Fiéis ao espírito do aniversário do partido, economistas do PT propuseram um programa de emergência que prega a volta da política econômica aos padrões que vigoraram no governo Lula. Seria ótimo se fosse verdade.
Entre 2003 e 2010, o superavit primário recorrente atingiu, em média, 2,6% do PIB, considerando o afrouxamento da política fiscal em 2009 e 2010 (nos demais anos, a média foi 3,2% do PIB). Já o desvio médio da inflação com respeito à meta foi inferior a 0,7% por ano, cerca de um quarto do observado no governo Dilma, refletindo tanto o melhor desempenho fiscal como a autonomia do BC.
Aquele período (ao menos até 2006) foi também marcado por reformas: a criação do crédito consignado e a reabilitação das garantias no crédito habitacional, assim como a nova Lei de Falências. Soma-se a isso a reforma previdenciária que elevou a idade mínima para aposentadorias dos servidores e criou a possibilidade de fundos de pensão para o funcionalismo.
Por fim, na política social tivemos a fusão dos vários programas de transferência no Bolsa Família, inicialmente execrado pelos economistas do partido, como Maria da Conceição Tavares, que classificou um de seus defensores, Marcos Lisboa, como “débil mental”, sem, diga-se, nenhum protesto de nossos sempre tão sensíveis “keynesianos de quermesse”.
Infelizmente, porém, as propostas petistas não trarão de volta a política econômica do governo Lula, mas sim o que preconizavam antes de 2003 e que veio a se tornar a tal “Nova Matriz Econômica” (NME), já no primeiro governo Dilma.
Redução na marra da taxa de juros (a despeito da inflação crescente), “revitalização” do PAC e aumento do gasto público são todos elementos do trivial requentado da NME. A esses se somam elevação de impostos e, coroando a obra, a proposta de utilização de parte das reservas internacionais para financiar novos gastos.
Esta última, em particular, promete ser especialmente danosa. Equivale, em última análise, a vender as joias da família para bancar novos gastos, em vez de aproveitá-las para reduzir o endividamento. No fim da história, sobrariam mais gastos e dívida mais alta, acompanhada de crescente fragilidade externa resultante de um colchão menor de proteção em moeda forte.
O desastre de 2011-2014 –estagnação seguida de recessão, inflação alta, desequilíbrio externo e redução dramática do ritmo de crescimento da produtividade– deveria bastar para convencer qualquer um de que a retomada da NME, vitaminada por atrocidades adicionais, nos levaria de vez ao fundo do poço.
Até o ministro da Fazenda, um de seus criadores, ainda hesita em levá-la às últimas consequências, mas isso não é suficiente para os seguidores do “princípio da contraindução” (segundo o qual o fracasso de uma experiência, em vez de resultar na rejeição da hipótese, torna-se pretexto para nova tentativa, na esperança que dessa vez funcione) reconhecerem os problemas dela originados.
Com o perdão do clichê, não aprenderam nada, não esqueceram nada. Em razão disso, às vezes me pego torcendo para que executem o que prometem para ver se novo fracasso retumbante lhes ensinaria algo de útil; mas depois me lembro de que tratamos de gente imune ao aprendizado. Seria um enorme custo sem sequer esse modesto benefício.
Fonte: “Folha de S. Paulo”, 2 de março de 2016.
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