O cenário do calote preocupa, apesar de a inadimplência do consumidor com os bancos ter se estabilizado em 4,4% em agosto, o último dado disponível, segundo relatório de crédito do Banco Central. Hoje quase a metade dos devedores (47,3%) pretende liquidar as pendências só no ano que vem e um em cada cinco brasileiros inadimplentes fez novas dívidas sem ter quitado débitos anteriores, o que provoca um efeito “bola de neve” no calote.
Os resultados fazem parte de uma pesquisa feita este mês com 110 mil devedores do banco de dados das 16 maiores empresas de cobrança do país, reunidas no Instituto Gestão de Excelência Operacional em Cobrança (Geoc). A pesquisa será apresentada nesta terça-feira, em São Paulo, no 10.º Congresso Nacional de Crédito e Cobrança, promovido pelo instituto.
“O cenário piorou, apesar de a inadimplência ter ficado estável”, afirma Jefferson Frauches Viana, diretor do Geoc. Ele explica que, por causa da Copa, 2014 não foi um ano bom para a recuperação do crédito. “O primeiro semestre foi terrível. O índice de sucesso nas renegociações nos meses de junho e julho ficou entre 30% e 35% abaixo do resultado do ano passado.”
Além do evento esportivo, o avanço da inflação corroeu o poder de compra do consumidor e afetou o orçamento familiar. Para 41,2% dos entrevistados, este ano está pior do que 2013 e 32,6% dos brasileiros assumiram mais dívidas do que no ano anterior. Também houve um aumento no número de devedores e isso fica claro em outro resultado da pesquisa enfatizado por Viana: metade dos entrevistados informou que conhece mais de quatro pessoas com dívidas em atraso.
O aumento do endividamento e da inadimplência ocorreu não só pelo avanço do número de dívidas, mas também pelo “empréstimo do nome”. Mais da metade dos entrevistados (55%) informou já ter emprestado o seu nome para parentes e amigos que estavam impossibilitados de obter crédito e, destes, 76% ficaram com o nome “sujo” pelo não pagamento da dívida do seu parente ou amigo.
Saídas
Para equilibrar as despesas com as receitas, os inadimplentes estão recorrendo a várias saídas. De acordo com a enquete, 53,4% estão comprando menos itens supérfluos e 40,5% reduziram os gastos com lazer, como comer fora e ir ao cinema.
A “motogirl” e técnica em telecomunicações Mariana Miradouro Barboza, de 35 anos, por exemplo, conta que chega a atrasar a prestação do financiamento do carro, que tem uma taxa de juros menor, para compatibilizar suas despesas com as suas receitas. Ela também “joga” com as contas de telefone celular e do radiocomunicador para conseguir equilibrar o orçamento. “2014 está sendo um ano difícil: janeiro e fevereiro não teve muito trabalho de entregas, depois veio a Copa e os negócios pararam. As coisas só começaram a esquentar depois da Copa do Mundo.”
Mariana diz que hoje não tem o seu nome negativado, mas no passado recente a sua situação estava pior. “Cheguei a ter mais de seis pendências e dez empréstimos”, conta. Ela diz que se descontrolou e fez dívidas para cobrir outras dívidas. Isso foi possível porque, nos cartões de crédito e nos cartões de loja, o crédito é pré-aprovado e a liberação do dinheiro ocorre automaticamente, sem necessidade de consultar a lista de devedores com pendências.
“Hoje não estou confortável, mas minha situação melhorou.” No passado, ela teve pendências que somavam R$ 20 mil para uma renda, na época, de R$ 1,8 mil. Atualmente, entre o emprego fixo e serviços de entrega, ela tira R$ 5 mil por mês.
Fonte: O Estado de S.Paulo.
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