Com Abel Holtz
Segundo a Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace), o consumidor de energia elétrica no Brasil deverá pagar pelo menos R$ 6 bilhões além do previsto, nos próximos quatro anos, para bancar a operação das térmicas poluentes movidas a óleo diesel na Amazônia. Ou seja, a lei premia a irracionalidade econômica, transformando um incentivo que tinha data marcada para terminar numa compulsória obrigação para toda a sociedade brasileira.
O setor elétrico foi transformado, já há algum tempo, num coletor de impostos cuja lógica absurda está levando à perda de produtividade da nossa indústria e transformando o nosso país num simples exportador de commodities e importador de bens e equipamentos. Atualmente exportamos minério de ferro e já importamos trilhos da China.
A incidência tributária se dá até sobre Encargos de Segurança do Sistema, destinados ao despacho de térmicas fora da ordem do mérito econômico e da inacreditável manutenção do subsídio da Conta de Consumo de Combustíveis (CCC), que deveria acabar em 2012(?) e agora foi tornado permanente pela Lei n.º 12.111. Essa lei estende os benefícios e encargos tributários suportados pelo consumidor de energia elétrica a todo o custo de geração e investimento dos Sistemas Isolados – que, por mais incrível que possa parecer, compensa perdas do ICMS aos Estados do Norte, que foram agora beneficiados com a entronização da energia de base hidráulica em substituição à energia de base fóssil.
A sociedade brasileira, que foi onerada pela compra de combustíveis fósseis para uso nas termoelétricas do Norte, será agora definitivamente compelida a suportar os desajustes fiscais de Estados beneficiados por uma energia elétrica mais barata e menos poluente. Ou seja, foi consagrado, definitivamente, o atraso tecnológico por meio de contas públicas geridas de forma particular e única, que tornam permanente um ônus para todos os brasileiros.
Neste contexto de irracionalidade, o governo, para tornar o leilão de Belo Monte viável, resolveu conceder benesses para que uma tarifa irreal fosse tornada uma verdade insofismável. Sintomaticamente, o subsídio embutido no financiamento de longo prazo alcançou valor similar àquele da operação das térmicas poluentes, acima referido, conforme condições anunciadas pelo BNDES.
O argumento principal brandido pelo governo foi atingir a chamada modicidade tarifária. Não resta dúvida de que toda a sociedade brasileira é a favor da modicidade tarifária, e o governo tem obrigação de licitar os projetos com essa característica. É o caso de projetos hidrelétricos que tenham uma escala produtiva que assegure o mais baixo custo do MWh gerado e comercializado.
No caso de Belo Monte, a modicidade foi contraposta à atratividade do projeto, inibindo a presença de grandes grupos empresariais privados e com isso aumentando a necessidade de aportes financeiros do governo. Teria sido melhor buscar a modicidade tarifária, sem contrapô-la à atratividade do projeto, por meio da desoneração da pesada cadeia tributária da energia elétrica gerada no País, hoje de 45,8% no preço da energia elétrica para o consumidor.
Como se vê, poderíamos alcançar a modicidade tarifária em Belo Monte se houvesse mais racionalismo no longo prazo e criatividade nas ações governamentais, que poderiam privilegiar a atratividade de um projeto em sua plataforma produtiva de energia elétrica, desonerando-o dos pesados tributos e abrindo um horizonte claro para outros projetos hidrelétricos na região onde se implantarão cerca de 40 mil MW, conforme o Plano Decenal de Geração Hidrelétrica (EPE 2010/2019).
O grito de alerta já foi dado e, no momento em que as candidaturas à liderança de um novo governo se colocam, exige-se um posicionamento consentâneo sobre a matéria de exorbitar com tributos e encargos a cadeia produtiva da energia elétrica e, consequentemente, o seu preço para o consumidor em prejuízo para o contribuinte.
Fonte: Jornal “O Estado de S.Paulo” – 16/06/10
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