Líderes do Senado reagiram à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do “orçamento de guerra” e já preparam alterações em pelo menos dois pontos, considerados polêmicos: o poder de fogo dado ao Banco Central, para negociar diretamente a compra de carteiras de crédito e títulos com empresas e a criação de um comitê sem poder do Congresso.
A proposta, aprovada no último dia 3 pela Câmara, só será votada no Senado no próximo dia 13. A PEC cria uma espécie de orçamento paralelo para segregar as despesas emergenciais que serão feitas para o enfrentamento do novo coronavírus no Brasil, como antecipado pelo Estado no dia 23 de março. A mudança vai vigorar durante o estado de calamidade pública reconhecido pelo Congresso, ou seja, até o dia 31 de dezembro deste ano.
A proposta é defendida pela equipe econômica e foi patrocinada pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). No Senado, porém, parlamentares questionam o “cheque em branco” dado ao governo federal durante a crise do coronavírus. Além disso, há questionamentos se a mudança constitucional poderia ser feita em uma sessão pela internet, formato adotado para votações no período.
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Um dos pontos questionados é a previsão de o Banco Central comprar e vender direitos creditórios e títulos privados de crédito em mercados secundários. Isso dará poder ao BC para adquirir dívidas de empresas. Hoje, a autoridade monetária é proibida de fazer essa prática, comum em outros países como nos Estados Unidos. “A proposta vai sofrer emenda. Estamos debruçados sobre esses parágrafos (relativos ao BC)”, afirmou o líder do MDB no Senado, Eduardo Braga (AM).
A medida faz parte da estratégia do BC para tomar ações sem amarras e riscos jurídicos durante a pandemia. Além da PEC, uma medida provisória assinada pelo presidente Jair Bolsonaro no último dia 30 tira, no período da crise, a responsabilização de servidores da autoridade monetária por erros nas suas atribuições, a não ser que sejam classificados como dolo ou fraude. A MP também passou a ser questionada no Senado.
Pela PEC aprovada na Câmara, o presidente do Banco Central prestará contas ao Congresso Nacional a cada 45 dias sobre o conjunto das operações realizadas. O texto, porém, não foi suficiente para convencer senadores. “Imaginem um funcionário do Banco Central ao telefone, comprando bilhões em papéis podres. Sem contrato escrito, sem estudo sobre previsão orçamentária, ou sobre o tamanho do dano ao erário que tal operação pode representar”, comentou o líder da Rede no Senado, Randolfe Rodrigues (AP).
Outro ponto questionado no Senado é a criação de um comitê responsável por aprovar as ações do regime emergencial. O presidente Jair Bolsonaro vai presidir o colegiado, que será formado também por ministros. Pelo texto da Câmara, o Congresso poderá anular qualquer decisão “em caso de ofensa ao interesse público ou de extrapolação dos limites da sua ação”.
O dispositivo, de acordo com alguns parlamentares, levanta riscos de medidas sem fiscalização. “Essa PEC é desnecessária porque nós já demos o cheque o branco ao governo ao aprovarmos o decreto de calamidade dando liberdade ao governo federal para tomar todas as ações de combate ao coronavírus”, afirmou o senador Angelo Coronel (PSD-BA).
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Contra a possibilidade de votar a medida em uma PEC, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) vai protocolar projetos de lei com o mesmo conteúdo. “A PEC é um erro formal grave. Temos um governo com a maior tentação autoritária das últimas décadas e um Congresso Nacional que em grande parte é formado por pessoas sem grande experiência política ou formação jurídica. Não percebem que votações rápidas têm consequências graves”, disse Vieira.
O governo fez um apelo a senadores para que a PEC seja votada. O argumento é dar segurança jurídica a integrantes do Executivo e do Banco Central para tomar decisões durante a pandemia sem risco de questionamentos no futuro. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), prometeu que esta será a única PEC votada pelo Senado de forma virtual.
“Fica como filha única de mãe solteira neste momento de deliberação remota essa PEC (do orçamento de guerra), pelo tamanho da responsabilidade que temos e para dar a tranquilidade que o governo pede”, disse Alcolumbre quando questionado sobre a votação pela presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Simone Tebet (MDB-MS).
Fonte: “Estadão”