O secretário do Tesouro, Mansueto Almeida, afirmou nesta quarta-feira que o déficit fiscal neste ano pode chegar a R$ 700 bilhões e que será preciso mudar a regra de ouro porque ela não será cumprida nos próximos anos. Ele participou de uma audiência na Comissão do Congresso que acompanha os gastos do governo no enfrentamento ao coronavírus.
– Este ano, a nossa melhor expectativa é que esse rombo vai crescer para algo como mais ou menos R$ 600 bilhões, 8% do PIB, eventualmente será ainda maior, essa conta pode chegar a até R$ 700 milhões e passar de 9% do PIB. É um déficit muito grande, quando um governo gasta muito mais do que arrecada, significa que ele tem que pedir emprestado e a dívida vai crescer.
Sobre a regra de ouro – dispositivo legal que proíbe o governo de se endividar para pagar despesas correntes, como benefícios sociais e salários” – ele disse que a perda de receitas tem sido tão grande, que hoje o governo tem que pedir emprestado para pagar despesas correntes essenciais.
– A gente vai ter que lidar de alguma forma em mudar a regra de ouro porque o Brasil não cumprirá a regra de ouro até o final desse governo e talvez no início do próximo também, disse o secretário, reforçando a tese de que a dívida pública pode chegar a 90% do Produto Interno Bruto (PIB) este ano, ante 76% em 2019.
Últimas notícias
Entenda por que o Brasil se tornou um polo para o crescimento de startups
Maia afirma que necessidade de revisitar Previdência “parece real”
Com pandemia, governo prevê queda de 4,7% no PIB em 2020
Para descumprir a regra, o governo precisa pedir uma autorização ao Congresso.
Mansueto criticou o formato da regra e disse que ela vai contra o discurso de “clareza e compromisso” com o social.
– Como secretário do Tesouro Nacional, eu seria contra parar de emitir dívida porque eu não poderia financiar despesa de custeio que são os programas sociais. Por isso que eu acho que a gente vai ter que rediscutir a regra de ouro, a gente vai ter sim que pagar os programas que nós como sociedade nos comprometemos.
Segundo o secretário, o índice de endividamento de 90% não preocupa muito se o país for capaz de crescer e “pagar” parte da dívida com crescimento. Para isso, ele defendeu que a agenda de reformas continue após a crise.
– As pessoas que vão fazer investimentos no Brasil durante 20, 30, 40 anos, querem ter a certeza que o Brasil ao longo do tempo vai conseguir pagar sua dívida, conseguir controlar o crescimento da sua dívida em relação à economia. É por isso que precisamos crescer e por isso que as reformas são tão importantes para o país.
O economista e pesquisador do Insper, Marcos Mendes, entende que a regra de ouro é mal desenhada. Segundo ele, a regra precisa de uma reformulação porque não dá o incentivo correto para o gestor.
– Do jeito que está na Constituição e é operacionalizada, um governo gasta muito durante muito tempo sem descumprir a regra de ouro, e ela só vai estourar no colo de outro governo, um ou dois mandatos depois, porque ela depende da acumulação de sucessivos déficits e da dívida crescer muito – disse.
O economista defende que em vez do descumprimento resultar em um crime de responsabilidade, a regra poderia funcionar para medir a saúde fiscal do país.
– Ela passaria a ser um termômetro da saúde fiscal. Na hora que esse termômetro acusar que a gente está com déficit muito alto, vamos tomar uma série de medidas para controlar o crescimento da despesa corrente obrigatória.
Para o professor da FGV EBAPE, Istvan Kasznar, o momento de crise faz com que a flexibilização das regras fisicais sejam necessárias.
+ Alexandre Schwartsman: E daí?
– Eu diria que em condições de não excepcionalidade, de estabilidade macrodinâmica, teríamos que manter essa regra, estaríamos dando perspectivas mais estáveis aos agentes econômicos. Todavia, na circunstância excepcional de alta incerteza, com alta insegurança, com desemando político institucional, faz sentido fazer uma revisão.
Auxílio emergencial
Questionado sobre a extensão das medidas do governo para mitigar os efeitos da pandemia, o secretário disse que é necessário esperar para ver como será o desenrolar da crise.
As medidas são pensadas para um período de três meses. Se os efeitos passarem desse tempo, Mansueto disse que o governo precisará conversar com o Congresso para verificar “o que é possível fazer”.
– 90% do público do Bolsa Família saiu e foi pro auxilio emergencial. Talvez o correto, se a gente tiver que renovar algum programa, seria pensar em melhorias para o Bolsa Família. Vamos ter que sentar com o Congresso em julho para ver o que fazer.
Fonte: “O Globo”