Tivemos uma semana bastante agitada, que culmina nesta sexta (20) com a posse do presidente Trump nos EUA. No Brasil, as rebeliões em presídios prosseguiram, com mortes e cenas de horror.
A posse de Trump preocupa não apenas por aquilo que ele disse na campanha, eventualmente parte de uma estratégia de marketing para atingir corações e mentes de segmentos da população americana sem voz, mas com voto, perplexos com a perda de emprego e renda por conta da automação. O que mais chama a atenção é que essas pessoas ganharam vida e ativismo num discurso recheado de preconceitos em relação ao “outro”, percebido como estrangeiro, intelectual, associado ao “politicamente correto” e dissociado dos valores fundadores da nação.
Esse contexto assemelha-se, em alguns aspectos, ao que foi descrito com maestria pelo historiador Robert Paxton, da Universidade de Columbia, no seu “The Anatomy of Fascism”, ao falar do fenômeno surgido no período entre guerras, fase em que vozes semelhantes se levantaram, com consequências traumáticas.
O problema dos presídios, por outro lado, revela uma face feia de outros segmentos da população que querem se ver livres do crime não por uma questão de justiça, pelo cumprimento de penas ou por uma eventual recuperação de criminosos, mas por vingança contra quem os cometeu. Nesse sentido, o criminoso é percebido como monstro, cuja eliminação deveria ser celebrada.
O que une essas duas notícias aparentemente dissociadas? Na pauta dos jornais esta semana, outra matéria, desta vez sobre o Enem, serve de amálgama: embora a nota média do exame tenha subido em matemática e linguagens, só 7,3% dos alunos atingem o aprendizado adequado em matemática. Ou seja, mais uma evidência aparece de que os alunos não estão aprendendo.
Se não aprendem, o futuro reservado a eles não pode ser promissor, certamente não num contexto em que se demandam competências de nível superior para empregabilidade ou empreendedorismo. A alternativa poderia ser o crime? Não necessariamente, mas os caminhos do sucesso se fecham, e a questão permanece em aberto.
Mas como isso se relaciona à posse de Trump? Ora, a educação básica nos Estados Unidos tampouco anda bem, com índices inaceitáveis e estagnados no PISA de 2015 e taxas ainda elevadas de abandono escolar. Ocorre que lá o mundo do trabalho mudou bem mais rapidamente do que aqui, e o desemprego e a renda não mais de classe média atingiram em cheio quem ficou com baixa escolaridade.
Não por acaso, a demografia do voto mostra que o que faltou foi coragem para fazer as mudanças mais importantes em educação.
Fonte: Folha de S.Paulo, 20/01/2017.
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