De plano, cabe falar a respeito do método que forma o mais graduado órgão do poder Judiciário brasileiro. Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) fazem parte de listas oferecidas ao chefe de governo para que este selecione um nome, o qual será sabatinado, ou seja, passará teoricamente por avaliação oral a respeito do seu então já reconhecido e notório saber jurídico.
O método citado faz parte do Estado brasileiro desde os tempos republicanos e segue a fórmula da Corte Suprema dos Estados Unidos da América. No entanto, no passado os Ministros eram escolhidos com mais critério, talvez por existir um resquício de respeito ao guardião da Constituição e suas responsabilidades para com o povo e o pacto social republicano.
O que se verifica atualmente é a indicação de juristas mais próximos dos atos do governo em questão, em virtude de suas teses já elaboradas para tanto, preparadas para seduzir administradores do alto escalão do poder Executivo a fim de aguçar o apontamento presidencial.
Uma vez indicado, o candidato passa por sabatina do Senado Federal. Aqui, a principal pergunta é: se para compor o Senado Federal o candidato precisa apenas ser basicamente alfabetizado (ou às vezes decorar o desenho de sua assinatura), como poderá avaliar a competência, capacidade e equilíbrio de um jurista com notável e comprovado saber científico?
Que fique evidente: não existe resposta convincente de nenhum dos poderes, inclusive do Judiciário, que segue se submetendo ao sistema. Cargos técnicos que dependem dos estudos das ciências devem depender apenas de merecimento por reconhecimento. Não são e nem devem ser democráticos nos mesmo critérios dos cargos eletivos. Mas isso é tão básico de entendimento que só não entende quem não deseja entender diante de alguma vantagem pessoal ou partidária.
Dentro de um sistema comprometido como o acima citado é possível verificar tempos mais ou menos conturbados e abusivos no que tange à transparência e à dedicação ao povo eleitor, contribuinte. Nem todos os ministros do STF foram simpáticos às causas de seus indicadores ou sabatinadores. Alguns realmente seguiram suas carreiras como julgadores que guardam a eficácia da Constituição e seus dizeres e decisões.
Então, faz-se necessário esclarecer que o STF tem como função originária, principal, a guarda do texto constitucional e o cumprimento ou concretização do mesmo. É exatamente por isso que a Corte Suprema tem prerrogativa para analisar os casos levados ao seu conhecimento com poder e competência para fazer valer a tradição dos julgados anteriores ou mudar o rumo do direito e de seus efeitos diante do que precisa ser mudado. Tudo se aperfeiçoa diante do tempo. Até a água, quando estagnada, apodrece.
Se o objetivo do Tribunal Maior de uma nação fosse apenas chancelar os entendimentos de outras instâncias anteriores a ela, não teria porque existir, a não ser para afirmar a tirania ditatorial de um regime tirano de governo e de seus cúmplices parlamentares.
Diante de um caso novo e de seus desdobramentos técnicos e sociais é que os julgadores tidos como mais experientes e responsáveis pela ordem moral dos governados e de seus governantes devem atuar, quando preciso, de forma inovadora na medida em que a situação do Estado e de seu povo exija.
No que se refere ao desempate entre os ministros do STF com relação aos embargos infringentes atinentes ao caso Mensalão, coube ao ministro Celso de Mello definir qual caminho a seguir.
É um dos ministros mais técnicos do Judiciário. Um dos poucos que de fato e direito podem compor a Casa. Notável e notório saber jurídico no caso dele esmagam outros componentes do Supremo. Vida dedicada e ilibada ao direito e à justiça.
Então qual é a dúvida a respeito do voto de Minerva que desempatou a questão? O ministro é adepto de uma corrente jurisprudencial conexa à ampla defesa, o que significa aceitar embargos infringentes para qualquer caso julgado originariamente no Supremo, pois não existe outra instância de recurso além do STF.
Para evitar o desmembramento dos processos dos acusados para as varas estaduais de cada acusado, e assim transformar o processo como um todo numa bagunça, aí sim, sem prazo para acabar, pois teríamos inúmeros juízes e ainda mais recursos em cada comarca até que todos chegassem no Supremo Tribunal Federal (se chegassem), o ministro preferiu aceitar a possibilidade dos embargos, pois, dessa forma, pelo menos, o processo seria reavaliado por uma mesma Corte, cujos membros possam ser acompanhados e cobrados publicamente com muito mais facilidade e transparência.
Se existe algo a ser modificado com urgência para que o Supremo possa ser melhor cobrado são as normas eleitorais, penais, a avaliação dos candidatos, a reforma política como um todo, o que é muito mais simples do que se possa pensar. Basta querer fazer e saber cobrar.
Acompanhando a carreira do ministro Celso de Mello é mais provável supor que ele tenha tido a esperança de ver os seus pares votarem quase que absolutamente contra a possibilidade dos embargos infringentes, o que não aconteceu. Mesmo assim, é preferível ver a reabertura do julgamento numa mesma seara do que ter o julgamento pulverizado entre vários juízes sem qualquer controle popular e sem qualquer garantia de responsabilidade.
Prevaleceu a tradição processual técnica prevista em lei. Sim, é lamentável que hoje a composição da Corte seja diferente daquela que condenou os corruptos. Contudo, os membros do Supremo nunca estiveram tão expostos em suas funções quanto estarão nesse caso.
As decisões de cada um devem ser fundamentadas textualmente. O que farão diante das provas e dos votos dos ministros aposentados mas ainda opinantes, os quais apontam documentos fartos comprovando os crimes em tela? Como explicarão à nação uma eventual absolvição? Examinar os embargos infringentes não significa absolver os acusados. Para algo ser modificado, precisa ser defendido com muita, muita consistência.
Caso o STF em sua maioria resolva beneficiar os acusados sem motivos técnicos e evidentes também ao povo, será conhecido como a instituição responsável pela derrocada do contrato social, da cidadania e do Estado democrático de direito em nosso país.
Novas eleições podem nos ajudar a começar uma regeneração do Congresso Nacional e no poder Executivo, mas não tem alcance para expurgar assessores políticos residentes na Corte Suprema, considerada com razão o último bastião da Justiça, da Moral e da Ordem em nações livres.
Por isso mesmo os ministros do STF não devem e não podem se submeter à opinião pública meramente por emoção. Mas precisa lembrar sua obrigação de dar satisfação clara de seus atos. Jamais deve ser submisso, mas deve manter a coerência. Deve primar pelo exemplo de conduta e probidade. Deve garantir a eficácia das normas, o desenvolvimento, a Ordem e o Progresso previstos em nossa amada bandeira.
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