“Não me importo de ganhar presente atrasado. Eu quero que o Brasil me dê de presente a Dilma presidente do Brasil”, conclamou Lula, do alto de um palanque, dias atrás. Não foi um gesto fortuito. Antes, a Executiva do PT definira a campanha “Dê a vitória de Dilma de presente a Lula”. Aos 65 anos, a figura que deixa o Planalto cumpre uma antiga profecia do general Golbery do Couto e Silva. O “mago” da ditadura militar enxergara no sindicalista em ascensão o “homem que destruirá a esquerda no Brasil”. Quando o PT trata a Presidência da República como uma oferenda pessoal, nada resta de aproveitável no maior partido de esquerda do País.
Lula vive a sua quarta encarnação. Ele foi o expoente do novo movimento sindical aos 30, o líder de um partido de massas aos 40, o presidente salvacionista aos 60. Agora, aos 65, virou mito. O mito, contudo, é feito de papel. Ele vive nos ensaios dos intelectuais que se rebaixam voluntariamente à condição de áulicos e nos artigos de jornalistas seduzidos pelas aparências ou atraídos pelas luzes do poder. Todavia ele só existe na consciência dos brasileiros como fenômeno marginal. Daqui a três dias, Lula pode até mesmo ficar sem seu almejado carrinho de rolimã. A mera existência da hipótese improvável de derrota de Dilma evidencia a natureza fraudulenta da mitificação que está em curso.
“É a economia, estúpido!”, escreveu James Carville, o estrategista eleitoral de Bill Clinton, num cartaz pendurado na sede da campanha, em 1992. George H. Bush, o pai, disputava a reeleição cercado pela auréola do triunfo na primeira Guerra do Golfo, mas o país submergia na recessão. Clinton venceu, insistindo na tecla da economia. Por que Dilma não venceu no primeiro turno, se a economia avança em desabalada carreira, num ritmo alucinante propiciado pelo crédito farto e pelos fluxos especulativos de investimentos estrangeiros?
A pergunta deve ser esclarecida. Lula abordou a sua sucessão como uma campanha de reeleição. No Brasil, como na América Latina em geral, o instituto da reeleição tende a converter o Estado numa máquina partidária. A Presidência, os Ministérios, as empresas estatais e as centrais sindicais neopelegas foram mobilizadas para assegurar o triunfo da candidata oficial. Nessas condições, por que a “mulher de Lula”, o pseudônimo do mito vivo, não conseguiu reproduzir as performances de Eduardo Campos, em Pernambuco, Jaques Wagner, na Bahia, Sérgio Cabral, no Rio de Janeiro, Antonio Anastasia, em Minas Gerais, ou Geraldo Alckmin, em São Paulo?
“Há três tipos de mentiras – mentiras, mentiras abomináveis e estatísticas”, teria dito certa vez Benjamin Disraeli. Os institutos de pesquisa registram uma taxa de aprovação de Lula em torno de 80%. Cerca de dois terços da aprovação recordista se originam de indivíduos que conferem ao presidente a avaliação “bom”, não “ótimo”. Nesse grupo, uma maioria não votou na “mulher de Lula” no primeiro turno. Mas a produção intelectual do mito, a fim de fabricar uma “mentira abominável”, opera exclusivamente com a taxa agregada. Há muito mais que ingenuidade no curioso procedimento.
As águas que confluem para o rio da mitificação de Lula partem de dois tributários principais, além de pequenas nascentes poluídas pelos patrocínios oriundos do Ministério da Verdade Oficial, de Franklin Martins. O primeiro tributário escorre pela vertente dos intelectuais de esquerda, que renunciaram às suas convicções básicas, abdicaram da meta de reformas estruturantes e desistiram de reivindicar a universalização efetiva dos direitos sociais. Eles retrocederam à trincheira de um antiamericanismo primitivo e, ecoando uma melodia tão antiga quanto anacrônica, celebram a imagem de um líder salvacionista que fala ao povo por cima das instituições da democracia. Nesse conjunto, uma corrente mais nostálgica, que se pretende realista, enxerga em Lula a derradeira boia de salvação para a ditadura castrista em Cuba. A Marilena Chaui pós-mensalão, transfigurada em porta-estandarte do “controle social da mídia”, é a síntese possível do lulismo dos intelectuais.
“As pessoas ricas foram as que mais ganharam dinheiro no meu governo”, urrou Lula num comício eleitoral em Belo Horizonte, pronunciando um diagnóstico inquestionável. O segundo tributário da mitificação desce da vertente de uma elite empresarial avessa à concorrência, que prospera no ecossistema de negócios configurado pelo BNDES e pelos fundos de pensão. Essa corrente identifica no lulismo o impulso de restauração de um modelo econômico fundado na aliança entre o Estado e o grande capital. Os empresários da Abimaq divulgaram um manifesto em defesa do BNDES, enquanto Eike Batista, um sócio do banco estatal, o cobria de elogios. Na noite do primeiro turno, os analistas financeiros quase vestiram luto fechado. Tais figuras, tanto quanto os controladores da Oi e os proprietários da Odebrecht, representam o lulismo da elite econômica.
