Se o assunto é o sistema tributário brasileiro, duas verdades são incontestáveis. A primeira é que a Receita Federal é uma das mais eficientes máquinas de arrecadação do mundo. A arrecadação este ano deve superar marca de 36% do PIB, marca que se explica por uma série de fatores.
Entre eles, conforme o Ministro da Fazenda Guido Mantega disse ao “Brasil Econômico”, pode ser incluído o Simples – que atraiu para o mundo formal centenas de milhares de micro e pequenas empresas que, antes, não recolhiam impostos.
Outra explicação é aquilo que podemos chamar de “inteligência fiscal”. O Fisco é, hoje, muito mais eficiente e eficaz do que era alguns anos atrás. A segunda verdade é que o sistema é confuso e suas distorções minam a competitividade das empresas.
Mantega, nesse caso, entende que o problema está nos impostos estaduais. Por se tratar de uma federação, o Brasil concede a cada unidade um conjunto de liberdades na matéria – e na utilização indevida de algumas delas por parte de alguns estados reside o principal foco de tensão tributária. Faz sentido.
Existe, no entanto, um terceiro ponto que está se tornando tão incontestável quanto os dois anteriores: volta e meia, surgem medidas que parecem destinadas apenas a somar novas dificuldades às que já existiam. É algo que, ao contrário da inteligência há pouco mencionada, pode ser chamado de “estupidez fiscal.”
Uma dessas medidas entrará em vigor no próximo dia 1º de novembro e obriga que todas a garrafas de vinho nacional ou importado comercializadas no Brasil tragam um selo de controle do Fisco. As caixas da bebida que chegarem do exterior e mesmo as que já estão armazenadas para a venda, deverão ser abertas para receber a estampilha federal. É, por assim dizer, um mecanismo de controle parecido com os utilizados pela Alfândega Régia no tempo de Dom João VI.
Diante da eficiência da máquina de arrecadação, numa era em que os meios eletrônicos detectam em tempo recorde uma série de desvios, a opção pelo selo só pode ser vista como tentativa extemporânea de proteção das vinícolas brasileiras. Que, sejamos sinceros, não se incluem entre as mais relevantes cadeias produtivas do país. E muito menos entre as mais expressivas vinícolas do mundo.
Que ninguém queira comparar a medida com a elevação do IPI para os carros importados. A elevação da alíquota, nesse caso, se impôs pela necessidade de ação diante da chegada ao país de concorrentes que se valem de mecanismos fiscais, cambiais e trabalhistas heterodoxos para baixar os preços de seus produtos. Ela pode até ser discutida – mas é parte de medidas que podem mudar de forma virtuosa a história da indústria automobilística.
O selo do vinho, não. Ele desagrada importadores, lojistas e comerciantes não por seu impacto fiscal sobre um produto já hipertributado. De cada 750 ml (o conteúdo de uma garrafa) de vinho, mais de meio litro é destinado aos impostos. E é com os duzentos e poucos mililitros restantes que toda a cadeia se remunera. Ao contrário dos automóveis, os estoques de vinhos importados antes da adoção da medida também estão sujeitos à portaria do selo. A medida desagrada porque é ruim. Só por isso.
Fonte: Brasil Econômico, 03/10/2011
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