Os programas sociais brasileiros falharam em ter uma porta de saída para a superação da pobreza. Em live no início da tarde desta quarta-feira (09), veiculada pelo Instituto Millenium e mediada pela diretora executiva da institutição, Marina Helena, os economistas Marcos Lisboa, Vinícius Botelho e Marcos Mendes foram unânimes em afirmar que houve um avanço no socorro imediato aos mais pobres, mas ainda temos um longo caminho a percorrer para melhorar definitivamente a vida dos brasileiros que mais precisam.
Se referindo ao Bolsa Família, programa que elogiou no primeiro aspecto, Vinícius Botelho ponderou: “Os resultados foram limitados na superação definitiva da pobreza. (…) Para a superação de pobreza, o país precisa crescer também. Existe uma parcela grande das pessoas que estão em situação de vulnerabilidade, que se a economia melhorar e se elas tiverem condições de aproveitar… Se o país não crescer, é complicado tirar todas as pessoas da pobreza”.
Do outro lado da bancada, Marcos Lisboa emendou: “Bolsa Família era também para transformar as famílias. Cuidar da geração mais velha e garantir que seus filhos vão pra escola, pra não precisarem de programa social também. Há inúmeras evidências que relacionam aumento de escolaridade com aumento de produtividade e aumento de salários no mundo inteiro, mas só no Brasil não funciona. Aumentou a escolaridade, mas não o aprendizado, o salário, a produtividade. O velho populismo brasileiro: aprovei mais dinheiro pra educação, vou pra casa e a educação não melhora. Política pública dá trabalho, e a gente descuida dos detalhes”, criticou.
Ele lembrou que, apesar de sermos citados como uma das maiores economias do mundo, isso tem a ver muito mais com tamanho da população que com a riqueza propriamente dita. “O Brasil não é um país rico, ele só tem muita gente e, num ranking absoluto, ele fica no alto. Mas quando olhamos a renda por habitante, o Brasil é um país pobre, medíocre”.
Seguindo a mesma linha, Marcos Mendes completou: “Não estamos num país rico com alguns pobres que a gente tem que tirar da pobreza. Temos que elevar um país todo. Nos últimos 40 anos, a renda per capita do Brasil cresceu abaixo de 1% ao ano. (…) Nós construímos no Brasil uma economia disfuncional, que trava o crescimento. Criamos um Estado que não para de crescer. Para financiar isso, teve que aumentar brutalmente a carga tributária (…), que desestimula o investimento, a produtividade, e a economia vai travando”. Ele concorda com Lisboa que uma política pública precisa ser muito bem pensada. “Não é só pegar um caminhão de dinheiro”, critica.
Botelho e Mendes escreveram o mais recente paper do Instituto Millenium, “Como avançar a agenda da proteção social no Brasil?”, lançado hoje no site do instituto. A anfitriã do evento, a diretora executiva Marina Helena Santos, resumiu: “Não há outra forma de gerar riqueza se não for pelo crescimento. E a gente acabou de perder 40 anos nesse sentido”, referindo-se ao dado apresentado por Mendes.
Auxílio Brasil
Os debatedores, no entanto, são unânimes em afirmar que o Auxílio Brasil, programa recém criado pelo governo, não corrige as falhas do Bolsa Família. Ao contrário, acaba por criar outras distorções, como por exemplo, não diferenciar mais as famílias com crianças de rapazes solteiros, na hora de conceder os benefícios, ou não aproveitar o banco de dados do Cadastro Único para entender melhor quem são essas famílias. Mendes ainda criticou o fato de ter o orçamento do programa triplicado, sem que os potenciais resultados justifiquem o gasto. Além disso, não há uma transição gradual para a perda do recurso. “Duas famílias iguais, uma que está 1 real abaixo da linha da pobreza, e uma que está 1 real acima… a que está 1 real abaixo, recebe R$ 400, e a que está 1 real acima, não recebe nada”, explicou Mendes.
Já Botelho, criticou que o novo desenho é muito focado em quem já tem um emprego formal, e com isso alguma proteção social, esquecendo-se do trabalhador informal, que perde toda a sua renda caso fique doente, por exemplo. Em seu paper publicado hoje, que também teve a participação do pesquisador Fernando Veloso, eles sugerem um terceiro formato, chamado Programa de Responsabilidade Social, que incluiria uma Poupança Seguro Família, que seria acessada pelo trabalhador exatamente nesses momentos. O Programa sugerido por Botelho, Veloso e Mendes incluiria ainda uma outra poupança, para os estudantes acessarem assim que terminarem o ensino médio. Ao mesmo tempo em que representaria alguma renda para o jovem começar a vida, seria também um incentivo para ele completar os estudos e reduzir a evasão escolar nesta fase.