Com quase sete anos do presente governo já passados, e pouco mais de um ainda pela frente, o Brasil não se tornou uma economia de primeira classe, como imagina a propaganda oficial — nem poderia mesmo se tornar, pois não houve tempo para isso. Não existe país desenvolvido com 50% da população desprovida de acesso a redes de esgoto, 70% das estradas de rodagem sem condições sequer razoáveis de tráfego, índices de qualidade educacional baixíssimos, índices de criminalidade altíssimos, irracionalidade sistêmica na administração pública e tudo o mais o que já se sabe há tanto tempo, e que há tanto tempo não muda. Mas é igualmente claro que a economia brasileira deixou o pior para trás. O pior ficou para trás quando se abandonou definitivamente, a partir dos governos Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso, nos anos 90, toda uma história de gerir a economia do país com os métodos, os processos de decisão e a atitude mental de um culto evangélico.
Veio, e ficou, a convicção de que os governos podem ter prioridades, práticas e ideias políticas diferentes — mas que são obrigados, sob pena de extermínio eleitoral, a cumprir diretrizes econômicas que façam sentido. Para isso, têm de permanecer dentro de um espaço de racionalidade com limites estritamente definidos. É o que o presente governo, na essência, vem fazendo desde 2003; parece pouco provável que mude no tempo que ainda lhe resta.
A grande realização do Brasil nos últimos anos é ter deixado de ser um país economicamente inviável. É o contrário disso, hoje — e a menos que apareça um consenso de que deve caminhar para trás e reencarnar-se como a piada que era, com inflação de 80% ao mês, conformismo com a miséria e incapacidade de sintonizar-se com o progresso mundial, o Brasil vai se colocando cada vez mais como um candidato real ao sucesso econômico nos próximos anos. Pode superar a França e a Inglaterra como a quinta maior economia do mundo entre 2015 e 2025, conforme observou há pouco a revista The Economist, e continuar tirando milhões de cidadãos da pobreza. Tem perspectivas reais de um avanço inédito na indústria de petróleo e toda sua vasta cadeia produtiva. Sua posição como um dos mais competitivos e eficazes fornecedores internacionais de alimentos tem tudo para se fortalecer ainda mais. O Brasil continuará tendo vantagens decisivas para abastecer o mundo de matérias-primas. Com crescimento continuado de pelo menos 5% ao ano, o que é uma estimativa moderada, estará a caminho de construir um mercado interno efetivamente significativo — o que vai gerar escala, eficiência, diversidade e outros fatores críticos para o avanço da produção. O país tem diante de si, em suma, possibilidades de transformação maiores e mais realizáveis do que em qualquer outro ponto de sua história econômica.
O mérito do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva nesta caminhada é ter entendido que decisões de política econômica podem variar de ênfase, de escolhas e de objetivos, mas destinam-se ao desastre quando abandonam a lógica e tentam mudar realidades apenas com base em crenças, desejos e palavras de ordem. Nestes sete anos o governo não baixou um único pacote. Atravessou uma tempestade financeira mundial sem tomar qualquer medida inspirada no pânico. Aumentou o salário mínimo, em termos reais, em 45% de março de 2003 para cá, sem causar com isso nenhuma disparada na inflação. Tornou o Brasil um grande polo para os investimentos internacionais. Construiu reservas de 235 bilhões de dólares, manteve a inflação domada e não se meteu em nenhuma confusão. É muito e, sobretudo, é o certo. Por isso mesmo, é tão importante neste momento distinguir o que são conquistas reais e o que é a megalomania crescente do governo quando julga a si próprio e dá por resolvidos todos os problemas passados, presentes e futuros do Brasil. Acreditar nisso é a melhor maneira de manter todos eles, e por muito tempo, sem solução.
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