O coordenador do Centro de Empreendedorismo e Novos Negócios (CENN) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), professor Marcus Salusse, afirma que a maior parte dos serviços e produtos já existentes são passíveis de se tornarem mais eficientes com o uso de tecnologia.
“Serviços como Uber, Airbnb e Spotify romperam com setores tradicionais. Em comum, todos têm a questão da tecnologia muito forte. O uso da tecnologia permite que os empreendedores satisfaçam as necessidades do público de maneira melhor, mais rápida, mais barata e escalável, beneficiando maior quantidade de pessoas.”
Foi nesse contexto que a Carona Verde, de Marcelo Burle, achou brecha para inovar no mercado de publicidade e de mobilidade urbana. A empresa, que iniciou a operação há sete meses, desenvolveu triciclos que circulam na ciclovia da Avenida Paulista dando carona gratuita às pessoas que precisam cruzar a avenida.
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A receita vem de publicidade móvel estampada no uniforme dos condutores, no toldo do triciclo e de anúncio de cupons de desconto de comerciantes da região, enviados pelo aplicativo da empresa, pelo qual os usuários solicitam a carona. “O negócio nasceu para incentivar o uso das ciclovias e colaborar com a mobilidade urbana sustentável, porque ajuda a reduzir a emissão de poluentes.”
A operação começou com dois triciclos, hoje são 12. O produto tem fabricação própria, é registrado e patenteado. A ideia surgiu quando a ciclovia começou a ser construída. Ele e a irmã são engenheiros e trabalham com o pai, que é advogado, fazendo regularização de documentação técnica, como alvarás e licenças de funcionamento, na Prefeitura.
“Temos diversos clientes na região da Paulista e pensamos que usar bicicleta seria boa alternativa, porque cruzamos a avenida várias vezes por dia. Mas a logística de levar a bicicleta até lá seria complicada. Em viagem à Los Angeles, vimos um serviço semelhante e resolvemos replicar por aqui. Achamos a ideia muito boa por atender quem não sabe ou não têm condições de pedalar”, avalia.
Burle aproveitou seus conhecimentos de legislação municipal para definir o modelo de negócio. “Nossa publicidade atende a legislação e paga os custos da empresa. Investimos pouco mais de R$ 300 mil e estamos perto de recuperar o valor.”
O empresário afirma que a partir do próximo dia 15, quatro triciclos começam a operar na ciclovia da Avenida Faria Lima. “Atuamos de acordo com as necessidades do patrocinador. Faremos promoção de um evento cultural que ocorrerá naquela região. A demanda é grande. Já recebemos pedidos vindos de Montevidéu, Rio de Janeiro, Campo Grande e Brasília.”
Na avaliação do professor Salusse, a Carona Verde é “uma ideia incrível e sustentável”, que segue os conceitos da ONU. “O negócio tem uma série de atrativos e encontrou nova forma de gerar valor aos clientes. O modelo de marketing deles, feito a partir do momento que o usuário baixa o aplicativo, envolve mídia push (notificação de promoções). Então, além de ter a publicidade no triciclo, o usuário também recebe cupons e propagandas pelo aplicativo.”
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Salusse lembra que os empreendedores estão sempre em busca de um problema a ser resolvido ou de uma necessidade a ser satisfeita. “Ao identificar uma oportunidade, a pessoa deve se perguntar: eu consigo resolver isso de maneira melhor, mais rápida e mais barata que a solução já existente?”
No caso dos fundadores da plataforma Buser, que aproxima empresas de fretamento de ônibus de turismo a grupos de pessoas que querem viajar, a resposta foi sim. A ideia surgiu a partir de experiência pessoal.
“Meu casamento foi realizado em Arraial D’Ajuda, no litoral sul da Bahia. Mas cerca de 30 parentes meus não tinham condições de comprar passagens áreas para irem à cerimônia. Cotei quanto custaria comprar 30 passagens de ônibus na rodoviária e o valor de ônibus fretado. Vi que a diferença de preço era grande e conclui que se funcionava para mim, funcionaria para as outras pessoas”, conta Marcelo Abritta, que se associou a Marcelo Vasconcellos para criar o negócio.
