A S&P entendeu bem a nossa situação e rebaixou o nosso grau de investimento justamente devido às dificuldades políticas que parecem não ter fim. A tendência negativa corresponde justamente ao grau de desorganização do governo e à falta de perspectiva de uma solução.
A maior demonstração de que o governo não tem um projeto realístico para sair da crise é a verdadeira algaravia em torno das soluções, sem que exista alguém para arbitrar nem um conjunto coerente de medidas que deem a sensação de que temos saída.
Durante a campanha eleitoral, a presidente Dilma recusou-se a apresentar um programa para o segundo mandato que pretendia nas urnas, pois, afirmou, não seria um novo mandato, mas a continuação do primeiro e, portanto, não haveria novidades, apenas tocar em frente os programas existentes.
Provavelmente por isso foi reeleita, pois através de uma falsa propaganda, prometia um mundo que já havia acabado há muito tempo, mas cujas conseqüências não haviam chegado ainda aos bolsos dos cidadãos.
Iniciado o segundo mandato, já sabíamos que o ambiente econômico era completamente diferente daquele apresentado pela candidata Dilma, e que medidas “amargas” teriam que ser tomadas, justamente ao contrário do que ela dizia.
Chamar um economista da escola de Chicago, conhecido pelo dom de saber cortar custos, não poderia ser a única solução mágica para uma “travessia” tão tumultuada como a que se avizinhava.
O tal programa de governo que não apareceu na campanha eleitoral teria que surgir agora, incorporando os tais “remédios amargos”, mas também, medidas estruturais que permitissem ver uma luz no fim do túnel. E as medidas estruturais seriam necessariamente muito mais profundas do que simplesmente aumentar impostos ou apresentar reformas fundamentais como a da Previdência ou trabalhista.
[su_quote]As trapalhadas que se sucedem mostram apenas que o governo perdeu a capacidade de liderar o que quer que seja[/su_quote]
O governo teria que se reinventar, enxugar sua própria estrutura, dar o exemplo, depois, claro, de ter feito um mea culpa que pudesse servir de início de um novo ciclo. Como, no entanto, pedir sacrifícios da população se todo esse estrago feito deve-se à incompetência e à irresponsabilidade do mesmo governo que pediu ao eleitor um voto de confiança para continuar governando sem revelar a real situação da nossa economia?
As trapalhadas que se sucedem mostram apenas que o governo perdeu a capacidade de liderar o que quer que seja, e busca uma solução mágica para tapar os buracos que ele mesmo cavou, e continua cavando.
A ressurreição da CPMF foi substituída pelo aumento do IR e de outros impostos, sem que exista um nexo entre eles, a não ser arrecadar mais. E o governo já cortou tudo o que podia cortar, anuncia a presidente Dilma, como se ainda estivesse de posse da decisão final.
O PMDB já anunciou que antes de aprovar aumentos de impostos para a população, quer ver a redução da máquina pública. A CIDE (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico) dos combustíveis, que ninguém sabia o que era e serviu até de pegadinha num debate presidencial, agora é a bola da vez para aumentar a arrecadação do governo.
Foi criada no segundo governo de Fernando Henrique Cardoso, quando Everardo Maciel estava na Receita e Davi Zylbersztajn na Agência Nacional do Petróleo (ANP). Imaginou-s a criação de um imposto que servisse essencialmente ao financiamento da infra-estrutura de transportes e melhora dos impactos ambientais decorrentes do uso de combustíveis fósseis. Ou seja, um subsídio cruzado, onde o consumidor de combustíveis financiaria a qualidade das estradas e a melhoria da mobilidade urbana.
O governo Lula, ao retirar a CIDE da gasolina, fez o Robin Hood às avessas, tirando do contribuinte como um todo e subsidiando os donos de automóveis. Isto tudo na contramão das principais reivindicações das manifestações de 2013, pela melhoria do transporte urbano.
Por lei, a CIDE dos combustíveis pode aliviar os gastos do setor de transportes e eventual subsídio de combustíveis. Não pode servir para fazer caixa do Tesouro nacional. É, portanto, mais uma tentativa fadada ao fracasso, pois não se pode fechar as contas com a CIDE, que tem recursos e finalidades carimbadas.
Fonte: O Globo, 10/9/2015
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