Sob o olhar de especialistas, há enormes rupturas na ordem econômica mundial. A economia global perdeu suas âncoras monetárias. Há uma incipiente e perversa modalidade inflacionária sob a forma de pressões de custo. Os financistas anglo- saxões insistem em pedalar sistemas financeiros como bicicletas. Os social-democratas europeus foram expulsos do paraíso por seus excessos. O capitalismo selvagem dos comunistas chineses deflagrou uma guerra mundial por empregos. E o mergulho de três bilhões de eurasianos nos mercados de trabalho, permitindo sua inclusão simultânea nos mercados globais de consumo de energia, comida e insumos básicos, disparou a recente e brutal elevação dos preços dos recursos naturais em relação aos salários em todo o mundo.
“A comida e a energia lideram as elevações de preços. A causa dessas altas de preços sempre foi a melhoria dos padrões de vida. Essas melhores condições materiais ocorrem em meio a expansões dos mercados de trabalho. Essas grandes ondas de elevações de preços foram sempre marcadas pela prosperidade das massas”, registra Hackett Fischer, em “As grandes ondas de preços e o ritmo da História” (1996). Não há qualquer mistério: bilhões de indivíduos agora “incluídos” na economia global estão ao mesmo tempo derrubando salários e fazendo disparar os preços de alimentos e recursos naturais.
Segundo Fischer, as perspectivas de desordem política e distúrbios sociais são um desdobramento inevitável desses aumentos extraordinários nos preços da comida e da energia. O filósofo inglês John Gray alerta em “Cachorros de palha” (2002): “O mundo globalizado é uma construção delicada. Uma população incomparavelmente maior que em qualquer outra época depende de rede de suprimentos muito ampla. Se quiser entender as guerras do século XXI, esqueça os conflitos ideológicos do século XX. Em vez disso, leia Malthus. As guerras futuras serão guerras por recursos naturais.”
Os distúrbios políticos no mundo árabe, do Norte da África ao Oriente Médio, são fenômenos complexos. São tempos revolucionários, vieram para ficar. O preço da comida e as novas tecnologias derrubam ditadores em série. Só não sabemos o que virá. Há o perigo de uma feroz disputa por petróleo. E também da ascensão política do fundamentalismo islâmico. Mas há esperança: a oportunidade de enorme avanço da região rumo à Grande Sociedade Aberta, da democracia e dos mercados.
Fonte: O Globo, 28/02/2011
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