Mais uma semana infernal nos mercados. Tudo começou na segunda-feira (31/8), depois do envio ao Congresso de uma peça orçamentária já contando com um déficit de R$ 30,5 bilhões, 0,5% do PIB, para 2016. Acabou repercutindo negativamente por mostrar um governo “meio que entregue”, desistindo do esforço fiscal, tentando dividir responsabilidades com o Congresso. Na quinta-feira, outra bomba foram os boatos sobre a possível saída do Ministro da Fazenda, Joaquim Levy, se sentido desprestigiado e não conseguindo levar adiante um ajuste fiscal mais profundo. Dilma e companhia acabaram conseguindo demover o ministro de sair e tiveram que aceitar uma postura mais incisiva no ajuste fiscal, na perseguição por um superávit (e não aceitação de um déficit).
No meio do caminho, ainda tivemos o Copom decidindo pela manutenção da taxa de juros em 14,25% por um “período suficientemente prolongado” e a produção industrial recuando 1,5% em julho contra junho, reforçando a tese de que já estamos em recessão e o terceiro trimestre do PIB deve ser ainda mais fraco do que o segundo.
Peça mais realista– Na análise do projeto de Orçamento de 2016 chamou atenção uma proposta mais realista de já iniciar 2016 com déficit. De certa forma foi um esforço de compartilhar com o Congresso o desafio do ajuste das contas públicas, por esta casa ter sido uma das responsáveis pelo atraso do ajuste neste ano. É possível que fechemos 2015 no vermelho, com um déficit primário entre 0,2% e 0,5% do PIB, dado o fraco desempenho da arrecadação federal e a crise política, o que acabou paralisando (ou atrasando) muitas das medidas enviadas pelo ministro Levy ao Congresso.
Cabe salientar, no entanto, que esta peça fiscal mais realista acabou também deixando de lado a necessidade de reformas mais profundas, como a Reforma da Previdência. Neste regime, o governo orçou para 2016 R$ 366 bilhões em receitas e R$ 491 bilhões em despesas, num déficit programado impressionante de R$ 125 bilhões. Lembremos que em 2014 fechou em torno de R$ 58 bilhões e neste ano deve ficar em torno de R$ 88 bilhões. Neste grupo, estariam as “despesas obrigatórias”, não passíveis de corte, representando 80% do total, incluindo também as despesas com pessoal.
Cabe salientar que com a recessão em curso, a queda de contribuição previdenciária vem sendo inevitável, assim como o aumento das despesas gerado pelo impacto dos reajustes do salário mínimo (10% em 2016), sendo este atrelado aos benefícios da maioria dos aposentados.
Como a expectativa de vida da população vem aumentando, o impacto sobre a Previdência vem se tornando maior, jogando as despesas para cima. Muitos acham que a longo prazo a trajetória deste regime tende a se tornar insustentável. Estudos indicam mudanças cruciais, como no caso da idade mínima para aposentados, com elevação de 65 anos para 67; alterações no Fator Previdenciário; ajustes nas aposentadorias dos servidores públicos, dentre outras.
Dúvidas, no entanto, surgem sobre a viabilidade das reformas estruturais neste momento de tensão política e incertezas econômicas. Achamos, por exemplo, que o Congresso deveria se mobilizar para tentar tocar uma agenda de reformas. Levy, inclusive, já colocou em negociação a “reforma do ICMS”, com a necessidade de unificação da alíquota, evitando assim a “guerra fiscal”. Teríamos como compensação, o retorno da taxação sobre as repatriações de recursos de brasileiros no exterior visando compensar possíveis perdas de alguns estados da Federação.
Em paralelo, diante de uma economia em recessão, outros debates devem evoluir, neste contexto, com efeitos mais imediatos, como a criação de alternativas de receita para este ano. No Orçamento 2016, o governo aventou sobre a necessidade de maior taxação sobre alguns bens duráveis, como material de informática, bebidas “quentes”, revisão do direito de imagem, mais IOF sobre operações de crédito do BNDES, etc. Sobre a venda de ativos, teríamos operações de venda de parcelas de empresas como a BB Seguridade, IRB, imóveis da União, leilão de folha de pagamentos, ampliação de concessões, em especial, na energia elétrica, dentre outros. Neste total haveria uma arrecadação adicional em torno de R$ 38,5 bilhões. Se pensarmos no retorno do CPMF seriam mais R$ 70 bilhões para o ano de 2016, mas cabe indagar se esta medida avançaria, dadas as pressões políticas contrárias no Congresso e na sociedade como um todo.
Decisão do Copom– A reunião do Copom, ocorrida na quarta-feira (dia 2), não trouxe grandes novidades, visto que a ata anterior já vinha sinalizando esta possibilidade em manter a taxa de juros por um “período suficientemente prolongado de tempo”. É possível que a taxa de juros se mantenha em 14,25% até o primeiro semestre do ano que vem, mas devemos estar atentos, em paralelo, à evolução da execução fiscal. Caso o ajuste avance, em sinergia com o Congresso, e tendo Levy mais fortalecido, será possível pensar num início do ciclo de redução do juro lá por meados do ano que vem.
Caso contrário, com o ajuste “ficando pelo caminho”, o câmbio deve se depreciar ainda mais e a inflação se elevando, com a deterioração de expectativas inevitável. Neste caso, a taxa básica de juros deve ser mantida no atual patamar, ou mesmo elevada. Devemos observar, também, nesta análise, a economia em recessão ao fim deste ano e início do próximo. Pelas projeções do governo, o PIB de 2016 ainda deve crescer 0,2%, ao contrário da Focus, já trabalhando com retração de 0,4% e esta Consultoria, entre -0,5% e -1,0%.
Por fim, causaram certo alvoroço no mercado os boatos de que Joaquim Levy estaria demissionário por se sentir desprestigiado pelas ações de política econômica, mais orquestradas por Nelson Barbosa, assessorado pelo Chefe da Casa Civil Mercadante.
Achamos que os sinais seguem trocados na relação entre Joaquim Levy e Nelson Barbosa. Os discursos de ambos sinalizam caminhos opostos. O primeiro mais duro na necessidade do ajuste fiscal, o segundo, mais condescendente, visando equilibrar possíveis prejuízos.
Com esforço, o governo conseguiu “esvaziar” estes boatos, mas para continuar Levy exigiu maior empenho na perseguição de um ajuste fiscal mais consistente e duradouro, visando um saldo primário positivo no final de 2016 e ao longo do tempo, e não negativo como anunciado.
Para isto, no entanto, será essencial a boa vontade do Congresso e menos “fogo amigo” de dentro do próprio governo. Aguardemos como serão os próximos movimentos da equipe econômica e como deve evoluir a relação de Levy com o ministro Nelson Barbosa.
O fato é que caso Levy saia do governo de forma intempestiva, estarão abertas as portas para novos rebaixamentos. Sobre isto, no curto prazo se aproxima a data de um novo rebaixamento, desta vez da Fitch, em perspectiva negativa e a única a manter o Brasil a dois degraus do nível especulativo. Esperamos que os quadros políticos, Lula, o PT, parte deste governo, estejam atentos aos estragos que isto pode representar para a governabilidade da presidente Dilma.
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