Segundo ele, a média de economia é de 50%, mas em alguns casos pode chegar a 70%. A Buser mantém parceria com empresas de fretamento de ônibus, que costumam atender companhias de turismo.
“Essas empresas são fiscalizadas pelos órgãos competentes, só trabalham com motoristas profissionais que são obrigados a fazer reciclagem da carteira de motorista periodicamente etc. Já usamos mais de 20 empresas diferentes. Em nossa base temos 50 empresas cadastradas. Fazemos a seleção dos ônibus disponíveis no portfólio das empresas pessoalmente.”
Abritta diz que quem quer viajar (não apenas de turismo) deve entrar na plataforma e digitar o destino e a data. “Caso a pesquisa indique que ainda não há nenhum grupo formado, o interessado clica em criar grupo e define data e destino desejados. Caso a viagem não tenha demanda suficiente para ser confirmada, os interessados são avisados com 36 horas de antecedência, para que possam comprar passagem na rodoviária.”
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Segundo ele, a quantidade de pessoas necessárias para confirmar uma viagem envolve muitas variáveis. “Em alguns casos, com oito pessoas é possível confirmar. A ferramenta usa inteligência artificial para fazer projeções e informar qual é o porcentual de chance de determinado grupo ser confirmado. A rota Belo Horizonte-São Paulo é uma que tem muita procura. Caso alguma viagem não ocorra, o valor pago é reembolsado.”
Ele afirma que a possibilidade de a viagem não ocorrer fica bem clara para o público. “Ninguém nunca reclamou. As pessoas preferem trocar a certeza da viagem pela incerteza, desde que paguem valor menor. É uma nova forma de viajar. Quanto mais usuários tivermos, mais fácil será confirmar.”
O empresário teve dificuldade para caracterizar a empresa, porque órgãos reguladores consideraram o negócio como empresa de transporte de linha regular, quando na verdade é empresa de tecnologia. “O fretamento sempre existiu, mas era feito por grupos inteiros. Agora, com a internet, é fácil juntar 30 pessoas para montar uma viagem.”
Em operação desde março, a empresa já fez 500 viagens e transportou 13 mil pessoas. “Até o final de 2019 queremos transportar três mil por dia.”
Teldoctor promete agilizar atendimento
Por falta de legislação específica, a inovação pode ter de ser postergada. A startup Teldoctor passou por isso. “Em 2015, conheci dois médicos de Harvard que tinham projeto de telemedicina e tentamos implantá-lo no Brasil. Mas as regras não eram claras e eles desistiram, tanto por não falarem a língua quanto por acharem a burocracia muito complicada”, diz o CEO, Marcelo Callegari.
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O contratempo não tirou o foco do CEO, que continuou trabalhando na ideia. Em 2017, depois de obter os pareceres de órgãos de saúde que eram necessários para lançar o serviço, começou a operação em sociedade com o médico Luis Henrique Pereira.
“A telemedicina tem dois princípios: o preventivo, quando o paciente passa por triagem eletrônica, e o médico dá orientações e faz encaminhamento para exames, e a teleassistência, quando o médico faz o atendimento por meio de vídeo”, explica Callegari.
A Teldoctor atua nas duas frentes. O serviço começou com 50 atendimentos por dia. Hoje, a média é de mil pessoas. A consulta custa R$ 69.
“Queremos popularizar a telemedicina como ocorre nos Estados Unidos. Lá, em dois anos, 17 empresas movimentaram US$ 1 bilhão.”
A consulta é feita por meio do site. O paciente preenche sua ficha clínica e a ferramenta de inteligência artificial faz avaliação prévia e direciona o paciente ao médico especialista. Ele conversa com o paciente e em poucos minutos define prescrições de conduta e exames a serem feitos, inserindo assinatura eletrônica no pedido.
Segundo ele, a telemedicina pode desafogar clínicas e o SUS, reduzir custos e incentivar a medicina preventiva. “Temos 25 médicos que podem atender até 150 mil pessoas por mês. Agora, estou buscando investimento para triplicar o número de médicos e montar centrais no Nordeste e Centro-Oeste.”
Fonte: “O Estado de S. Paulo”