Quando, em 2013 ou 2014, um analista isento olhava para a economia brasileira, havia uma longa lista de preocupações que prenunciavam um fim de ciclo, gerando a perspectiva de graves problemas pela frente. Vamos à descrição delas:
*a inflação dava sinais de pressões crescentes, que estavam se avolumando;
*o quadro das contas externas ia de mal a pior, culminando no desastroso déficit em conta corrente de mais de US$ 100 bilhões em 2014;
*o desemprego estava a caminho do seu piso histórico, o que, se por um lado era uma excelente notícia, por outro, no contexto de crescimento irrisório da nossa produtividade, acarretava a clara possibilidade de a economia parar de se expandir, quando não houvesse mais mão de obra disponível crescendo ao mesmo ritmo que nos anos anteriores;
*e, last but not least, o nível dos reservatórios na Região Sudeste/Centro-Oeste, em dezembro de 2014, alcançou o assustador porcentual de 19%, lembrando que, no mesmo mês de 2000, pouco antes do racionamento de 2001, ele estava em 29%, gerando assim a possibilidade muito concreta de novo racionamento.
O que veio depois já é conhecido. A esses fantasmas que já estavam presentes se somaram posteriormente o esgarçamento da base aliada, o processo de impeachment da presidente da República, a paralisia do setor de construção na esteira do escândalo do “petrolão” e os seus desdobramentos judiciais e policiais, a aprovação das “pautas-bomba”, etc., no que poderia ser definido como um verdadeiro “inferno zodiacal”. É verdade que o fim do ciclo de crescimento de 2004/2013 poderia ser previsto em 2014 por qualquer analista não fanatizado pela causa do oficialismo tosco,mas nem o mais delirante dos críticos poderia ter previsto a catástrofe de dimensões bíblicas que acometeu a economia brasileira, com dois anos seguidos de retração do PIB da ordem de 3% a 4%.
Hoje, a caminho do segundo semestre de 2016, o que se pode tentar visualizar quando se olha através da bruma atual? Entendo que, ainda que em boa medida como efeito colateral de uma recessão pavorosa, aqui e acolá podemos encontrar elementos para um incipiente, cauteloso e moderado otimismo acerca do futuro. Listo abaixo as razões estritamente econômicas, em contraponto aos itens acima citados:
*a inflação dá sinais de começar a ceder, devendo se situar nas proximidades do teto da “banda” de 6,5% este ano e com possibilidade de convergir para a meta, se não em 2017, em 2018;
*as contas externas passaram por uma transformação que só pode ser qualificada de impressionante, com a clara possibilidade de que, na margem, passemos em breve a operar no azul, com chances de termos superávit em conta corrente em breve;
*a elevada taxa de desemprego, cuja média anual muito provavelmente ainda vai aumentar em 2017 em relação a 2016, criará um amplo espaço de expansão para a economia brasileira nos anos posteriores, similares ao resultante da elevada taxa de desemprego observada em 2003, após o que tivemos 10 anos de reduções praticamente contínuas da taxa, em um ambiente de expansão da produção e do emprego; e
*o nível de ocupação dos reservatórios da Região Sudeste/Centro-Oeste encontra-se, se não em situação completamente tranquilizadora, certamente em um ponto bem superior ao de 2014 e 2015, apontando para a possibilidade de superação do problema hídrico, que tantas preocupações gerou nos últimos dois anos. A isso se soma a possibilidade óbvia de superação da crise política de 2015/2016, caso o Senado em agosto confirme a decisão adotada em primeira instância e aprove o impeachment de Dilma Rousseff, dando ao governo Temer um horizonte de previsibilidade de pouco mais de dois anos, nos quais poderiam ser aprovadas algumas medidas importantes para o ajuste das contas públicas. É ilusório achar que isso permitirá um crescimento forte em 2017, porque o processo inicialmente será lento,mas há elementos para prever uma saída da crise em 2017 e uma boa taxa de crescimento em 2018.
Fonte: O Estado de S.Paulo, 11/06/2016.
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