O fim das férias trouxe o Supremo Tribunal Federal (STF) para o centro da cena política. Em decisões tomadas ontem e no planejamento dos trabalhos para o segundo semestre, o STF transmitiu um recado inequívoco: nem o presidente Jair Bolsonaro nem o ministro Sérgio Moro terão vida tranquila nos embates com a Corte.
Bolsonaro foi alvo de uma decisão do ministro Luís Roberto Barroso, que lhe deu um prazo de quinze dias para atender a um pedido do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe de Santa Cruz. A decisão não tem a força de exigência, mas tem valor simbólico.
Santa Cruz pede esclarecimentos sobre o que Bolsonaro afirmou a respeito de seu pai, militante de um grupo terrorista de esquerda que, segundo apuração da Comissão da Verdade, foi morto nos porões da ditadura militar. Bolsonaro insinuou sem provas que o pai de Santa Cruz foi assassinado pela próprio grupo.
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Bolsonaro ainda aguarda para este semestre (em princípio, no dia 21 de novembro) a decisão do plenário sobre a liminar do ministro Dias Toffoli, presidente do Supremo, que beneficiou seu filho, o senador Flávio Bolsonaro, e dezenas de outros suspeitos, ao suspender as investigações municiadas por relatórios do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) emitidos sem ordem judicial.
As decisões mais relevantes de ontem atingiram Moro, alvejado desde 9 de junho pelas divulgação, pelo site The Intercept Brasil e outros veículos, do conteúdo das mensagens atribuídas a ele e a procuradores da Operação Lava Jato, oriundas, segundo investigação policial, da invasão de contas no aplicativo Telegram.
Por ironia, a decisão que mais complica a vida de Moro partiu do ministro Luiz Fux, citado em termos positivos numa mensagem atribuída a ele. “In Fux we trust” (em Fux, confiamos), diz a mensagem, publicada às vésperas de Moro conceder a entrevista em que passaria a insinuar que o conteúdo divulgado pelo Intercept pode ter sido adulterado.
Fux determinou a preservação do material obtido com os acusados de invadir a conta no Telegram de quase mil alvos, entre eles dezenas de autoridades. Noutra decisão, o ministro Alexandre de Moraes determinou que tudo seja enviado ao Supremo em 48 horas.
Ao informar algumas autoridades de que haviam sido alvo da invasão, Moro chegou a afirmar que o material seria destruído. Se periciado por ordem judicial, o conteúdo apreendido pode confirmar ou desmentir a autenticidade das mensagens. Como é resultado de furto, não há consenso entre juristas sobre seu uso como prova nos processos em que os réus da Lava Jato contestam a imparcialidade de Moro.
Na hipótese de perícia, será essencial garantir a privacidade dos atingidos pela invasão, com cuidados similares aos tomados em escutas telefônicas legais, em que o material bruto é descartado, e apenas o que tem interesse jurídico, preservado. A mera discussão do assunto, suscitada pelas decisões de Fux e Moraes, é um revés para Moro.
Fux e Moraes têm adotado postura favorável às decisões dele na Lava Jato, quando instados a se pronunciar sobre o assunto no Supremo. O dia de ontem pode marcar uma inflexão. Se passarem a votar com a ala garantista da Corte, o clima contrário a Moro se estenderá da Segunda Turma, onde a Lava Jato tem regularmente perdido, ao plenário, onde ainda não sofreu derrota significativa.
Moraes também suspendeu investigações de 133 contribuintes, por ver “desvio de finalidade” na devassa da vida financeira de “agentes públicos”, entre eles ministros do STF. Em diálogo atribuído ao procurador Deltan Dallagnol, chefe da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, discute-se uma investigação contra Toffoli.
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A decisão mais crítica para definir o futuro da Lava Jato e do combate à corrupção no país não foi incluída na pauta do Supremo neste semestre. Trata-se do julgamento sobre a execução das penas depois da condenação em segunda instância, que vem sendo adiada há anos.
Haverá, em contrapartida, o julgamento da suspeição de Moro no processo que levou à prisão o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Se o STF anular a condenação de Lula, irá além dos reveses impostos a Moro ou Bolsonaro e acirrará a polarização política, num país já conflagrado.
Fonte: “G1”, 02/08/2019