Rodrigo Silveirinha Corrêa, ou simplesmente Silveirinha, foi o símbolo de um dos maiores escândalos políticos do Rio de Janeiro, conhecido como escândalo do propinoduto. Subsecretário adjunto de Administração Tributária durante o governo de Anthony Garotinho, entre 1999 e 2002, Silveirinha montou, com um grupo de fiscais da Fazenda do Rio, um esquema de extorsão a empresas fluminenses. A quadrilha arrecadou e mandou para a Suíça US$ 34 milhões, o equivalente a R$ 77 milhões. O caso veio a público em 2003. Logo em seguida, Silveirinha e seus comparsas foram demitidos, condenados e chegaram a ser presos. O dinheiro na Suíça foi bloqueado em 2008. Alguns anos depois de deixar a cadeia, Silveirinha dizia que passara a dirigir um táxi para ganhar a vida, após uma tentativa fracassada de administrar um posto de gasolina.
A história parecia um exemplo de sucesso das instituições brasileiras no combate à corrupção. Na semana passada, o governo do Rio de Janeiro recebeu uma notícia triste para o cidadão honesto – e alegre para ele, o próprio, o Silveirinha, condenado por desviar o dinheiro dos impostos. A Justiça da Suíça decidiu em última instância que não repatriará o dinheiro para o Brasil. As autoridades suíças cogitam até mesmo devolver o dinheiro para Silveirinha e seus companheiros. Por que isso ocorreu? Uma das principais razões é que, em dez anos, a Justiça brasileira não conseguiu concluir o processo. Ou, na linguagem jurídica, a sentença dos acusados do propinoduto não “transitou em julgado”.
Em outubro de 2003, 22 pessoas foram condenadas pela 3ª Vara Federal Criminal do Rio, entre fiscais estaduais da Fazenda, auditores da Receita Federal e os doleiros que enviaram ilegalmente dinheiro ao exterior. Em 2007, as sentenças foram confirmadas pelo Tribunal Regional Federal. Os condenados recorreram, e o caso foi parar no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Desde 2009, as 22 mil folhas, distribuídas por 66 volumes do processo original, repousam, em segredo de Justiça, à espera de julgamento no STJ. Dez anos após a primeira condenação, a ação está no gabinete da ministra Assusete Magalhães, a sexta relatora do caso, ainda sem decisão. Existem sete recursos ativos sobre o caso no STJ e dois no Supremo Tribunal Federal. Segundo o STJ, o lapso de tempo se deve ao excesso de processos; à grande rotatividade de ministros das turmas penais; e a seis substituições desde 2012, agravadas pela demora nas nomeações.
“O julgamento sobre o qual a República Federativa do Brasil se apoiava para fundar suas pretensões civis não era definitivo. Assim, a natureza da lesão potencialmente sofrida pelo Estado do Rio de Janeiro não pode ser estabelecida definitivamente”, afirma a decisão do Tribunal Penal Federal da Suíça, de novembro de 2011, que nega o repatriamento dos recursos ao Brasil. Em janeiro deste ano, a Suprema Corte suíça ratificou a decisão do Tribunal Penal, concluindo o processo. Não cabe mais recurso, pela via jurídica, para trazer o dinheiro de volta ao Brasil.Apesar de a decisão ser do começo do ano, somente na semana passada a Advocacia-Geral da União, responsável pelo processo judicial, informou o resultado ao governo do Rio, segundo ÉPOCA apurou. Além da demora da Justiça brasileira, as autoridades suíças entenderam que a União não era parte legítima para pedir o repatriamento do dinheiro, porque o dano direto da corrupção fora causado ao Rio de Janeiro, não ao governo federal.
O governo brasileiro ainda não desistiu de recuperar os recursos, que continuam congelados na Suíça. Segundo o Departamento Internacional da Advocacia-Geral da União, a decisão encoraja uma “solução negociada” entre os dois países para a devolução do dinheiro, com base nos princípios da legislação federal suíça sobre o compartilhamento de ativos patrimoniais confiscados. O Ministério da Justiça capitaneia essa negociação e coordena as ações brasileiras. Se essa solução diplomática não prosperar, as autoridades suíças terão dois cenários: liberar o dinheiro aos correntistas ou incorporá-lo ao tesouro do país.
Silveirinha foi o nome mais conhecido do propinoduto, mas não foi quem mais mandou dinheiro para a Suíça. Em sua conta no Union Bancaire Privée, ele acumulou US$ 8,7 milhões. Outro auditor, Carlos Eduardo Pereira Ramos, juntou ainda mais: US$ 18,1 milhões. Como subsecretário adjunto de Administração Tributária, Silveirinha era o superior hierárquico de Carlos Eduardo, chefe da Inspetoria de Grande Porte – responsável pelas 400 maiores empresas do Estado e três quartos da arrecadação de ICMS. Juntos, os dois obtiveram 79% dos recursos desviados pelo grupo. Em 2012, o caso entrou na lista do Banco de Dados de Grandes Casos de Corrupção, do Banco Mundial. Por esse recorde nefasto, Silveirinha e Carlos Eduardo deveriam ser punidos – e não premiados, como pode acontecer.
Fonte: Época
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