Sempre quando chegamos a janeiro acontece nos confins dos Alpes suíços, em Davos, o Fórum Econômico Mundial (FEM). É o momento em que grandes agentes econômicos, formadores de opinião, artistas e intelectuais se encontram para debater algum tema de relevância sobre a economia mundial, meio ambiente, sustentabilidade, etc.
Instituição sem fins lucrativos, criada em 1971 por Klaus Shwab, o FEM ganhou a dimensão que tem hoje, nos anos 90, com a participação de grandes líderes políticos, além de empresários, acadêmicos, jornalistas, etc. É um dos mais importantes think tanks globais, uma verdadeira “fábrica de ideias”. É nele que os grandes líderes emergentes se mostram ao mundo, dão seu “cartão de visita” aos grandes investidores, mostram a que vieram.
Neste ano, com a ausência de vários líderes (Donald Trump, Emmanuel Macron, Thereza May, Angela Merkel, etc), o principal foi Jair Bolsonaro, presidente do Brasil. Foi dele o discurso inaugural, muito criticado pela sua curta duração e inócuo conteúdo. Bolsonaro, aliás, teve uma participação bem tímida no evento. Quem aproveitou para passar seu recado, e o fez com maestria, foi Paulo Guedes. Muito contundente nas suas explanações, se encontrou com os principais atores globais e não parou quieto um instante. Na verdade, foram dele as principais intervenções sobre a pesada agenda econômica a ser enfrentada pelo País neste ciclo de poder de Bolsonaro.
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Dentre as tantas intervenções, defendeu um novo rearranjo tributário para o País, pela redução da carga fiscal nas empresas, de 34% para 15%, compensada pelo aumento da taxação sobre ganhos de capital (JCP) e dividendos. Falou também sobre desoneração da folha de pagamentos, revisão de impostos patronais e possível elevação de alíquota do IOF.
No tema “reforma da Previdência”, disse que era prioridade número um e defendeu a unificação do regime, entre setor privado, servidores públicos e militares. Estes, aliás, acabaram como o “ponto fora da curva”, por serem o principal foco de desequilíbrio do setor público. Vários pontos de fricção vêm acontecendo entre o ministro, o presidente e vários militares de alta patente.
Os militares consideram esta corporação “especial”, não passível de participar da reforma. Achamos sim que eles devem participar. Uma hipótese colocada foi elevar o tempo para aposentaria, de 30 anos para 35, como defendido pelo vice-presidente General Mourão. Outros acham que o governo tem que anunciar a reforma dos servidores e do setor privado numa primeira etapa, para depois preparar a segunda, dos militares. Ressaltemos que esta primeira etapa deve começar a ser discutida quando divulgada no Plenário da Câmara, talvez a partir do dia 7 de fevereiro, depois da cirurgia do presidente.
A impressão que se tem é que os militares, e até o presidente, querem ganhar tempo para tentar “refluir” esta segunda etapa, “empurrando-a com a barriga” até cair no esquecimento. Na primeira deve vir a idade mínima, o tempo de transição (para a idade e a mudança de regime, de repartição para capitalização), dentre outras medidas.
Paulo Guedes também foi muito direto ao prometer “zerar o déficit público ainda neste ano”, usando recursos das privatizações, calculados em R$ 75 bilhões, retorno de recursos do BNDES para o Tesouro, forte contingenciamento de despesas e alguma alteração na carga fiscal. Não descartou lutar para tirar a estabilidade dos servidores públicos e até um “plano B”, para caso a reforma da Previdência empaque no Congresso. Sobre esta hipótese, um fato negativo vem sendo a repercussão das investigações do Coaf em torno das transações e operações financeiras do senador Flavio Bolsonaro. Sobre isso, Bolsonaro já disse estarem usando o filho para atingir a ele, presidente.
No geral, é opinião nossa que foi Guedes quem salvou esta viagem a Davos, nutrindo de boas notícias empresários e possíveis interessados em investir no Brasil.
Em paralelo, no FEM o que se viu foi o mundo mais cauteloso, diante do impasse comercial entre Trump e os chineses, o Brexit também sob impasse e o FMI colocando suas “barbas de molho” sobre o crescimento global. Para Christine Lagarde, chairman da instituição e seu economista-chefe (saindo Maurice Obsfield, entrando Githa Gobinath), o mundo deve ingressar numa fase de incertezas, perdendo um pouco da “tração”.
O crescimento, antes previsto em 3,7% para este ano, deve desacelerar a 3,5% e 3,6% no ano que vem. Sobre o Brasil, um “voto de confiança” foi dado, com a revisão do crescimento de 2,4% a 2,5% neste ano, devendo desacelerar a 2,2% no ano que vem. A China deve seguir esta toada, crescendo menos, 6,2%, ao contrário da Índia, 7,5%.