“O esforço natural de cada indivíduo para melhorar sua própria condição é tão poderoso que é, sem nenhum favor, capaz não apenas de levar a sociedade à riqueza e à prosperidade, mas de superar centenas de obstruções impertinentes com as quais a loucura das leis humanas muitas vezes sobrecarrega suas operações.” Adam Smith
O debate político recente pelo mundo tem sido dominado por duas questões: o aumento da desigualdade econômica e a escalada da intervenção do governo para resolvê-la. O foco central da esquerda é o aumento dos impostos e gastos do governo, principalmente para reverter a crescente estratificação da sociedade, enquanto o foco central da direita (liberais e parte dos conservadores) é a redução de impostos e gastos, principalmente para garantir o dinamismo e o crescimento econômico.
De fato, a desigualdade aumentou em quase todos os lugares do mundo capitalista pós-industrial (embora esteja em declínio nas últimas décadas). Mas, apesar do que muitos da esquerda pensam, esse não é o resultado de uma política econômica deliberada. A desigualdade é um produto inevitável da atividade capitalista, e a expansão de oportunidades apenas a aumenta – porque alguns indivíduos e comunidades são simplesmente mais capazes do que outros de explorar as oportunidades de desenvolvimento e avanço que o capitalismo oferece. (Eu sei que esta afirmação pode parecer cruel aos ouvidos de alguns, mas é a mais pura verdade).
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Nos últimos séculos, a expansão do capitalismo gerou um salto fenomenal no progresso humano, levando a aumentos antes inimagináveis nos padrões de vida. O dinamismo intrínseco do capitalismo, no entanto, produz, além dos benefícios da geração exponencial de riqueza, muita insegurança e, portanto, seu avanço sempre encontrou resistência. De fato, grande parte da história política das sociedades capitalistas tem sido pautada por tentativas mais ou menos radicais de aliviar ou amortecer essa insegurança.
No momento, estamos testemunhando um movimento anticapitalista extremo, que tenta reabilitar uma tradição ideológica há muito adormecida. A obsessão desse movimento é a busca de uma igualdade extremada, expressa principalmente através do nivelamento punitivo dos indivíduos mais prósperos. Coisas que contribuem para a desigualdade, como renda, lucro ou riqueza, são consideradas danos públicos que precisam ser controlados – por impostos, regulações e outras políticas governamentais. As consequências mais visíveis dessas políticas são desequilíbrio fiscal, inflação, estagnação econômica e, last but not least, perda crescente das liberdades individuais.
Mas o problema principal é que tais políticas desconsideram completamente o principal fato econômico, aquele que está na raiz da própria ciência econômica: a existência da escassez. E as sociedades não sobrevivem se não enfrentarem diretamente o fato essencial da escassez, que é parte indelével da vida humana.
O radicalismo igualitarista de certo discurso político contemporâneo, como nos lembra o sempre didático Don Boudreaux, ignora completamente a realidade da escassez ou trata a escassez como sendo muito menos importante e problemática do que realmente é – como quando os demagogos propõem financiar os numerosos “direitos” das massas com as crescentes receitas tributárias extraídas. dos “ricos”.
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A capacidade dos políticos de ignorar ou desprezar a escassez como assunto menor só é possível pela ignorância econômica do público. Pessoas não familiarizadas com a economia são presas fáceis para aqueles que prometem que essa ou aquela abordagem radical e nova desvendará o segredo para finalmente fazer “as economias funcionarem para todos, em vez de apenas para os ricos”. Além disso, o desejo humano de acreditar em curas milagrosas e balas mágicas é tão forte que fabricantes dessas fantasias nunca faltam para clientes ansiosos.
Mas não é apenas por ignorância e crendice que as pessoas são facilmente ludibriadas pelos vendedores de ilusão. Ironicamente, essa capacidade de tratar a escassez como se fosse, no mínimo, um pequeno inconveniente facilmente contornável é aprimorada pelo próprio mercado. A robustez do mercado – sua capacidade, mesmo diante de absurdos impostos pelo Estado, de continuar produzindo cada vez mais a custos cada vez menores – transmite a impressão equivocada de que a escassez não é algo importante.
É essa poderosa robustez do mercado, que permite aos políticos taxá-lo, engessá-lo com regulamentações, envenená-lo com dinheiro fácil, acusá-lo de ser dirigido por e para demônios, e, ainda assim, ele continuar avançando. O mercado funciona menos bem do que funcionaria na ausência dessas intrusões, é claro, mas ainda funciona surpreendentemente bem. Enquanto os preços e os salários puderem se ajustar de acordo com as forças da oferta e da demanda, a robustez do mercado é hercúlea. Mas não se iludam: apesar de toda essa resiliência, o mercado não é indestrutível – vide a Venezuela.
Talvez se o mercado colapsasse com mais frequência, dando às pessoas uma amostra de como é a vida sem ele, o mundo teria não apenas muito menos comunistas e socialistas, mas também muito menos “progressistas” e “nacionalistas conservadores”. O verdadeiro fracasso do mercado, em suma, está na sua incrível capacidade de ter sucesso e continuar seguindo em frente, apesar dos pesares.
O fato de processos de mercado inovadores continuarem produzindo cada vez mais produtos a custos cada vez menores não significa que a escassez seja irreal ou escapável. A escassez sempre estará conosco e, portanto, devemos sempre sacrificar algumas armas para obter mais manteiga, algumas espadas para obter mais arados, algum consumo hoje para obter ainda mais amanhã e, principalmente, alguns falsos direitos, a fim de preservar a poupança e os investimentos que nos farão todos mais ricos amanhã.