Coordenador das propostas econômicas do candidato do MDB à Presidência nas eleições 2018, Henrique Meirelles, o economista José Márcio Camargo defendeu o congelamento dos salários dos funcionários públicos para ajudar a equilibrar as finanças públicas. “Minha avaliação é que os funcionários públicos têm uma média (salarial) muito acima da dos trabalhadores”, afirmou ele, durante participação na série “Estadão/FGV/Ibre” Os Economistas das Eleições. O economista disse que a prioridade de Meirelles, se eleito, será a reforma da Previdência. Ele ressaltou que a Previdência do setor público é um grave foco de desigualdade que contribui para o aumento do déficit. Camargo acredita que o País tem condições de atrair investimento privado para gerar um número de postos de trabalho suficiente para resolver o problema do desemprego a médio prazo. “Não sei se 10 milhões de empregos”, disse, em referência a uma das bandeiras de Meirelles na campanha. A seguir, os principais trechos da sabatina:
Estadão – Meirelles comandou a equipe que tentou emplacar a reforma da Previdência e não conseguiu. Como vai aprová-la se eleito?
José Márcio Camargo – Não existe nada mais grave do ponto de vista de desigualdade do que o problema da previdência do setor público. A reforma atual proposta não resolve todo o problema, mas traz coisas importantes. A paridade e integralidade passam a valer para quem se aposentar com 65 anos ou mais. O ideal seria acabar com essa paridade e a integralidade. Hoje, uma enorme quantidade de funcionários públicos se aposenta com 55 anos com paridade e integralidade. Isso aumenta o déficit. (Quanto à não aprovação da reforma com o presidente Michel Temer), havia uma situação incontrolável no Rio. Por isso, o governo decidiu dar prioridade para intervir na segurança lá e tornou isso mais importante. Mas reforma é prioridade. Temer e Maia (Rodrigo Maia, presidente da Câmara) querem aprovar antes de sair do governo, se o novo presidente assim o desejar.
Estadão – Como resolver a dívida dos Estados?
Camargo – O problema dos Estados é mais grave. O Rio entrou no regime (de recuperação fiscal). E aí a Alerj (Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro) aprovou aumento de salário do Judiciário, que é a parte mais privilegiada do setor público em salário. Ele (Estado) está prestes a ser expulso (do regime de recuperação) porque não permitia o aumento. Minha avaliação é que o regime vai continuar como está. Os Estados têm de fazer o ajuste para entrar no regime. Porque o governo federal também não tem dinheiro. Temos de resolver o problema da previdência dos funcionários públicos estaduais. É fundamental uma reforma nisto.
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Estadão – E o reajuste salarial de funcionários públicos?
Camargo – Temer não conseguiu aprovar o adiamento do reajuste salarial dos funcionários públicos no Congresso. Minha avaliação é que os funcionários públicos têm uma média muito acima da média dos trabalhadores. Todos os trabalhadores sofrem muito com a crise. Os funcionários públicos têm de dar um pouco desta cota. Temos de fazer um congelamento (dos salários), por quatro anos, eu diria. Não há uma decisão ainda na chapa, mas esta é minha avaliação.
Estadão – Quão factível é alcançar a meta de Meirelles de criar 10 milhões de empregos em quatro anos e de crescer 4%?
Camargo – Acabou o dinheiro. Se você quiser ter investimento, vai ter vir do setor privado. A ideia de atração de investimento está diretamente ligada com o nosso projeto de infraestrutura. A ideia é simplificar o processo de concessões. Fazer autorizações, uma forma mais simples que autoriza o setor privado a investir. O País tem condições, sim, de, uma vez estabilizado, atrair investimento privado para gerar, não sei se 10 milhões de empregos, mas uma quantidade suficiente que vai resolver o problema do desemprego no médio prazo. Em 2017, a economia cresceu 1,1% e foram gerados 1,851 milhão de ocupações no Brasil. Isso inclui trabalho com carteira, sem carteira e por conta própria. Se no ano passado foi possível isso, acho que, se conseguirmos crescer 3,5%, que é o nosso objetivo, vamos gerar 10 milhões de ocupações, não necessariamente empregos formais. No Brasil, é comum as pessoas acharem que, para criar emprego bom, é preciso proibir a geração de emprego ruim. A Ásia já mostrou que é exatamente o contrário: para criar emprego bom, primeiro você precisa gerar emprego ruim. E depois esse emprego se transforma num emprego bom.
Estadão – O que é emprego ruim?
Camargo – Emprego em tempo parcial, sem carteira. Se você proíbe a geração desse emprego, diminui a demanda que gera novos empregos. A reforma trabalhista reforça esse negócio.
Estadão – A reforma trabalhista como foi feita é suficiente? Seriam necessários novos ajustes?
Camargo – Não acho que ela é suficiente, acho que ela é ótima. Fez coisas fundamentais, como dar opções de tipos de contrato, diminuir a incerteza jurídica e fazer o contrato de trabalho valer mais do que valia antes.
Estadão – Como o teto de gastos contribui para o equilíbrio financeiro?
Camargo – A emenda do teto foi fundamental. Ela cria um horizonte em relação à dívida pública. Até a aprovação, qualquer pessoa que propusesse um aumento de gasto público não dizia de onde vinha o dinheiro. Agora, ele precisa dizer. A discussão do Orçamento vai ser sobre prioridades. Construção de creches ou aumento de salário para funcionário público?
Estadão – Há possibilidade de flexibilização do teto dos gastos?
Camargo – O teto só é sustentável com a reforma da Previdência. Caso contrário, em 20 anos, o gasto público vai ser só com Previdência. Como o gasto público do governo federal passou de 20% para 35% do PIB, excluindo-se os juros, o teto tem de ser rígido, para não aumentar gasto.
Estadão – Qual a proposta de reforma para o sistema tributário?
Camargo – A proposta é transformar cinco impostos indiretos em um imposto. O problema é que nos Estados há incentivos fiscais via ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços). Se a reforma for muito rápida, tem de fazer um fundo para compensar essa questão dos Estados. O período da adaptação tem de ser longo. De 50 anos, por exemplo. Nesse tempo, esses incentivos dados no passado vão acabando ao longo do tempo de forma que você introduz o Imposto sobre Valor Adicionado (IVA).
Estadão – Qual a sua opinião sobre impostos sobre lucros e dividendos?
Camargo – Tem de diminuir o imposto sobre lucro das empresas. Taxar dividendo e taxar pouco o lucro que vai gerar incentivo para ter investimento e o Brasil crescer. Simples e MEI vão ter de mudar a tributação também.
Estadão – O que significa acelerar as privatizações num eventual governo Meirelles?
Camargo – Queremos privatizar toda a área de refino, oleoduto e gasoduto da Petrobrás. Que ela fique só com a extração. A ideia é continuar a privatização da Eletrobrás e privatizar ou fechar empresas que dependam só do Estado. Não vamos resolver o problema fiscal com isso, mas é fundamental do ponto de vista de eficiência. Quanto a bancos, os dois maiores do País têm um custo mais elevado. Aí o setor privado acompanha os preços do setor público. Se você vender os bancos públicos, pode ser um oligopólio privado. O que se pode fazer é pulverizar o capital da Caixa.
Fonte: “O Estado de S. Paulo”