É dramática a situação de pacientes vítimas de câncer. As cenas são tristes e dolorosas, visto que a extração do tumor já é um processo bastante delicado, seguida do tratamento com quimioterapia, no qual alguns efeitos colaterais podem ser observados, sendo a queda de cabelos o principal deles. Não faz sentido culpar a quimioterapia pela queda dos cabelos, pois ela foi necessária devido a uma doença grave, que é o câncer.
A imagem do parágrafo anterior é bastante forte, mas é uma representação da atual realidade brasileira. Em 2016, o governo propôs e o Congresso Nacional aprovou a Emenda Constitucional 95, conhecida como Teto de Gastos. A regra é simples: o total de gastos primários do governo federal não pode superar o total do ano anterior, corrigido pela inflação.
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A medida serviu como uma âncora, para dar previsibilidade a respeito da evolução dos gastos públicos brasileiros, consequentemente mirando uma redução do endividamento público no longo-prazo. Algo necessário, tendo em vista o crescimento do endividamento público brasileiro, que pode resultar em insolvência do Estado brasileiro, não conseguindo arcar com os pagamentos da dívida. Tal cenário é representado no gráfico abaixo.
A medida tem duração prevista de 10 anos, podendo ser renovada por mais 10 pelo governo. Portanto, trata-se de um ajuste fiscal gradual, diluído ao longo de uma década, diferente daquele implementado na Espanha em 2012, que reduziu os gastos do governo em relação ao PIB em quase três pontos percentuais em apenas um ano, conforme o gráfico abaixo.
Com o Teto dos Gastos, tornou-se evidente que o Orçamento Público tem restrições e não é possível alocar todos os gastos pretendidos dentro dele. Com isso, pulularam estudos mostrando o quão trágico seria o Teto de Gastos para a Ciência e Tecnologia, Educação e Saúde, sempre vinculando uma piora dos indicadores dessas áreas à existência do Teto de Gastos.
Entretanto, estes estudos não atacam o problema real do gasto público brasileiro: as despesas com Previdência Social e Folha de Pagamentos do governo federal. Tais gastos atingiram 70% das despesas primárias do governo federal ao fim de 2017. Além disso, são gastos que apresentam crescimento real seguidamente, ou seja, o aumento deles supera a variação da inflação.
Dessa forma, para que o Teto de Gastos seja cumprido, outras áreas acabam sofrendo cortes em suas ações e programas, a exemplo da educação e da saúde. Mas a doença dos gastos públicos do governo federal, é provocada pelo crescimento das despesas com Previdência Social e Folha de Pagamentos, e não pelo Teto de Gastos. Este é o remédio, que garante a realização de um ajuste fiscal, diluído nos próximos 10 anos, fazendo com que a dívida pública se estabilize e passe a cair, sendo sustentável seu pagamento nos próximos anos.
Se a preocupação for, de fato, com as próximas gerações e a possibilidade de realização de investimentos públicos em áreas importantes, as partes interessadas precisam defender reformas que controlem o crescimento dos gastos, como a reforma da Previdência e a reestruturação das carreiras de funcionários públicos federais. Do contrário, cobrar a revogação pura e simples do Teto de Gastos é uma tremenda irresponsabilidade, que pode mergulhar o país numa espiral de endividamento, soterrando com qualquer esperança de futuro para as próximas gerações.
Fonte: “Terraço Econômico”, 29/07/2018