A embaixada do Brasil em Honduras abrigou o senhor Manuel Zelaya, presidente daquela República, depois de ter sido afastado do governo e expulso do país por haver tentado introduzir a reeleição, vedada terminantemente por sua Constituição, em cláusula imutável. Nela se instalara de maneira estranha e pouco protocolar. Entrou porque chegou e chegou sem ser esperado. Depois de nela aposentado, a reação do governo local não se fez esperar e a sede da nossa representação ficou ilhada, materialmente cercada, com alguns ingredientes nada diplomáticos.
O novo morador da casa passou a usar seus recursos para dirigir-se pelo rádio aos seus amigos políticos. O próprio encarregado de negócios brasileiro estaria impedido de entrar e sair da sede da nossa representação que, como é sabido, e enquanto tal, é considerada território nacional. A novela internacional dura alguns dias e está a evidenciar a anomalia da situação e, embora as versões possam ser desencontradas, os fatos centrais são certos e notórios.
Tem havido um pouco de tudo, o governo local marcou prazo para o Brasil evacuar a sua embaixada dos novos hóspedes, e o presidente Luiz Inácio respondeu não aceitar intimações de golpistas… Tudo no mais refinado estilo diplomático. Ainda bem que, agora, parece que surgiram sinais indicativos de tratamento civilizado, e nesse sentido é de ser ressaltado o papel da Organização dos Estados Americanos.
O ministro das Relações Exteriores, no Senado, declarou que o Brasil negara transporte aéreo solicitado pelos atuais moradores da nossa embaixada em Honduras, mas o fato é que eles chegaram até a sua porta e por ela lhe tiveram acesso. E aqui se insere um fato de particular importância. Logo que isto ocorreu, pessoa de outras bandas, por sua iniciativa e sem meias palavras, declarou à imprensa conhecer a trama secreta da acidentada migração e, sem qualquer recato, se disse colaborador do êxito, o coronel Chávez, o mais antigo e chegado hermano do nosso presidente. Suas bufonarias são conhecidas aqui e além-mar. Não tenho elementos para dizer que as assertivas do caudilho venezuelano seriam meras gabolices ou declarações objetivas. O fato é que a caravana do senhor Zelaya, de mais de 20 pessoas, não chegou à embaixada brasileira em Tegucigalpa por inspiração do anjo da guarda, nem seria obra de generoso missionário, mas de alguém que tivesse recursos hábeis para a empresa, que não estariam ao alcance de qualquer mortal.
Não desejo tirar conclusões definitivas a respeito do episódio, mas tudo indica que a bem-sucedida locomoção do senhor Zelaya até a embaixada brasileira em Honduras contou com ajuda conspícua e ninguém contestou a versão do senhor Chávez, que depois ficou recatado. Este o fato que parece plausível, dado que para a empreitada era necessário alguém de alto coturno. De resto, é de lembrar-se que na América Latina há um sota especializado. Pois é essa personagem, que tem o Estado da Venezuela nas mãos, que o honrado presidente Luiz Inácio da Silva quer introduzir no Mercosul, como se fosse o elemento de ponderação e equilíbrio de que estaria a carecer a penosa experiência que vem sendo feita entre países sul-americanos. Com as devidas vênias a tão alta autoridade, a ideia não me parece a mais louvável e oportuna. Aliás, a comissão do Senado opinou contrariamente ao ingresso malfadado, e o líder do governo logo cuidou de obstar o desfecho.
(Zero Hora, 05/10/2009)
Estando fora do Brasil nos últimos 25 anos, mas não (totalmente) alheio ao que se passa, tenho visto algumas figuras, heróis, da minha geração seguirem tendências antes impensadas. Claro, devo pesar na balança que nos meus idos 20 anos eu era (éramos) um tanto ingênuos e não enxergávamos debaixo da máscara de alguns. Assim foi quando vi ressurgir José Serra – último presidente da Unes depois do golpe de 1° de abril de ’64. Foi uma guinada à direita ou já éra direitista antes? Aécio Neves no PSDB? É ele mesmo o neto de Tancredo? e o filho do Teotônio Vilela, fundador do PSDB?? Hoje, para engrossar a lista percebo – será? – Paulo Brossard (é ele mesmo?)… Sem saber ao certo qual sua orientação politico-social de momento, me espanta perceber sua posição contrária à democracia (verdadeira, e não esta “mascarada” imposta pelos EUA) tão afrontada na Honduras por um grupelho de extrema direita, que como a direita em geral, tem poder financeiro, da midia e militar e é classista. E não importa quem dá golpe em quem, seja direita ou esquerda, é anti-democrático. Ditaduras abaixo por revoluções populares ou em prol do povo são atos democráticos. Golpes contra governo democrático, com pretexto de “salvar” democracia, é golpe de estado puro e simples, é golpe contra democracia.
Me toma a incerteza, sr. Brossard – antes eu o tinha como um bastião da democracia, hoje tenho minhas dúvidas, ainda que ninguém (nem o senhor, certamente) se importa com minhas dúvidas