O mito ficou nu no primeiro turno. Todos os indícios sugerem que o aguardado triunfo de Dilma foi frustrado exatamente por Lula – que, na sequência do escândalo de Erenice Guerra, afrontou a opinião pública ao investir contra a imprensa independente. “Nem sempre é a economia, estúpido!”: os valores também contam. Naquele momento as curvas de tendências eleitorais se inverteram, expressando a resistência de mais de metade dos brasileiros ao lulismo. O jornalismo honesto deveria refletir sobre isso, antes de reproduzir as sentenças escritas pelos fabricantes de mitos.
Os mitos fundadores pertencem a um tempo anterior à História. No fundo, desde a difusão da escrita na Grécia do século 8.º a.C., só surgiram mitos de papel – isto é, frutos da obra política dos filósofos. Por definição, tais mitos estão sujeitos à desmitificação. Já é hora de submeter o mito de Lula a essa crítica esclarecedora.
Fonte: Jornal “O Estado de S. Paulo
Vai trabalhar, lulla!!!!
Caça rumo!!!
Rakel
Ver pessoas que sempre tiveram a frente da luta contra a corrupção ou mesmo sempre na luta em favor da liberdade de expressão agora sem explicação alguma aceitarem tudo isso através de um mito midiatico, deixarem para traz uma historia de lutas é triste.
Infelizmente parte de nossos intelectuais se deixaram vender ou por ilusão ou mesmo por cegueira, pois o lulismo nada mais é do que a perpetuação no poder, ou em outras palavras, o lulismo representa uma estratégia pura e simples de tomada e perpetuação do poder, não deixando a oposição obter força, graças a deus que alguns poucos, mas muito importantes conseguiram tais feitos e neste momento o presidente Lula conseguiu ver que não é jesus, mesmo usando barba.
É professor,vamos ver isso nas urnas,no próximo Domingo.
Independente que seja o vencedor,o que mas,deixa voces intelectuais (alguns o próprio autor do artigo),e ver o Brasil não quebrar nessa crise na mão de um metarlúgico.
É difícil engolir o sapo barbudo,já dizia o grande Brizola.Já pensaram agora ter que ser governado por uma mulher?Vamos esperar no Domingo.
PS.Professor,por que o senhor não comenta os escândalos de corrupção do metro de S.Paulo?
Genial, o artigo. Pena que o povo brasileiro, em sua maioria passa ao largo dessas verdades, e exatamente por essa falta de educação é que se fabricam mitos assim como lula.
Mitos? A proposta é de um projeto e não de pessoas. Não importam os candidatos; vcs se agarram a Lula e a Dilma, como se agarraram a José Dirceu. O que está em jogo é um projeto e não as vaidades de cada um. Não importa quem vai ser o candidato.
É Professor,o quê adiantou tantas mentiras,manipulaçoes e o discurso do terror?O senhor e cia(KAMEL,CIVITA,MERVAL,REINALDO,MAINARDI,ETC…),vão ter que melhorar nos argumentos,aprender jogar limpo e aprimorar o tom do assunto.
Na verdade você,intelectuais não gostam de governos populares,pois esses entendem ansia de um povo que ficou cansado de uma politica economica onde não se via uma distribuição de renda justa.O PT vai ficar por mais quatro anos,até lá aprendam fazer uma oposição mas adulta e coerente.
Cade o meu comentario?onde estar a liberdade de expressão desse site?
“Ponha-se na presidência qualquer medíocre, louco ou semi-analfabeto, e vinte e quatro horas depois a horda de aduladores estará à sua volta, brandindo o elogio como arma, convencendo-o de que é um gênio político e um grande homem, e de que tudo o que faz está certo. Em pouco tempo transforma-se um ignorante em um sábio, um louco em um gênio equilibrado, um primário em um estadista. E um homem nesta posição, empunhando as rédeas de um poder praticamente sem limites, embriagado pela bajulação, transforma-se num monstro perigoso”.
Profecias do Gal. Mourão
Nogueira , não entendo como um homem inteligente como você não consegue enxergar um enganador oportunista que se utilizou do sonho de todo sonhador “um metalúrgico-fora do jogo do sistema (presumidamente)- A ALCANÇAR O PODER institucional ” para na verdade , alcançar os seus reais objetivos :tornar-se poderoso e milionário sem mérito.E pergunto-lhe:é tão ingênuo a acreditar que um fora do sistema chegue lá sem vender a alma?
Amigo , fui por toda a minha vida como você , e consegui sair do transe ,do sonho de uma noite de verão, para sem estar mais hipnotizada, ver e constatar ,que a realidade é mais do que as sombras que se projetam .
Clamo para que acorde.
Forte abraço, Regina Helene