Em época de eleições, são comuns as discussões, até mesmo entre amigos, sobre políticas de governo, “projetos de país”, cortes e aumentos de gastos, carga tributária, regulamentações, leis trabalhistas, etc.
Algo que sempre me chamou a atenção nessas discussões e debates é que quase todo mundo quer menos impostos, mas ninguém quer que o governo corte seus programas favoritos. Experimente falar de privatização de universidades, fim de cotas raciais, revisão das políticas de salário mínimo, de incentivo à cultura ou de subsídios à indústria. Não raro, virão com o velho clichê: “não se deve jogar fora o bebê, junto com a água do banho”.
Embora a maioria das pessoas já tenha entendido que “não existe almoço grátis”, quando se trata dos “programas favoritos” de cada um, a conversa esquenta. Poucos são aqueles que entendem que as exceções de uns serão usadas como moeda de troca para as exceções dos demais. Afinal, o chamado “logrolling” é tão antigo quanto a democracia.
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Mas há também os socialistas empedernidos, que ainda reagem de maneira virulenta a quaisquer esforços de cortes orçamentários. Para estes, a crença no “almoço grátis” é um verdadeiro dogma – e é provável que assim permaneça, até que a economia finalmente entre em colapso, sob o pesado fardo dos gastos públicos e das regulamentações, como já ocorreu na Grécia e outros países europeus, bem como n’alguns estados tupiniquins.
Segundo a cantilena “progressista” (que de progressista não tem nada), é dever do governo compartilhar a riqueza (dos outros), proteger nossos empregos (às custas de outros empregos), salvar o planeta (não raro de alguma ameaça inexistente), tornar nossa velhice mais segura e feliz (às custas dos nossos netos), garantir nossa saúde, entre outras quimeras. A justiça social, para essa gente, consiste em tirar dinheiro e empregos de algumas pessoas, transferindo-os para outras – não raro cobrando alguma sinecura pela intermediação e rejubilando-se de sua grande generosidade.
A principal faceta psicológica do esquerdismo é a falta de confiança, que se manifesta de duas maneiras. Primeiro, há uma incapacidade latente de acreditar que as pessoas são capazes de cuidar de si mesmas. Segundo, mas não menos importante, há a falta de percepção de que o progresso ocorre sem ser imposto de cima pra baixo, de acordo com um planejamento central.
Esquerdistas (e alguns direitistas) raciocinam sob a ilusão de que tudo ficará bem se as pessoas certas estiverem no comando. Sua visão de mundo não admite que exista uma propensão inerente aos seres humanos para preconceitos arraigados, otimismos infundados e cegueira deliberada para fatos inconvenientes.
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Não por acaso, muitos esquerdistas acreditam no governo Papai Noel, cujos recursos são ilimitados e as boas intenções são capazes de corrigir quaisquer eventuais influências corruptoras da natureza humana.
Os liberais, por sua vez, entendem que os recursos do estado são escassos e obtidos via cobrança de impostos, empréstimos e inflação. Eles entendem, ademais, que todo recurso gasto pelo governo é um recurso que não pode ser usado – geralmente de maneiras melhores – pelos pagadores de impostos.
Os liberais também entendem que uma pessoa não se torna automaticamente mais sábia, eficiente ou menos corruptível ao se tornar parte do governo. Além disso, sabem que o governo não pode prever, replicar ou substituir milhões de interações complexas, responsáveis, em última instância, pelo bem estar e o progresso econômico.
Essa batalha pelos corações, mentes e recursos dos cidadãos tupiniquins continuará enquanto houver – na expressão de Thomas Sowell – esse “conflito de visões”. Um conflito entre visões irrealistas e realistas sobre a natureza humana e a irrevogável escassez de recursos.
No lado irrealista estão aqueles cujo pensamento mágico os leva a acreditar que o governo pode resolver todos os “problemas” com o golpe da pena de um presidente, bastando que os ricos sejam devidamente taxados, para o bem do povo e felicidade geral da nação, sem que isso signifique qualquer problema para a eficiência econômica em geral.
No lado realista estão os liberais e alguns conservadores, que entendem que a natureza humana é imune à reengenharia social, o que significa que coisas ruins acontecem quando as pessoas são obrigadas a financiar o Estado em seus esquemas de bem estar. Os realistas entendem também que, na maior parte das vezes, os “problemas” visualizados pela esquerda não são problemas reais, mas fatos da vida, que poderiam ser contornados por pessoas livres, agindo voluntariamente através dos mercados e outras organizações sociais privadas.
Fonte: “Instituto Liberal”, 13/08/2018