Um conjunto de novidades chegou para complicar o já caótico quadro da tributação no Brasil. Imagine o grau de confusão criado para uma empresa que confiou na redução de ICMS – o imposto de circulação – que lhe foi concedida por um governo estadual. No mês passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que esses incentivos são ilegais, quando concedidos por fora do Confaz, o “Senadinho”, conselho que resolve questões da guerra fiscal entre as 27 unidades da Federação.
As regras da tributação de mercadorias que circulam pelo Brasil exigem, sem exagero de linguagem, toneladas de leitura pelos especialistas nas 27 diferentes legislações baixadas pelos Estados e pelo Distrito Federal. O custo de cumprir as leis fiscais no Brasil é, disparado, o mais alto do mundo. E o incentivo à corrupção na fiscalização virou uma verdadeira praga nacional. Todo esse entulho vai direto para o custo final dos produtos, roubando poder de compra dos brasileiros e destruindo a competitividade das fábricas brasileiras.
Outra novidade é a também complicada regra de repartição dos tributos nos chamados Fundos de Participação, dos Estados e municípios, por meio dos quais os governos locais dão uma mordida nos tributos arrecadados pela União. Essa repartição também está errada, segundo o Supremo, que deu prazo para que ela seja reformada pelo Congresso. Não que o Congresso tenha pouco a fazer nesse tema: ele precisa também bater o martelo sobre a distribuição dos recursos que serão arrecadados pela exploração dos novos campos de petróleo no pré-sal, algo em princípio bom, mas que virou briga feia dos Estados em Brasília. As unidades da Federação têm dificuldade para debater o tema friamente porque pagam à União o juro mais alto do planeta na rolagem de suas dívidas, renegociadas na implantação do Real. Os Estados têm razão em querer rediscutir a correção e os juros desses contratos. É o momento de cozinhar todo esse caldo numa só panela.
Nossa enorme confusão fiscal tem um lado positivo. Empurra todos os atores para a mesa de negociação. É o que tem acontecido nos últimos dias por trás da movimentação do Ministério da Fazenda e da Casa Civil, com os governadores e suas bancadas no Congresso. Mas é a oportunidade de o contribuinte também perguntar: no final, quem paga a conta desse acerto? A cobrança tem de ser acompanhada por vigilância e mobilização, como algumas manifestações que têm sido promovidas por entidades empresariais, de trabalhadores e de grupos de interesse civis e suprapartidários. Pessoalmente, estou envolvido no Movimento Brasil Eficiente (MBE). Gosto da proposta do MBE por ser realista. Ela admite que o contribuinte não obterá de imediato a redução da carga tributária – que virá na etapa seguinte –, mas já pode sair ganhando, e muito, com uma mudança na tributação que traga mais simplicidade e transparência sobre o que paga hoje.
A proposta do MBE cria um imposto nacional compartilhado, que ficaria com o nome de ICMS e financiaria as máquinas públicas da União, dos Estados e dos municípios, ao reunir num só tributo os atuais 27 ICMS, o IPI, a Cofins, o PIS e a Cide. Seriam 31 regras fiscais diferentes transformadas numa só. A arrecadação de cada esfera de governo seria garantida por um fundo de compensação, de modo que nenhum governador ou prefeito poderia alegar que perderia com a nova repartição. Outros eventuais acertos seriam feitos por meio da repactuação das dívidas estaduais e na repartição fiscal do pré-sal. O efeito simplificador para o contribuinte brasileiro seria comparável ao que aconteceu quando dominamos a inflação no Brasil. Hoje, não podemos mais crer na loucura inflacionária em que vivemos tanto tempo. Foi preciso determinação das lideranças, indignação da sociedade e coragem para acreditar na solução certa. No caso do manicômio tributário, ocorrerá o mesmo. Quando caírem as grades do hospício, o Brasil será um lugar melhor e mais digno para viver e trabalhar, sem tanto medo da concorrência dos importados e dos fiscais batendo à porta.
Fonte: revista Época
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