e condicionar a presença dos profissionais no Brasil. É estimado que a saída dos médicos cubanos acabe afetando cerca de 28 milhões de pessoas.
Entre os 1575 municípios que possuem somente médicos cubanos do programa, 80% possuem menos de 20 mil habitantes. Dessa forma, a saída desses médicos sem a garantia de outros profissionais pode gerar desassistência básica de saúde a mais de 28 milhões de pessoas, segundo a Confederação Nacional dos Municípios (CNM).
O ocorrido evidencia, mais uma vez, a fragilidade do setor de saúde no Brasil e levanta várias questões. Entre elas pode-se citar: devemos depender apenas do estado para cuidar de nossa saúde? O Estado deve alocar recursos em outras áreas que podem, indiretamente, afetar a saúde dos indivíduos? Ou o investimento deve ser restrito a infraestrutura de hospitais e postos de saúde, além da capacitação de profissionais?
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De fato, não se deve questionar que boa infraestrutura e bons profissionais são essenciais para um bom atendimento e para obtenção de bons resultados na saúde, mas é importante notar que nem sempre gastos mais elevados nesse setor significam melhores cuidados de saúde. Mas por que isso ocorre?
O nível de saúde das pessoas depende até certo ponto, de escolhas realizadas por elas próprias. Rendimento, escolaridade, local de moradia (área urbana/rural), urbanização, higiene, prática de exercício físicos, e saneamento básico, são variáveis que podem influenciar a saúde, por exemplo.
Diante disso, diversos estudos na área de economia da saúde, tentam quantificar e analisar como essas variáveis influenciam na saúde individual. Para a população do estado de Santa Catarina, por exemplo, apenas o fato de a pessoa possuir computador em seu domicílio aumenta a probabilidade de o indivíduo ser saudável em 9,27%. Já fumar, diminui essa probabilidade em 6,31%. Ainda, possuir sistema de esgoto ou coleta de lixo, aumentam as probabilidades de boa saúde em 3,64% e 12,9%, respectivamente. Um ano a mais de escolaridade, também eleva a chance de o indivíduo ser saudável em 19,4%.
Os estudos na área da economia da saúde, deixam claro que nossa saúde é formada por dois componentes: o componente da escolha individual e componente público. Quanto mais cuidarmos da saúde individual, menores serão as chances de dependermos da saúde pública. Analogamente, os gastos com saúde em infraestrutura de postos de saúde e de hospitais podem nem sempre serem os mais eficientes. Investir em outros setores, como saneamento básico, educação e em prevenção através das mídias podem, indiretamente, beneficiar e trazer mais qualidade de vida na saúde da população.
Apesar de ser extremamente importante resolver as questões estruturais do setor de saúde, o Estado também deve se preocupar com investimentos em prevenção e em outros setores que afetam a saúde de maneira indireta. Indivíduos mais saudáveis necessitam menos de serviços de saúde, e os custos de prevenir são bem menores que os de tratar.
Além disso, já que possuímos liberdade de escolha, que tal escolhermos atitudes mais saudáveis para o nosso dia-a-dia? Se ficarmos esperando apenas pela ação do Estado, iremos ter que criar um programa que ao invés de trazer médicos para o Brasil, exporta pacientes para o exterior.
* Eduarda Schlossmacher é graduada em Ciências Econômicas pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Trabalha como economista em uma empresa de consultoria de investimentos para RPPS.
Fonte: “Terraço Econômico”, 25/11/2018